Publicado em 10 de março de 2021 às 11:27
- Atualizado há 4 anos
Candidato ou não a presidente em 2022, Luiz Inácio Lula da Silva começa sua jornada à eleição no ano que vem buscando fugir do que o PT vê como uma armadilha: ser considerado pelo eleitorado um polo tão extremo quanto Jair Bolsonaro (sem partido). O tema tem sido discutido por aliados do líder petista desde que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, restaurou seus direitos políticos ao anular condenações da Operação Lava Jato.>
Há um consenso de que a polarização tem de ser modulada pelo óbvio: não alienar nem o eleitorado que abraçou o antipetismo de 2016 para cá, mas que antes apoiou Lula, nem os agentes financeiros.>
Isso não significa, contudo, uma reedição da famosa Carta ao Povo Brasileiro, documento de 2002 em que Lula beijava a cruz do mercado prometendo manter a política liberal do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB, 1995-2002).>
Deu certo, e o namoro entre mercado e governo do PT só começou a sofrer abalos reais a partir das gestões de Dilma Rousseff (2011-16), que amplificou políticas instituídas nos dois anos finais das administrações de Lula.>
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Agora, contudo, petistas de alto escalão avaliam ser dispensável um compromisso --ao contrário, basta se colocar retoricamente como uma alternativa racional, urbana, à turbulenta gestão de Bolsonaro (sem partido).>
A primeira reação dos mercados à liberação de Lula foi negativa, com um misto de repetição do temor que o PT provocava nos anos de crise de Dilma com a expectativa de que Bolsonaro inclinará para uma gestão mais populista e autoritária prevendo o embate com o petista.>
Lula tem sido aconselhado a vestir um figurino de estadista, fazendo a defesa institucional de aspectos que considera positivos de seu governo.>
Sua proverbial agressividade de palanque ficaria, se o cenário se confirmar, para itens incontestáveis de crítica a Bolsonaro --como seu manejo da pandemia.>
O ex-presidente deverá fazer nesta quarta seu primeiro pronunciamento desde a decisão de Fachin, na segunda.>
Nele, o foco deverá ser a questão judicial, que lhe deixou 580 dias preso e que levou ao julgamento da suspeição do juiz Sergio Moro, o artífice da Lava Jato que o condenou.>
Mas, como diz um interlocutor do ex-presidente, Lula será candidato do começo ao fim da entrevista e depois, ainda que não assuma isso.>
Há divergências acerca da conveniência desse movimento. Primeiro, porque apesar de a avaliação geral ser de que a elegibilidade de Lula está virtualmente garantida para 2022, sempre pode haver algum percalço jurídico.>
Segundo, há a questão do que alguns petistas consideram de legado do ex-presidente. Ele estaria recuperado com a anulação das sentenças e eventual punição a Moro.>
Na opinião desses dirigentes, seria desnecessário arriscar uma disputa incerta.>
Diferentemente de 2018, quando a cúpula petista via Lula imbatível, não há tal certeza com Bolsonaro e seus 30% de fiéis, além dos outros concorrentes que apostem no "nem-nem" --nem o presidente, nem o ex-presidente.>
Hoje o campo, mais à direita ou mais à esquerda, está congestionado e ficou mais estreito com a recolocação de Lula na disputa.>
Lá trafegam João Doria (PSDB), Luciano Huck (sem partido), Ciro Gomes (PDT), Flávio Dino (PCdoB), Eduardo Leite (PSDB) e Luiz Henrique Mandetta (DEM), para não falar em nomes exógenos cogitados, como o da empresária Luiza Trajano.>
O mais importante, para os petistas ouvidos, seria Lula apresentar-se como portador de um projeto que mostre uma alternativa a Bolsonaro que, na visão deles, já teria sido comprovada na prática.>
A argumentação contrária, de que a ruína econômica sob Dilma, que gerou condições políticas para seu impeachment em 2016, é largamente desprezada como um problema da ex-presidente. O fato de que a gestão econômica dela foi herdada de Lula também passa em branco.>
Por esse arranjo, acreditam lulistas, o discurso estará organizado seja o candidato Lula ou Fernando Haddad, seu substituto na disputa com Bolsonaro em 2018, que acabou com 46% dos votos válidos no segundo turno.>
O ex-presidente, por sua vez, segue determinado a ver Moro em maus lençóis. A sua gradual volta à vida pública, iniciada com a saída da cadeia, passou por uma intensa campanha de denúncia do modus operandi da Lava Jato.>
Instrumental para isso foi o grupo de advogados Prerrogativas, ligado à esquerda e com ótimo trânsito em Brasília. O caso ganhou corpo com as revelações de grampos de atores da Lava Jato e, também, com o ambiente político.>
Bolsonaro elegeu-se com o lava-jatismo como uma das pernas de sua campanha, e simbolizou isso trazendo Moro como seu ministro da Justiça. Deu no que deu, e o ex-juiz saiu atirando do governo um ano depois, mas no processo o presidente tratou de apoiar o esvaziamento da Lava Jato.>
Indicou um procurador-geral da República que encerrou a operação, viu remanejados investigadores. Teve apoio para tanto da renovada ala garantista do Supremo, Gilmar Mendes à frente, que nunca tolerou o que considerava abusos de Moro e companhia.>
No Congresso, onde Lava Jato é palavrão para a maioria dos parlamentares, o movimento ganhou mais força com a eleição de Arthur Lira (PP-AL) na Câmara. Na semana passada, o Supremo o livrou de um processo na Lava Jato.>
Sobre Lula, Lira disse que ele até poderia merecer a absolvição de Fachin, mas Moro, que quase teve a suspeição deixada de lado, não. O centrão esteve sempre com os governos de plantão --com exceção de Dilma, abandonada às vésperas do impeachment.>
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