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Após ameaça de Bolsonaro às eleições, Pacheco diz que não vai haver retrocesso

Após ameaça de Bolsonaro às eleições, Pacheco diz que não vai haver retrocesso

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), subiu o tom contra o presidente Jair Bolsonaro e afirmou que não vai admitir qualquer ataque à independência do Congresso

Publicado em 9 de julho de 2021 às 17:46

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O presidente do Congresso Nacional. Rodrigo Pacheco
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, durante coletiva de imprensa. (Waldemir Barreto/Agência Senado)

presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), subiu o tom nesta sexta-feira (9) e afirmou que não aceitará retrocessos à democracia do país, em resposta às manifestações de militares sobre a CPI da Covid e às ameaças do presidente Jair Bolsonaro contra o processo eleitoral e democrático.

Pacheco falou à imprensa horas após Bolsonaro ter afirmado, sem apresentar nenhuma prova, que a fraude eleitoral está no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). No discurso, Bolsonaro ainda atacou o presidente da corte eleitoral e ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, a quem chamou de "idiota" e "imbecil".

As declarações ocorrem dois dias após o ministro da Defesa, Braga Netto, e os comandantes das Forças Armadas terem divulgado uma nota em que repudiam declarações feitas pelo presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM), na sessão de quarta-feira (7) da comissão.

INDEPENDÊNCIA DO CONGRESSO

Na entrevista desta sexta-feira, Pacheco destacou a importância da separação entre os Poderes. "Uma separação que definitivamente não signifique desunião, mas que signifique o respeito de cada Poder em relação ao outro naquilo que toca a atribuição do outro", disse.

"E quero aqui afirmar a independência do Parlamento brasileiro", continuou.

"A independência do Congresso Nacional, composto por suas duas Casas, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, que não admitirá qualquer atentado a esta sua independência e sobretudo às prerrogativas dos parlamentares de palavras, opiniões e votos, que naturalmente devem ser resguardados numa democracia."

A seguir, Pacheco também defendeu "a preservação absoluta de algo que é também inegociável, que é o Estado de Direito e a democracia".

"Nós não podemos admitir qualquer tipo de fala, de ato, de menção que seja atentatória à democracia ou que estabeleça um retrocesso naquilo que, repito, a geração antes da minha conquistou e que é nossa obrigação manter, que é a democracia no nosso país."

O presidente do Senado citou indiretamente as dúvidas levantadas por Bolsonaro quanto à segurança das eleições brasileiras.

"Portanto tudo quanto houver de especulações em relação a algum retrocesso à democracia, como a frustração das eleições próximas, vindouras, do ano de 2022, é algo com que o Congresso Nacional, além de não concordar, repudia evidentemente."

As declarações de Pacheco foram uma reação a Bolsonaro, que pela manhã atacou o TSE, o ministro Barroso, a CPI da Covid e de novo colocou em xeque as eleições de 2022.

"Então isso é fraude, é fraude, é roubalheira. Vocês acham que o Renan Calheiros, por exemplo, se pudesse fraudar a votação ele fraudaria pelo caráter que ele tem? A única forma de bandidos com Renan Calheiros se perpetuarem na política, entre outros que estão do lado dele, o nove dedos, é na fraude", afirmou Bolsonaro, referindo-se mais uma vez de forma pejorativa a Lula.

"Não tenho medo de eleições, entrego a faixa para quem ganhar, no voto auditável e confiável. Dessa forma [atual], corremos o risco de não termos eleição no ano que vem", acrescentou.

O presidente tem feito repetidas ameaças contra as eleições, numa radicalização de discurso que coincide com pesquisas de opinião que apontam o aumento de sua rejeição e o favoritismo de Lula no pleito de 2022.

Nesta sexta, Bolsonaro também disse que "já está certo quem vai ser presidente ano que vem". "Já está certo quem vai ser [presidente], como está aí. A gente vai deixar entregar isso?", questionou seus apoiadores.

Na quinta (8), Bolsonaro já havia feito ameaças. Ele declarou: "Eleições no ano que vem serão limpas. Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições".

A principal estratégia do presidente é questionar a segurança das urnas eletrônicas, sistema usado desde 1996 e considerado eficiente e confiável por autoridades e especialistas no país.

O próprio Bolsonaro foi eleito para o Legislativo usando o sistema em diferentes ocasiões, assim como venceu o pleito para o Palácio do Planalto em 2018 da mesma forma.

Bolsonaro defende a adoção do voto impresso -segundo ele, auditável. Tramita no Congresso uma proposta nesse sentido, mas a ideia conta com oposição de uma coalizão de partidos, alguns deles da própria base de Bolsonaro.

No início deste ano, após a invasão do Capitólio nos Estados Unidos por apoiadores extremistas de Donald Trump que contestavam o resultado das eleições presidenciais, Bolsonaro disse que, se não houver voto impresso em 2022, ou uma maneira de auditar o voto, haverá no Brasil "problema pior do que nos Estados Unidos".

A declaração se soma a um discurso contra o sistema eleitoral e a um contexto que inclui militarização do governo, flexibilização do acesso a armamento e naturalização da corrupção no país.

Para especialistas ouvidos anteriormente pela reportagem, toda essa atmosfera alimenta a desconfiança sobre um risco de golpe, que não deve ser ignorada, ainda que vários considerem improvável que tal cenário se concretize.

A estratégia de manter um discurso que coloca em xeque o sistema eleitoral brasileiro e, ao mesmo tempo, questiona um eventual resultado negativo nas urnas aproxima Bolsonaro de outros líderes populistas, a exemplo do que fez Trump antes de deixar a Casa Branca.

No Planalto, Bolsonaro faz do mandato uma campanha eleitoral constante, alimentando sua base de apoiadores mais fiel com a retórica própria do autoritarismo.

Apesar de eleito por vias democráticas, especialistas afirmam que, em vários episódios, Bolsonaro já expressou de forma clara seu desprezo pelo sistema.

Ataques ao sistema eleitoral e à urna eletrônica fazem parte da retórica de Bolsonaro desde a campanha. Na véspera do pleito, em outubro de 2018, ele afirmou que só perderia se houvesse fraude. "Isso só pode acontecer por fraude, não por voto, estou convencido", disse em live em outubro de 2018.

As acusações infundadas se mantiveram mesmo depois de eleito. Em março de 2020, Bolsonaro disse que teria vencido a eleição ainda no primeiro turno, porém nunca apresentou nenhuma prova disso.

Até hoje, não há evidências de que tenham ocorrido fraudes em eleições com uso da urna eletrônica. A urna possui diferentes medidas de segurança e de auditoria.

Independentemente disso, há especialistas que defendem que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) deveria aumentar a transparência do sistema eleitoral e melhorar as possibilidades de auditoria das eleições. O problema, dizem eles, é que o debate técnico e sério acaba ofuscado pela desinformação e por mentiras.

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