Publicado em 18 de fevereiro de 2021 às 09:36
- Atualizado há 5 anos
Após o Supremo Tribunal Federal (STF) referendar por unanimidade a decisão do ministro Alexandre de Moraes que determinou a prisão em flagrante de Daniel Silveira (PSL-RJ), a Câmara dos Deputados passou a quarta-feira (17) em articulações para derrubar a medida – mas, em uma tentativa de aceno à Corte, estuda aplicar uma punição ao deputado bolsonarista. >
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tentava costurar um acordo com os partidos e com integrantes do STF no sentido de revogar a prisão, considerada um precedente perigoso aos olhos dos parlamentares, mas assegurando um rito acelerado para suspender ou até cassar o mandato de Silveira.>
A intenção de Lira, que está no início de sua gestão, é a de que o plenário da Câmara nem precise usar nesta quinta-feira (18) de sua prerrogativa de dar a palavra final sobre se mantém ou não a prisão. As conversas se prolongariam pela noite de quarta e manhã desta quinta.>
Lira chegou a telefonar para ao menos dois ministros do STF na tentativa de articular uma saída política. Segundo relatos, ele deu o recado de que não quer gerar uma crise entre os Poderes, mas que seus aliados temiam, caso validassem a prisão, criar um precedente que pode se voltar contra qualquer um deles no futuro.>
>
Integrantes do tribunal, por sua vez, indicaram que veriam como uma afronta do Parlamento uma atitude que livre Daniel Silveira sem qualquer contrapartida, mesmo após o vídeo em que ele faz diversas ofensas e ameaças contra integrantes do STF, além de defender a ditadura militar. É preciso condenar enfaticamente os ataques à corte, avaliam magistrados.>
Tanto é que, após Moraes determinar a prisão do bolsonarista na noite de terça, o STF chancelou a medida por 11 votos a 0 nesta quarta.>
Na conversa com integrantes do STF, Lira insistiu em um acordo no qual Moraes revogaria a própria decisão e a transformaria em medidas cautelares, como uma prisão domiciliar. O ministro, porém, resistia.>
Silveira passará na tarde desta quinta pela audiência de custódia, que será conduzida pelo juiz Aírton Vieira, que já trabalhou com Moraes.>
Em contrapartida a um recuo do ministro do STF, Lira determinou a reativação do Conselho de Ética da Câmara, que estava paralisado em decorrência da pandemia, e enviou representação contra Silveira. A promessa feita a políticos e ministros é acelerar o rito que pode resultar em uma suspensão ou até na cassação do mandato de Silveira.>
Havia a defesa de aprovação imediata da suspensão do mandato do deputado, situação que, por não ter previsão do regimento da Casa, teria que ser feita por meio de acordo político.>
O presidente da Casa não quer afrontar o Supremo para evitar crise no início da sua gestão. Mas existe também como pano de fundo o fato de o parlamentar estar na mira de ao menos três casos no STF. Desses, dois já tiveram a denúncia recebida por maioria dos ministros, mas as ações penais ainda não foram formalizadas em razão de recursos.>
Em reserva, um ministro da corte disse que Lira demonstrou boa vontade com o tribunal no caso Silveira.>
A representação feita pela Mesa Diretora da Câmara pode ser anexada a uma que já existe contra o parlamentar no órgão e que está sob avaliação do deputado Alexandre Leite (DEM-SP). Ele relata o processo ao qual o ex-PM responde por ter gravado e divulgado uma reunião do partido em 2019, durante a qual o deputado Delegado Waldir (PSL-GO) chamou Bolsonaro de "vagabundo".>
"Não posso antecipar voto, porque posso ser o relator [do novo processo], mas é uma conduta muito grave que certamente trata de quebra de decoro parlamentar", afirmou Leite. "Então o que temos que ver no colegiado é o nível de punição a ser aplicado", complementou.>
Daniel Silveira é um dos mais barulhentos defensores de Jair Bolsonaro. Auxiliares do presidente da República o aconselharam, entretanto, a não comentar a prisão para evitar escalar ainda mais a crise entre os Poderes>
