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É sócio e cofundador da Alliá Public Affairs, especialista em Políticas Públicas e Advocacy, e atua no mercado de relações institucionais e governamentais

Não há democracia sem defesa de interesses

O Brasil precisa discutir o tema com maturidade. Desde a década de 90, com a crescente participação da sociedade civil na política, diferentes entidades tentam tirar os rótulos pejorativos que envolvem as relações governamentais e aperfeiçoá-la

  • Rafael Porto É sócio e cofundador da Alliá Public Affairs, especialista em Políticas Públicas e Advocacy, e atua no mercado de relações institucionais e governamentais
Publicado em 23/09/2023 às 03h00

Que semelhança há entre a liberação do uso terapêutico do canabidiol, a pavimentação de ruas em bairros de periferia, o Marco Legal do Saneamento e o desconto de IPI para pessoas com deficiência? Guardadas as devidas proporções, todas são conquistas obtidas por meio da defesa de interesses de grupos específicos — erroneamente vilipendiada no Brasil.

É inegável que as Relações Institucionais e Governamentais (RIG) são parte essencial da democracia. Estão inclusive no artigo 5º da Constituição Federal, que garante “direito de petição aos poderes públicos”. O processo permite que mesmo grupos com pouca representação no poder público, a exemplo de pacientes com doenças crônicas e minorias étnicas, sejam ouvidos e tenham seus argumentos considerados.

Entram nessa afirmação, portanto, mães em busca de novos tratamentos para seus filhos, associações de moradores pressionando prefeituras e empresas interessadas em abrir novos mercados — consequentemente, gerando empregos e desenvolvimento. A defesa de interesses, em sua essência, é positiva e necessária para garantir pluralidade ao debate e participação popular na política.

Outro impacto positivo do RIG é a promoção da inovação e do progresso. Em muitos casos, grupos de interesse se unem para estudar, organizar evidências científicas e defender políticas públicas que promovam o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida. O trabalho ajuda a criar consenso e, feito de forma ética, calibra a visão do poder público para problemas complexos da sociedade.

O Brasil precisa discutir o tema com maturidade. Desde a década de 90, com a crescente participação da sociedade civil na política, diferentes entidades tentam tirar os rótulos pejorativos que envolvem as relações governamentais e aperfeiçoá-la. Controladoria Geral da União, Ministério Público Federal e mesmo a OCDE são algumas das instituições que enxergam na regulamentação uma ferramenta de combate à corrupção.

Nos Estados Unidos, a primeira legislação sobre RIG data de 1946 e foi estruturada sobre três pilares: registro dos profissionais que farão interlocução com o Congresso; transparência sobre clientes, objetivos do trabalho, receitas e gastos previstos; e definição dos limites éticos da atividade, vedando conflitos de interesse, subornos ou quaisquer incentivos ilegais que corrompam o processo democrático.

Sessão na Câmara dos Deputados
Sessão na Câmara dos Deputados. Crédito: Bruno Spada/Agência Câmara

No ano em que celebraremos 35 anos da Constituição Cidadã, avançar com o PL 2914/2022 no Senado — outrora PL 1202/2007 na Câmara dos Deputados — é garantir mais transparência e ética para nossa política. Toda a sociedade ganhará se tivermos cada vez mais espaços para discutir argumentos técnicos, analisar demandas sob objetivos claros e mapear os atores que influenciam, de forma legítima, a boa política.

No Espírito Santo, que é referência nacional em transparência, temos uma relação republicana e saudável entre poder público e sociedade civil organizada. É parte da nossa cultura ouvir e dialogar. Ainda assim, evoluiremos ainda mais incorporando a experiência e a metodologia que os grandes mercados de RIG, como Estados Unidos e Europa, vêm utilizando há décadas. Creio que estamos prontos para essa evolução.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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