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É diretora estadual da Associação Brasileira dos Advogados (ABA)

Por que precisamos de uma mulher no STF?

A resposta a esta pergunta, lamentavelmente, caiu em uma disputa política-ideológica que prejudica toda a racionalidade que este tema tão importante merece

  • Érica Neves É diretora estadual da Associação Brasileira dos Advogados (ABA)
Publicado em 03/10/2023 às 11h57

A resposta a esta pergunta, lamentavelmente, caiu em uma disputa política-ideológica que prejudica toda a racionalidade que este tema tão importante merece para a sociedade, o sistema judicial e principalmente para as mulheres do campo jurídico e político do Brasil.

Não tratarei aqui de um sistema de cotas para a nomeação dos ministros do STF, nem muito menos de substituição de uma ministra por outra ministra. Tão somente, avaliaremos a importância do Tribunal, declinaremos quais os requisitos pessoais para a nomeação ao cargo de ministro e destrincharemos como acontecem as escolhas, para, então, concluir se realmente a Corte tem necessidade de ter mulher em sua composição.

Pois bem, qualquer cidadão hoje sabe que o Supremo Tribunal Federal é guardião da Constituição Federal e a última instância do Poder Judiciário, e que seus membros são decorrentes de uma escolha política do presidente da República, que por sua vez é eleito pela maioria da população brasileira em um sistema democrático.

Os limites impostos pela Constituição Federal a esta escolha é que o nomeado seja um brasileiro nato, entre 35 e 75 anos de idade, com notável saber jurídico. E já concordando com o ex-presidente da República Michel Temer, também entendo que este saber jurídico precisa ter sido validado com o bacharelado em Direito, seja para evitarmos uma presunção subjetiva do saber jurídico ou para impor o respeito ao equilíbrio entre os poderes e à importância da Corte.

Neste caminho delimitado pela norma, traduz-se que estão na corte máxima os que estão no topo da pirâmide do sistema judicial, os que se destacaram em suas áreas e mantiveram bons relacionamentos políticos, os que desenvolveram suas carreiras de forma sólida, acompanhando e respeitando o desenvolvimento político da sociedade, mas principalmente, os que têm capacidade jurídica e política inquestionável.

Fica bem claro que, sendo uma nomeação política, todos os efeitos da política partidária estão entremeados nas definições de possíveis nomes e o resultado será o espelho do que a política partidária mais forte da República deseja para a corte e consequentemente para o avanço da sociedade que dependa do sistema judicial.

Concluímos, então, que não existe qualquer menção a gênero, isso é certo, todos sabem. Mas por que incomoda pensar que a Corte Máxima não tenha mulheres se a escolha é política? Por que seria importante a presença de uma mulher? Por que uma corte composta de homens seria prejudicial e a quem?

Pois bem, a repugnância de alguns sobre o sistema de cotas ou os que defendem a meritocracia em qualquer ambiente é reflexo do desgaste da política partidária, que causa um embate vazio.

Olhemos pelo outro lado, ou seja, será que não temos mulheres que suprem todos os requisitos? Um tribunal máximo composto apenas de homens terá uma visão completa dos temas sensíveis que lhe são submetidos? Por que mulheres não estão conseguindo que suas competências sejam validadas?

Edifício sede do Supremo Tribunal Federal, em Brasília
Edifício sede do Supremo Tribunal Federal, em Brasília. Crédito: Nelson Jr./SCO/STF

Partimos da premissa que a falta de interesse ou menor competência das mulheres é narrativa falsa e ultrapassada. Então, precisamos encarar o funil que está estrangulando as mulheres e as impedindo de estarem no topo da lista de opções políticas, tal como a escolha para o STF.

Defendo que vivemos em um grande sistema conjunto de representação no qual o crescimento de uma mulher reflete nas demais sempre. Mulheres vêm conquistando, por suas competências e esforços, os espaços importantes na política, nas instituições, nas empresas, nas organizações, nos tribunais, e creio muito que este crescimento ocorre de forma conjunta, mesmo não estando efetivamente juntas.

Quanto mais mulheres boas na política, mais entram. Quanto mais mulheres empresárias na liderança, outras se inspiram e mais empresas as reconhecem e identificam. Quanto mais mulheres à frente das instituições da sociedade civil, mais os receios se esvaziam e mais conquistarão seus espaços. Quanto mais mulheres com poder em qualquer área, mais validam as demais de qualquer outra área.

Estamos vendo acontecer esta consciência coletiva de reconhecimento e respeito das competências femininas em todas as áreas e estão todas interligadas, pois fazemos parte de uma sociedade una, apesar de plural. E este caminho está resultando no repúdio que vemos hoje em aceitar pacificamente que na Corte Suprema tenhamos apenas homens, ainda bem!

Não é uma expectativa ideológica, é uma expectativa da sociedade que tem hoje mulheres valorosas em posições de poder e que entendem as consequências negativas da ausência de mulheres nos ambientes e as consequências positivas da presença de suas competências nestes mesmos ambientes.

Se hoje existe uma pressão política e social para a nomeação de uma mulher, a fim de evitar que tenhamos um Tribunal absolutamente caolho, é porque o avanço das mulheres competentes na sociedade trouxe tamanho benefício e crescimento que não podemos imaginar que este reflexo positivo não chegue ao STF e ao reconhecimento do presidente da República.

Então, por que esperamos uma mulher no STF? Porque o STF precisa, porque a sociedade precisa, porque nós, mulheres, precisamos deste merecido reconhecimento.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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