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É conselheira do CARF, subsecretária de Competitividade do Governo do Espírito Santo, mestre e doutoranda em Ciências Contábeis pela Fucape. Especialista em Direito Tributário pelo Ibet, atua com foco em política fiscal e econômica, equidade e eficiência econômica

Tributação de dividendos volta à mesa, mas esbarra em velhos obstáculos

Sem uma revisão estrutural que reequilibre a carga tributária entre renda, consumo e patrimônio, a proposta corre o risco de apenas ampliar a complexidade do sistema, sem reduzir sua regressividade

  • Rachel Freixo É conselheira do CARF, subsecretária de Competitividade do Governo do Espírito Santo, mestre e doutoranda em Ciências Contábeis pela Fucape. Especialista em Direito Tributário pelo Ibet, atua com foco em política fiscal e econômica, equidade e eficiência econômica
Publicado em 19/06/2025 às 10h30

proposta de retomada da tributação sobre lucros e dividendos, prevista no Projeto de Lei nº 1087/2025, reacende um dos debates mais relevantes da política fiscal brasileira. Com uma alíquota de 15% e isenções dirigidas a empresas de pequeno porte e rendimentos mais baixos, o texto sugere maior progressividade no sistema.

Entretanto, repete erros técnicos de projetos anteriores e ignora critérios fundamentais que orientam um sistema tributário moderno, como eficiência econômica, simplicidade, equidade, responsabilidade política, flexibilidade e resistência à corrupção.

Estudos empíricos com base em dados de empresas listadas na B3 indicam que a decisão de distribuir dividendos está mais associada à geração de caixa e à rentabilidade operacional do que a estratégias de elisão fiscal. Análises recentes também apontam que os argumentos recorrentes nos projetos de lei, como a suposta agressividade fiscal e ausência de tributação entre pares, carecem de evidência técnica robusta, como demonstrado em pesquisa aplicada sobre o tema.

O projeto também carece de uma avaliação técnica que mensure seus efeitos reais sobre arrecadação, comportamento dos agentes econômicos e distribuição de renda. Ignora, ainda, um princípio basilar defendido pelo economista Joseph Stiglitz, Nobel em Economia: a necessidade de tributar de maneira que os efeitos sobre decisões de trabalho, investimento e poupança sejam minimamente distorcivos.

No Brasil, a tributação permanece concentrada sobre o consumo e a renda do trabalho, o que penaliza os assalariados e desestimula a formalização. Apesar de introduzir o chamado Imposto de Renda Pessoa Física Mínimo (IRPFM) para altas rendas, a proposta adiciona camadas de complexidade à apuração do imposto, sem oferecer mecanismos claros de operacionalização.

A ausência de simplificação administrativa compromete o cumprimento espontâneo das obrigações fiscais e aumenta o custo de conformidade para o contribuinte.

O projeto também mantém isenções amplas para regimes como o Simples Nacional e o Lucro Presumido, justamente onde se concentram estratégias de fragmentação de lucros que dificultam a efetiva aplicação da tributação. Embora o discurso oficial destaque a busca por justiça fiscal, o conteúdo do projeto reforça uma motivação arrecadatória dissociada de políticas efetivas de redistribuição.

Mudança na forma de cobrar impostos exigirá transformação na economia capixaba
Impostos. Crédito: Shutterstock

Sem uma revisão estrutural que reequilibre a carga tributária entre renda, consumo e patrimônio, a proposta corre o risco de apenas ampliar a complexidade do sistema, sem reduzir sua regressividade. Além disso, a falta de articulação com instrumentos que promovam transparência e responsabilidade política limita o impacto redistributivo da medida.

A tributação de dividendos é, por si, legítima e necessária. O problema está em implementá-la de forma isolada, sem considerar os fundamentos econômicos, jurídicos e institucionais que sustentam um sistema tributário funcional. Sem base empírica robusta e sem uma agenda coordenada de reformas, o PL 1087/2025 pode se tornar mais uma tentativa simbólica de reforma, com baixo efeito redistributivo e potencial de desincentivo ao investimento, à geração de empregos e ao crescimento econômico sustentável.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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