Publicado em 19 de agosto de 2020 às 09:32
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) rejeitou, por 6 votos a 1, nesta terça-feira (18), criar uma punição para o abuso de poder religioso. A proposta defendida pelo ministro Edson Fachin previa criar uma punição eleitoral específica para candidatos que se aproveitarem da religião a que pertencem para influenciar o voto de fiéis.>
A maioria dos magistrados entendeu que não cabe ao TSE criar uma nova figura jurídica e que casos de atuação irregular de líderes religiosos devem ser punidos no âmbito do abuso de poder político ou econômico, como ocorre geralmente. >
Os ministros Tarcísio Vieira de Carvalho, Og Fernandes, Luís Felipe Salomão, Sérgio Banhos e o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, acompanharam a divergência inaugurada pelo ministro Alexandre de Moraes. >
A decisão evita a criação de um desgaste do TSE com o Congresso, uma vez que a bancada evangélica no Legislativo vinha pressionando contra a tese de Fachin. >
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O julgamento começou em 25 de junho, quando Fachin sugeriu a criação do abuso de poder religioso já nestas eleições. Na ocasião, Carvalho pediu vista, mas Moraes resolveu antecipar o vot?o. Ele sustentou que as entidades religiosas têm legitimidade para participar do processo eleitoral. >
"Não se pode transformar religiões em movimentos absolutamente neutros, sem participação política e sem legítimos interesses políticos na defesa de seus interesses, assim como os demais grupos que atuam nas eleições", disse Moraes.>
Fachin, por sua vez, defendeu que a influência de associações religiosas no processo eleitoral deve ser observada com atenção, "tendo em consideração que as igrejas e seus dirigentes ostentam um poder com aptidão para amainar a liberdade para o exercício de sufrágio e debilitar o equilíbrio entre as chances das forças em disputa".>
O caso chegou ao TSE após o Ministério Público Eleitoral acusar a pastora da Assembleia de Deus e vereadora de Luziânia (GO) Valdirene Santos de usar sua posição na igreja para promover sua candidatura e influenciar o voto de fiéis.>
Até Fachin votou para absolver a vereadora por considerar que não há elementos suficientes para cassá-la. No entanto, ele defendeu que a corte deveria criar um precedente que autorizasse a cassação por abuso de poder religioso no âmbito das Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes).>
Og Fernandes afirmou que não cabe ao TSE criar o abuso de poder religioso, mas disse que a decisão não "significa que não haja limites para atuação de líderes religiosos na seara eleitoral". "A liberdade religiosa como qualquer outra não é absoluta.">
O ministro destacou, ainda, que a legislação eleitoral já protege as eleições de eventuais exageros de líderes religiosos ao proibir a propaganda eleitoral dentro de templos e a doação em dinheiro de entidade religiosa.>
"Tenho o entendimento de que não é preciso destacar uma categoria para sedimentar que a Constituição proíbe a fraude às eleições, de modo que eventuais abusos praticados por lideranças, sejam elas eclesiásticas, sindicais, patronais, esportivas, artísticas, corporativas, docentes etc. e que visam, em última análise, a influenciar a livre escolha do eleitor, estão incluídas na expressão 'fraude', cuja acepção é ampla e abrange a coação oriunda da ascendência desses líderes sobre determinado grupo de eleitores.">
Og disse que uma interpretação ampla do abuso de poder previsto na legislação seria um risco e poderia levar a Justiça a equívocos. >
"Se levarmos ao pé da letra uma interpretação extensiva, poder-se-ia invocar abuso do poder esportivo a escolha de atletas ou corporações que servem também de identificação e influência na escolha do eleitor, sem, contudo, tisnar a pluralidade democrática ou de representação decorrente do voto.">
À Justiça Eleitoral, disse Og, cabe garantir a liberdade de escolha, e não "íntima motivação" do voto.>
Barroso, por sua vez, afirmou que não descarta a criação do abuso de poder religioso, mas entendeu que o debate não deveria ser feito nesse processo. "Pela falta de substrato fático para uma discussão balizada desse tema, eu não me animo a enfrentar a fascinante e relevante questão trazida pelo ministro Edson Fachin.">
Salomão argumentou que um julgamento para analisar a existência de abuso de poder religioso teria um "o elevado grau de subjetivismo". O ministro citou, ainda, que seria necessária a aprovação de lei para criação da nova penalidade eleitoral.>
"É incontroverso, portanto, que não existe no ordenamento jurídico brasileiro referência ao que ora se denomina abuso de poder religioso, que, como regra sancionatória, não pode ser aplicada sem expressa previsão legal.">
Carvalho também ressaltou que seria difícil analisar quais casos se enquadrariam na nova figura jurídica.>
"Não vejo como censurar a liberdade do voto, ainda que o móvel seja intimamente ligado à religião, da mesma forma e com as mesmas premissas que não posso carimbar como equivocados os votos confiados aos candidatos de bancadas ruralista, empresarial, de segurança, sindical, feminina etc.">
O ministro sublinhou, porém, que "haverá a reprimenda necessária e cabível nas searas do abuso econômico, ainda que sob o manto da atividade religiosa".>
Já Banhos destacou que fiéis têm o direito de se unir para tentar eleger representantes mais alinhados às suas ideias. Ele afirmou, porém, que é preciso ficar atento à atuação de líderes religiosos que fazem pressão psicológica, assédio e coação em busca de votos.>
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