Até a noite desta quarta, Bolsonaro -que por diversas vezes entrou em confronto com ministros do STF e apoiou manifestações antidemocráticas- não havia dado qualquer declaração pública sobre a detenção de Silveira.>
Segundo interlocutores, o presidente e membros da ala ideológica ficaram contrariados com a prisão ordenada pelo STF, principalmente por ela ter sido feita com base num vídeo publicado nas redes sociais. Eles temem que a medida abra brecha para novas punições de bolsonaristas mais radicais, que têm um histórico de defesa da ditadura militar e de ataques ao Supremo.>
No entanto, o presidente foi orientado a permanecer distante, sob o argumento de que Silveira não é membro do governo e que o tema é da alçada do Judiciário e do Legislativo.>
Em meio ao embate, aliados de Bolsonaro buscam blindar a lista de projetos prioritários para o governo no Congresso, principalmente na área econômica. "Isso não atrapalha em nada", afirmou o líder do governo na Casa, Ricardo Barros (PP-PR), sobre o ambiente para a pauta, como reforma tributária, administrativa (que reformula o funcionalismo público) e projetos de interesse do governo.>
No curto prazo, a equipe econômica quer, por exemplo, garantir que uma nova rodada de auxílio emergencial seja mais enxuta que as parcelas do ano passado.>
A mais recente crise entre os Poderes teve início após o general Villas-Bôas Corrêa, ex-comandante do Exército, afirmar em livro-depoimento publicado pela Fundação Getulio Vargas que a cúpula do Exército, então comandado por ele, articulou um tuíte de alerta ao Supremo antes do julgamento de um habeas corpus que poderia beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2018.>
Relator da Lava Jato no STF, Edson Fachin publicou agora uma nota em reação e disse ser "intolerável e inaceitável qualquer tipo de pressão injurídica sobre o Poder Judiciário".>
Com o pretexto de criticar Fachin, na terça Daniel Silveira publicou na internet o vídeo que resultou na sua prisão. Em meio a palavras de baixo calão contra o relator da Lava Jato e outros magistrados, ele os acusa de vender sentenças e sugere agredi-los.>
"Hoje você se sente ofendidinho, dizendo que é pressão sobre o Judiciário, é inaceitável. Vá lá, prende Villas-Bôas. Seja homem uma vez na tua vida, vai lá e prende Villas-Bôas. Seja homem uma vez na tua vida, vai lá e prende Villas-Bôas. Fala pro Alexandre de Moraes, o homenzão, o fodão, vai lá e manda ele prender o Villas-Bôas.">
O deputado segue com as ofensas: "Vai lá e prende um general do Exército. Eu quero ver, Fachin. Você, Alexandre de Moraes, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes, o que solta os bandidos o tempo todo. Toda hora dá um habeas corpus, vende um habeas corpus, vende sentenças", afirmou.>
Silveira também afirma que Fachin é "moleque, mimado, mau caráter, marginal da lei" e depois acrescentou que é "vagabundo, cretino e canalha". O deputado bolsonarista também fala que o ministro é a "nata da bosta do STF".>
Em relação a Moraes, deputado chama o ministro de "Xandão do PCC" em alusão à facção criminosa Primeiro Comando da Capital. Disse também que Luís Roberto Barroso "gosta de culhão roxo" e, ao falar de Gilmar, fez um sinal com os dedos indicando dinheiro.>
Além da prisão e da possibilidade de punição pela Câmara, a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou o deputado federal nesta quarta por incitar, em duas ocasiões, o emprego de violência e grave ameaça para tentar impedir o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário e, ao menos uma vez, instigar a animosidade entre as Forças Armadas e o STF.>
As atitudes de Silveira, segundo a denúncia assinada pelo vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, configuram os crimes dos artigos 344 do Código Penal (por três vezes) e do artigo 23, inciso II (uma vez) e inciso IV (por duas vezes) da lei 7.170/1983 --este último combinado com o artigo 18 da mesma lei.>
O procurador-geral da República, Augusto Aras, e seus auxiliares da área criminal começaram a analisar o caso tão logo tomaram conhecimento da ordem de prisão.>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta