Publicado em 14 de fevereiro de 2021 às 09:39
- Atualizado há 4 anos
O governo de Jair Bolsonaro (sem partido) só conseguiu gastar, até agora, 9% do dinheiro liberado em caráter de urgência e emergência para a compra e o desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19, uma mostra do atraso da União na tentativa de vacinar em massa a população brasileira. >
O cálculo não inclui os pagamentos feitos nesta semana pelas doses de Coronavac, do Instituto Butantan, porque o Ministério da Saúde não informou de onde saiu o dinheiro e ainda não há registros do gasto nos sistemas de execução orçamentária consultados pela reportagem.>
Três MPs (medidas provisórias) assinadas por Bolsonaro em agosto, setembro e dezembro abriram créditos extraordinários que somam R$ 24,5 bilhões. O país chegou à metade de fevereiro com apenas R$ 2,2 bilhões efetivamente gastos, segundo dados de execução orçamentária da Câmara dos Deputados (atualizados no último dia 10) e do Ministério da Saúde.>
Na terça (9) e na quarta (10), o Butantan, vinculado ao governo de São Paulo, recebeu R$ 505 milhões do ministério pelo fornecimento de 8,7 milhões de doses da Coronavac, a vacina chinesa desenvolvida em parceria com o instituto. Se for levado em conta esse valor, e considerando que ele tenha saído do dinheiro emergencial destravado para a compra de vacinas, o total gasto até agora chega a R$ 2,7 bilhões, ou 11% dos créditos criados.>
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A primeira MP foi assinada por Bolsonaro em 6 de agosto e destinou quase R$ 2 bilhões à Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), vinculada ao Ministério da Saúde, para a produção da vacina desenvolvida em parceria com a farmacêutica AstraZeneca e com a Universidade de Oxford.>
Até agora, o país recebeu apenas 2 milhões de doses do imunizante, importadas da Índia. A carga chegou ao Brasil em 22 de janeiro.>
No último dia 6, a Fiocruz recebeu o primeiro lote do IFA (ingrediente farmacêutico ativo) para a produção de mais vacinas. O material é suficiente para 2,8 milhão de doses.>
A MP de agosto que destravou os R$ 2 bilhões foi aprovada pelo Congresso Nacional e convertida em lei. O Portal da Transparência do governo federal registra que uma das ações previstas, a de encomenda tecnológica para a vacina, foi integralmente executada e paga em 16 de setembro.>
Naquele dia, houve o pagamento de R$ 991,5 milhões à AstraZeneca e de R$ 292,5 milhões a Bio-Manguinhos, o instituto da Fiocruz responsável pela fabricação do imunizante, apontam os dados públicos do governo federal.>
Segundo a Fiocruz, todo o valor, de R$ 1,28 bilhão, foi destinado à AstraZeneca dentro de um contrato de encomenda tecnológica. Isto garante a Bio-Manguinhos o acesso a 100,4 milhões de doses do IFA para o processo final da vacina contra a Covid-19, assim como a transferência de tecnologia, afirma a Fiocruz.>
A segunda ação prevista na mesma MP, de processamento final e absorção da tecnologia, tem uma execução orçamentária bem mais lenta. Os R$ 710,9 milhões já foram empenhados, o que significa que já há um compromisso com os pagamentos. Mas, até agora, os pagamentos efetivamente feitos somam R$ 96,3 milhões, ou 13,5% do total.>
Parte do dinheiro, R$ 16,8 milhões, foi destinada a uma fundação de apoio à Fiocruz, responsável pela gestão financeira do projeto de absorção de tecnologia, conforme o detalhamento dos pagamentos registrado no Portal da Transparência. A fundação teve gastos ainda com equipamentos para laboratório, projeto de engenharia para expansão de espaços e manutenção dos prédios.>
"O recurso está sendo destinado aos gastos relacionados à produção da vacina em Bio-Manguinhos, incluindo todas as operações necessárias para o processamento final e absorção de tecnologia, como compra de insumos e equipamentos ou contratação de serviços especializados. Esse recurso é executado conforme cronograma de despesas com a produção da vacina", diz a Fiocruz, em nota.>
