Publicado em 20 de maio de 2020 às 18:22
A inauguração das ações de fiscalização ambiental coordenadas pelo Exército mobilizou 97 agentes, dois helicópteros e dezenas de viaturas em Mato Grosso para uma operação que terminou sem multas, prisões ou apreensões.>
O Ibama havia sugerido outro alvo na região, com evidências de ilegalidades, mas foi ignorado.>
A Operação Verde Brasil 2 foi inaugurada na última segunda-feira (11) com presença de jornalistas e gravação de vídeo oficial, com ações em Rondônia, Pará e Mato Grosso.>
Em vez de apoiar os órgãos especializados na fiscalização ambiental, como acontecia nos anos anteriores, as Forças Armadas passaram a comandar as operações, conforme o decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) publicado no início de maio.>
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A reportagem teve acesso a um relatório da operação enviado por e-mail à sede do Ibama e conversou com agentes de forças estaduais e federais em campo na operação em Mato Grosso, onde os alvos escolhidos foram uma área de exploração madeireira na Estação Ecológica Rio Ranuro, em Nova Ubiratã (MT), e também uma serraria na região, indicada pela polícia civil.>
A operação reuniu 80 oficiais do Exército, seis policiais civis, dois fiscais ambientais estaduais, um agente do ICMbio, seis fiscais do Ibama e dois peritos criminais do estado do Mato Grosso.>
"O representante do Ibama informou que o alvo de Nova Ubiratã já teria sido atendido pelo Ibama duas semanas atrás, onde foi constatada exploração de madeira, no entanto, com atividades já paralisadas", diz o relatório.>
"Dessa forma, [o agente do Ibama] sugeriu ao comando um outro alvo localizado a aproximadamente 70 km da Estação Rio Ranuro, precisamente uma exploração ilegal de madeira no interior do Parque Indígena do Xingu".>
"Na oportunidade foram entregues mapa e rota de acesso georreferenciados e navegáveis até o alvo. O comandante da operação ficou de analisar o alvo apresentado", continua o documento, que mais adiante descreve a operação realizada e informa que "o alvo indicado pelo Ibama não foi atendido".>
"Quem comanda é a vice-presidência. O Exército é só uma mão-de-obra", disse à reportagem a assessoria de imprensa do Exército, por telefone. A reportagem tentou contato com a vice-presidência da República por email e por telefone para saber sobre o critério de escolha dos alvos, mas não obteve retorno.>
O relatório do Ibama informa que "não houve nenhuma ação de fiscalização no interior da UC [Estação Ecológica Rio Ranuro]; foi montada barreira na estrada pelo EB [Exército Brasileiro] e o restante da equipe se limitou a aguardar a chegada dos coordenadores da operação".>
Já na serraria, a equipe do Ibama relata que "acompanhou levantamento de informações acerca da regularidade da operação, identificando a necessidade de vistoria no estoque do saldo madeireiro da empresa a fim de confirmar eventuais irregularidades".>
O documento também informa que a ação foi encerrada "sem nenhum procedimento administrativo executado pelo Ibama, tendo em vista não ter sido identificada nenhuma demanda para tal".>
O único resultado da operação foi a apuração de indícios de irregularidade em 3 mil metros cúbicos de madeira, segundo uma nota da assessoria de imprensa da Polícia Civil do Mato Grosso e também um registro do comando do Exército na região.>
Segundo os agentes que estavam em campo, não houve apreensão de material, mas apenas retirada de uma amostra da madeira para análise, pois não havia materialidade para a autuação.>
Em nota sobre a inauguração da Operação Verde Brasil 2, o Exército informa que "foram apreendidos 3 mil metros cúbicos de madeira e 23 máquinas escavadeiras". Por telefone, a assessoria de imprensa esclareceu que esses resultados foram obtidos em duas operações, em Rondônia e no Pará.>
O Exército ainda ressaltou em nota que o material encontrado nas operações "não será destruído pelo Exército, mas será apreendido, retirado do local e/ou mantido sob custódia".>
A orientação foi questionada em um grupo de Whatsapp que reúne agentes de diversos órgãos de fiscalização envolvidos na Operação Verde Brasil.>
Eles argumentaram que a apreensão e transporte de grandes equipamentos em áreas remotas é inviável, além da inutilização ser uma forma eficaz de coibir as atividades ilegais.>
Em resposta, uma orientação da sede do ICMBio sugeriu aos agentes, ainda pelo Whatsapp, a "inutilização sem uso de fogo".>
No ano passado, a decisão sobre destruir equipamentos apreendidos causou atrito entre o Exército e o Ibama durante a primeira Operação Verde Brasil, quando as Forças Armadas, ainda sem poder de comando das operações, ausentou-se das ações que envolviam destruição de materiais.>
A demanda para que os equipamentos apreendidos em atividades ilegais não sejam destruídos vem de garimpeiros e madeireiros e é apoiada pelo presidente Bolsonaro.>
Já o vice-presidente, Hamilton Mourão, tem outro objetivo: ele busca retomar a confiança internacional sobre o compromisso de conservação da Amazônia, principalmente de Noruega e Alemanha, países doadores do Fundo Amazônia, bloqueado desde o ano passado.>
A propaganda oficial da Operação Verde Brasil 2, com imagens da operação em Mato Grosso, tem tradução para o inglês.>
Após a ação inaugural, o Exército fez pausa de uma semana e informou aos órgãos parceiros que deve retomar a operação nesta terça, dia 18.>
Durante a pausa, uma equipe de cinco agentes do Ibama que haviam sido deslocados de outros estados para a operação continuaram atuando na região.>
Um registro das ações da equipe inclui encaminhamento de grileiros à Polícia Civil, apreensão de embarcações usadas em pesca predatória e também de veículos e equipamentos usados em exploração ilegal de madeira.>
"Ao minimizar o peso do conhecimento técnico e da expertise de servidores especialmente treinados para identificar e combater crimes ambientais e alijá-los dos processos de planejamento e coordenação das ações de fiscalização ambiental, a Operação Verde Brasil 2 corre o risco de se transformar num grande e oneroso fiasco", diz em nota a Associação Nacional dos Servidores de Meio Ambiente (Ascema).>
Embora ressalve que o apoio das Forças Armadas é necessário, a associação pontua que o custo mensal da operação das Forças Armadas é próximo do orçamento do Ibama para todo o ano. "A GLO versão 2020 pretende gastar em um mês R$ 60 milhões, com previsão de mobilizar 3,8 mil militares das Forças Armadas, enquanto o Ibama tem cerca de 700 fiscais em todo o país e um orçamento anual de cerca de R$ 70 milhões para atender à fiscalização de todo o território nacional", compara.>
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