Publicado em 8 de março de 2021 às 16:45
- Atualizado há 5 anos
Se por um lado abundam até aqui nomes cotados para a corrida presidencial de 2022 - em cenário de fragmentação na disputa pela cadeira de Jair Bolsonaro (sem partido) -, por outro um vácuo começa a ser notado: as mulheres sumiram da lista.>
Contando o candidato à reeleição, ao menos 12 homens constam nas tabelas de apostas, justo no momento em que a participação feminina no poder é mais discutida, e estimulada, do que nunca.>
São tratados como postulantes hoje, entre outros: Fernando Haddad (PT), Ciro Gomes (PDT), João Doria (PSDB), João Amoêdo (Novo), Luciano Huck e Sergio Moro (ambos sem partido).>
O quadro, a um ano e sete meses do pleito, difere do visto à mesma altura em eleições passadas. Sobretudo desde 2010, ano em que o Brasil elegeu a primeira mulher presidente, Dilma Rousseff (PT), líderes femininas fazem parte das opções testadas e articuladas desde cedo pelos partidos.>
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Em março de 2008, por exemplo, pesquisa Datafolha sondou a aceitação a Dilma, Marta Suplicy (então no PT) e Heloísa Helena (então no PSOL). No ano seguinte, se juntou ao grupo Marina Silva (então no PV), postulante em 2010, 2014 e 2018, algo que agora parece difícil se repetir.>
Desta vez, uma das poucas mulheres que ganharam notoriedade foi uma personagem de fora do universo político, a empresária Luiza Trajano. A presidente do conselho de administração do Magazine Luiza tem sido assediada por partidos, mas por ora resiste a se candidatar.>
PT, PSB, PSDB e PDT são algumas das legendas que já fizeram acenos a Luiza. Oficialmente, ela responde que não tem planos eleitorais e que seu foco é a campanha Unidos pela Vacina, que ela criou para tentar unir esforços no combate à pandemia de Covid-19.>
Além do histórico de liderança no setor privado e da boa relação com governos, a empresária é valorizada por características como habilidade de comunicação e tino de gestão, segundo entusiastas da candidatura.>
Dirigentes partidários, pré-candidatos e articuladores de campanhas ouvidos pela reportagem nos últimos dias arriscaram palpites diferentes para a tímida presença das mulheres no xadrez de 2022.>
Todos falaram em anonimato e evitaram mencionar nomes, por alguns motivos: disseram que o momento é de indefinição, que é possível o aparecimento de competidoras com potencial e que não pretendem melindrar eventuais apoiadoras ou vices.>
Uma das hipóteses está ligada à saída de cena ou à perda de capital político de veteranas como as quatro já citadas. Ao mesmo tempo, a renovação geracional se deu em um ritmo aquém do desejado, apesar de mecanismos de fomento e da pressão social por representatividade.>
Desde 2018, as legendas têm que preencher com mulheres no mínimo 30% das vagas nas chapas para o Legislativo. Desde 2020, é obrigatória a destinação de 30% do fundo eleitoral para essas candidaturas.>
Nas duas últimas eleições, contudo, os resultados para o Executivo deram sinais frustrantes: só um Estado elegeu uma governadora --o Rio Grande do Norte, com Fátima Bezerra (PT)-- e apenas uma capital passou a ter uma prefeita --Palmas (TO), com Cinthia Ribeiro (PSDB).>
A ausência de mulheres em altos postos nos Estados, de onde geralmente se projetam para uma disputa de alcance nacional, é vista como um dos fatores que podem aprofundar o vácuo já existente.>
Para um ex-governador de um Estado do Sudeste que está envolvido nas negociações sobre 2022 e foi consultado pela reportagem, o apagão demonstra que as medidas tomadas para ampliar a presença feminina levam tempo para produzirem efeito concreto.>
Um político do Nordeste também mergulhado nos bastidores da eleição relatou a mesma impressão, dizendo que políticas afirmativas são incapazes de mudar a cultura de uma hora para outra.>
Mas pontuou: ainda que estejam fora das cabeças de chapa em 2022, mulheres serão procuradas com afinco para os postos de vice. Uma das razões é pragmática, já que ter uma figura feminina ao lado do candidato é tido como chamariz para as eleitoras, que são 52% do total de votantes.>