Em 24 de setembro, Bolsonaro assinou uma nova MP, para que o Brasil tivesse acesso a vacinas do consórcio Covax Facility, uma iniciativa da OMS (Organização Mundial da Saúde) para aumentar o acesso global a imunizantes. O acordo do Brasil prevê 42,5 milhões de doses, ainda sem previsão para entrega.>
A MP abriu um crédito extraordinário de R$ 2,51 bilhões. Até agora, foram gastos R$ 830,8 milhões, menos de um terço do total.>
Os detalhes desses gastos mostram que o Brasil pagou R$ 735,9 milhões para ingressar no consórcio e mais R$ 94,9 milhões como garantia financeira. O restante se refere à aquisição de doses de vacina, que ainda não existem.>
Por último, em 17 de dezembro, uma nova MP liberou R$ 20 bilhões emergenciais para a compra de vacinas contra a Covid-19. O Ministério da Saúde já empenhou R$ 88,9 milhões, mas faltam propostas, acordos e contratos para a aquisição de imunizantes.>
O valor efetivamente gasto até agora, segundo os sistemas de execução orçamentária, é de R$ 7,1 milhões (0,03%). Esse dinheiro foi pago em 24 de dezembro à Opas (Organização Pan-Americana da Saúde), braço da OMS nas Américas. Serviu para a aquisição de seringas, segundo o Portal da Transparência.>
A vacinação contra a Covid-19 no Brasil só teve início em 17 de janeiro. Mais de 50 países começaram a imunizar suas populações antes do Brasil.>
A primeira dose da vacina foi aplicada em 4,9 milhões de brasileiros, segundo dados atualizados até sexta-feira (12) pelo consórcio de veículos de imprensa formado por Folha de S.Paulo, UOL, Estado de S. Paulo, G1, O Globo e Extra. A quantidade equivale a pouco mais de 2% da população.>
Bolsonaro vem sendo pressionado a abandonar o discurso negacionista em relação à vacina e de defesa de medicamentos sem eficácia para a Covid, em especial a cloroquina. O presidente é um contumaz crítico dos imunizantes, em especial da Coronavac, hoje a principal vacina distribuída pelo Ministério da Saúde.>
Parlamentares do centrão, que dão sustentação ao presidente no Congresso, ampliaram essa pressão, diante dos apelos de suas bases eleitorais. Uma forma de atuação foi pressionar a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a flexibilizar as regras para a liberação emergencial de uma vacina.>
Um forte lobby é feito no Congresso por lobistas da União Química, a indústria que deve fabricar no Brasil a vacina russa Sputnik V. A Anvisa alterou regras e passou a aceitar a apresentação de estudos da fase 3 de ensaios clínicos (testes em humanos) feitos em outros países.>
Com a mudança, o Ministério da Saúde anunciou a intenção de compra de 10 milhões de doses da Sputnik e de 20 milhões da Covaxin, da indiana Bharat Biotech.>
Mesmo com vacinas em falta, o ministro da Saúde, general da ativa Eduardo Pazuello, afirma que a intenção é vacinar toda a população ainda em 2021. Metade seria imunizada até junho e a outra metade, até dezembro. A realidade, até agora, é outra: já faltam vacinas na região metropolitana do Rio e em Salvador, por exemplo.>
O Ministério da Saúde não respondeu aos questionamentos até a publicação da reportagem.>
As MPs para compra de vacinas >
foram abertos em créditos extraordinários por meio de três medidas provisórias editadas por Bolsonaro em agosto, setembro e dezembro de 2020
foram efetivamente pagos, segundo dados de execução orçamentária da Câmara dos Deputados (atualizados no último dia 10) e do Ministério da Saúde
do Ministério da Saúde foram repassados ao Instituto Butantan para a compra de 8,7 milhões de doses da Coronavac, o que eleva a 11% dos créditos abertos (R$ 2,7 bilhões)
6 de agosto>
24 de setembro>
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