Publicado em 18 de fevereiro de 2025 às 06:28
Quem paga R$ 200 em uma peça da marca mineira Tania Bulhões, famosa no ramo de decoração, louças e perfumaria, busca comprar mais do que uma louça. Essa é a raiz da crise de imagem enfrentada pela empresa há algumas semanas, com forte repercussão no TikTok. >
Exclusividade, status e prestígio foram alguns dos atributos atacados nas redes sociais na "crise da xícara", que surgiu depois que uma brasileira viu uma peça idêntica à da marca em um café popular na Tailândia.>
O vídeo postado no TikTok desencadeou uma sequência de questionamentos quanto à real exclusividade do que a marca desenha. Até a terceirização da produção, processo comum em vários segmentos, passou a ser vista como um sinal de má-fé da empresa.>
A crise de imagem ainda foi potencializada pela demora na reação da marca, que notificou a autora do vídeo a retirar o conteúdo e só começou a responder às acusações quase 20 dias depois, tempo suficiente para clientes se filmarem raspando o fundo de peças (onde descobriam que a fabricação era turca) e, em um segundo momento, compartilharem links e vídeos de coleções similares ou idênticas em sites de marketplace com Aliexpress e Amazon.>
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"A gente está vivendo a era dos dupes, que são as imitações, e de muita falsificação. Nada impede que essas plataformas [de marketplace] estejam criando e colocando à venda produtos agora, depois da polêmica, criando coleções em cima disso. Viralizou e isso vende", diz Cecília Rapassi, sócia-diretora da Gouvêa Fashion Business.>
A própria Tania Bulhões é alvo de um outro "dupe" -como as redes chamam produtos muito parecidos, mas com grande diferença de preço- viral, o aromatizador de ambientes de chá branco. Enquanto um difusor da marca mineira custa R$ 370 por 290 ml, o similar divulgado no TikTok não chega a R$ 20 por 100 ml.>
Esse tipo de conteúdo tem crescido e chega a quase todo tipo de produto: perfumes importados, peças de marcas de luxo, bolsas, maquiagens, vivendo na linha tênue entre a inspiração e a cópia. Entidades de diversos setores vivem em guerra com marketplaces, a que acusam de conivência na venda de falsificações.>
"Fica cada vez mais difícil [o controle]. Você cria um produto e ele pode ser copiado em minutos a partir da imagem que você postou nas redes sociais", diz Cecília.>
Se um consumidor digitar hoje o nome da marca e algum grande marketplace em atividade no Brasil, vai encontrar anúncios que não fazem menção à Tania Bulhões, mas vendem produtos aparentemente iguais aos da empresa.>
A marca mineira afirma que seus produtos são frequentemente copiados e reproduzidos sem autorização. No caso da xícara vista na Tailândia, porém, a empresa diz ter havido a venda não autorizada de peças descartadas pelo controle de qualidade.>
Esse vazamento teria partido de um dos fornecedores terceirizados pela marca. Um produz a porcelana branca e outro aplica a decoração.>
"A terceirização parcial ou total é prática comum", afirma Cecília Rapassi. O uso da expertise de outras empresas ajuda na redução de custos e no ganho de escala.>
"Quando se trata do universo de luxo, o valor de um produto vai muito além do material ou do processo produtivo", diz. "Ele é construído principalmente por atributos intangíveis como status, prestígio, herança cultural e o poder do sonho.">
A coleção que disparou a crise de imagem foi a Marquesa e, apesar de alguns conteúdos sugerirem que a coleção copiada é nova, a marca divulgou materiais indicando que os desenhos estão em seu portfólio há 20 anos.>
"À medida que crescemos, percebemos que, especialmente com coleções antigas, poderíamos ter tido um controle mais rigoroso sobre nossa propriedade intelectual", diz a empresa, em nota.>
O advogado Rodrigo Leal, do Prado Vidigal Advogados, diz que o design de louças e os desenhos colocados nelas podem ser protegidos por direitos autorais desde que sejam originais. Para aumentar a segurança, diz o especialista em propriedade intelectual, é necessário fiscalizar fabricantes e fornecedores.>
Além da coleção Marquesa, as linhas Mediterrâneo, Entre Rios e Lírio foram descontinuadas e serão vendidas enquanto houver estoque.>
O maior controle da propriedade intelectual passa, segundo a marca, pela fabricação própria. Há dois anos, a Tania Bulhões virou controladora da Royal Limoges, fabricante francesa de porcelana. Em 2023, a empresa deu início à construção de uma fábrica em Uberaba (MG), obra à época avaliada em R$ 20 milhões.>
A marca também ofereceu aos clientes a possibilidade de troca ou mesmo de devolução das peças.>
Na corrida para gerir o estrago, a marca compartilhou em seu Instagram vídeos da produção na fábrica francesa, detalhes da aplicação dos desenhos e relatos do processo produtivo. As publicações mais recentes do perfil da marca são todas da coleção Árvores, que é produzida em Limoges.>
"O grande aprendizado dessa situação é que a gestão de crise pode afetar pequenos, médio e gigantes da mesma forma com o advento da hiperconexão. As empresas têm que treinar suas equipes", diz Cecília, para quem esse preparo passa pelo marketing, assessoria de imprensa e equipes de venda.>
Essa não é a primeira vez que a empresa sofre uma crise de imagem. Em 2010, a empresária foi condenada pela Justiça de São Paulo a prestar serviços comunitários por quatro anos após ter confessado fraudes na importação de artigos de luxo. Na época, a companhia disse que recebeu "com serenidade e responsabilidade a sentença" e que mostrou sempre mostrou disposição "de esclarecer e resolver a questão o mais rapidamente possível".>
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