A dobradinha de Kamala Harris com Joe Biden na eleição dos Estados Unidos aparece, na ótica dos estrategistas, como modelo a ser replicado.>
"Os partidos já entenderam que as mulheres são maioria no eleitorado e um público importante se o objetivo é ganhar eleições", comenta a cientista política Daniela Rezende, do Núcleo Interdisciplinar de Estudos de Gênero da Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Minas.>
"Esse reconhecimento da importância das mulheres, entretanto, não avançou, já que na maioria das legendas ainda prevalece a noção equivocada de que mulher é 'ruim de voto'", segue ela, acrescentando que a solução para o gargalo passa por mudar o comportamento das instituições.>
Dos 13 candidatos na eleição brasileira de 2018, 2 foram mulheres: Marina Silva (Rede) e Vera Lúcia (PSTU). Fechadas as urnas, as postulantes figuraram, respectivamente, no 8º e no 11º lugar. Entre os 11 homens, 5 escolheram vices do gênero oposto --um recorde.>
Haddad, que foi derrotado por Bolsonaro no segundo turno, teve como companheira de chapa Manuela D'Ávila (PC do B), que abriu mão da candidatura própria para formar a aliança na época.>
À reportagem, Marina diz que é preciso esperar o amadurecimento dos debates sobre 2022. "No Brasil, temos mulheres com muitas capacidades e possibilidades. Infelizmente, as eleições para as prefeituras nas capitais não trouxeram um avanço, mas isso não é uma realidade estática.">
A ex-senadora e líder da Rede, que em 2018 foi engolida pelos adversários e obteve 1% dos votos, desconversa sobre a possibilidade de se candidatar novamente, embora se declare disponível para um arranjo partidário de oposição.>
"Meu plano é sempre contribuir, para que a gente possa ajudar o Brasil a sair dessa situação terrível em que nos encontramos. Se a gente tiver uma boa proposta, a gente pode juntar as melhores pessoas e verificar, entre elas, quem tem as possibilidades de derrotar o Bolsonaro.">
Para Vera Lúcia, que cogita nova candidatura, o problema está longe de ser escassez de liderança feminina, já que mulheres estão à frente de grandes movimentos. A exclusão, segundo ela, é reflexo direto do machismo nas instituições, inclusive partidos.>
"A concorrência em 2018 não se deu em pé de igualdade nem na condição de gênero nem na de classe social. Pela primeira vez, uma mulher, nordestina, negra e pobre, com um programa socialista, concorreu à Presidência e, mesmo assim, poucos brasileiros me conhecem e menos ainda o programa do PSTU.">
Crítica do capitalismo, a ex-presidenciável acredita que a lógica de ganho eleitoral está no centro da busca da maioria das legendas por candidatas.>
Para a cientista política Debora Gershon, a predominância de homens nas opções para presidente é, em última análise, fruto das barreiras históricas para a população feminina. "Há uma enorme quantidade de representantes preparadas para assumirem posições de comando no Legislativo e no Executivo, a despeito do fato de que a formação política não tem sido prioridade para boa parte das legendas tradicionais", afirma.>
Segundo ela, que é pesquisadora do OLB (Observatório Legislativo Brasileiro), mulheres são cerca de 45% dos filiados a partidos, embora ocupem pouco mais de 20% dos cargos de direção nas siglas. "A desigualdade de gênero precisa ser seriamente enfrentada.">
Ainda de acordo com Debora, a perpetuação das candidaturas laranjas femininas é sintoma de que cota e distribuição proporcional de recursos, embora sejam ações importantes, não resolvem sozinhas o problema. "O fundamental é mudança de cultura partidária e fiscalização.">
Ciro Gomes (PDT)>
Eduardo Leite (PSDB)>
Fernando Haddad (PT)>
Lula (PT)>
Flávio Dino (PC do B)>
Guilherme Boulos (PSOL)>
Jair Bolsonaro (sem partido)>
João Amoêdo (Novo)>
João Doria (PSDB)>
Luciano Huck (sem partido)>
Luiz Henrique Mandetta (DEM)>
Sergio Moro (sem partido)>
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