Publicado em 11 de outubro de 2021 às 09:41
A Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) considera a denúncia de 200 mortes de voluntários de pesquisa clínica com a proxalutamida feita no Amazonas (Brasil) uma violação aos direitos humanos e uma das infrações éticas mais graves e sérias da história da América Latina. >
A declaração foi divulgada neste sábado (9) por meio da Rede Latino-americana e Caribenha de Bioética (Redbioética-Unesco) e se refere à denúncia feita pela Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa) à Procuradoria-Geral da República no mês passado. A entidade é responsável por regular a participação de seres humanos em pesquisas científicas no Brasil. >
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já defendeu o uso da substância no combate à infecção pelo coronavírus, mas o medicamento, um bloqueador de hormônio masculino, não teve eficácia comprovada contra a Covid-19. O uso da substância em pesquisas científicas também foi vetado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no início do mês passado. >
Segundo o comunicado da rede de bioética da Unesco, a denúncia da Conep inclui graves violações dos padrões éticos de pesquisa nas diversas etapas do estudo com a proxalutamida. >
>
"É ética e legalmente repreensível, conforme consta do ofício da Conep, que os pesquisadores ocultem e alterem indevidamente informações sobre os centros de pesquisa, participantes, número de voluntários e critérios de inclusão, pacientes falecidos, entre outros." >
"Qualquer alteração em um protocolo de pesquisa deve ser aprovada pelo sistema de ética em pesquisa local", diz o comunicado. >
Para a organização, é igualmente condenável a denúncia de que os pesquisadores, apesar de terem conhecimento dos sucessivos óbitos e dos eventos adversos graves, continuassem com o recrutamento e a execução dos estudos. >
Também é considerado gravíssimo, segundo a Unesco, a suspeita de que o comitê científico da pesquisa tenha sido coordenado por pessoas vinculadas aos patrocinadores do estudo, o que configuraria um claro conflito de interesses. >
Um comitê independente é uma exigência para a realização de ensaios clínicos e tem a função de supervisionar as condições éticas e de segurança na pesquisa. A proxalutaminada é fabricada pela farmacêutica chinesa Kintor. >
"É urgente que, em caso de irregularidades comprovadas, todos os atores sejam responsabilizados, não só de forma ética mas também legalmente, incluindo as equipes de investigação, as instituições e patrocinadores responsáveis, nacionais e estrangeiros." >
A organização pede ainda que a comunidade científica nacional e internacional se una para monitorar, divulgar e acompanhar a denúncia da Conep. "É urgente identificar as causas das mortes ocorridas durante os estudos. É inaceitável que esses tipos de eventos, se verificados, estejam acontecendo no ano de 2021." >
Para a Unesco, "nenhuma emergência sanitária, ou contexto político ou econômico, justifica fatos como esses apresentados na denúncia da Conep. >
"Acreditamos que o maior interesse deve ser colocado no acompanhamento desta pesquisa, dando suporte ao sistema de revisão ética brasileiro e, principalmente, aos participantes da pesquisa brasileira, bem como aos familiares dos falecidos." >
No relatório encaminhado à PGR, a Conep concluiu que os responsáveis pela pesquisa desrespeitaram quase todo o protocolo aprovado pela comissão em 27 de janeiro. >
Houve autorização para a realização da pesquisa com 294 voluntários em Brasília. No entanto, segundo a comissão, o protocolo começou a aplicado no Amazonas em fevereiro sem autorização. No total de 645 pessoas. >
O perfil dos voluntários mortos também era incompatível com o perfil clínico dos pacientes registrados na pesquisa. A proxalutamida deveria ter sido administrada em pacientes leves e moderados de Covid, mas os resultados indicaram que os óbitos foram atribuídos a insuficiência renal ou hepática, características de pacientes muito graves.>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta