
Henrique Geaquinto Herkenhoff e Bruno Requião da Cunha*
A Ciência de Redes é um ramo interdisciplinar do conhecimento surgido no século XVIII a partir da matemática discreta (ou finita), recebendo contribuições da física (mecânica estatística), da mineração de dados (ciência da computação), da sociologia etc.
Sob sua análise, uma organização criminosa nada mais é do que uma rede de relacionamentos interpessoais compostas por vértices ou nós (indivíduos) e arestas (vínculos ou relacionamentos), o que permite mapeá-las e estudar e prever o seu comportamento com rigor matemático.
O senso comum supõe que a melhor maneira de combater uma organização criminosa é prender o maior número possível de seus integrantes, o que corresponde a eliminar as arestas. O que a ciência de redes indica, em primeiro lugar, é que geralmente é mais fácil desestruturar uma organização pela regeneração completa ou morte de alguns poucos elementos (vértices), eliminando suas ligações internas (arestas), até porque determinado indivíduo, muitas vezes subalterno na hierarquia, pode concentrar muito mais ligações que seus superiores. O confinamento solitário tem o mesmo efeito; ou seja, é indispensável o isolamento completo, mesmo que temporário, de presos cujo papel seja prioritário de acordo com critérios físico-estatísticos.
A efetiva regeneração (ou o isolamento) é muito mais eficaz do que a simples detenção temporária, mesmo de um gigantesco número de integrantes, e a escolha, com base em modelos físico-estatísticos, de uns poucos indivíduos prioritários pode permitir fragmentar a rede criminosa com a prisão de apenas 2% dos criminosos. Por outro lado, esses indivíduos prioritários frequentemente não serão os mais importantes na hierarquia e nem mesmo os mais profunda ou fortemente ligados à organização: a quantidade e relevância estrutural ou funcional dessas ligações é o que importa.
Em resumo, pescar com anzol ou redes de arrasto definitivamente não é a melhor maneira de desbaratar organizações criminosas. Aqui é preciso mergulhar na hora certa e com um objetivo específico cuidadosamente escolhido de antemão, usar arpão e pegar exatamente peixe correto; não necessariamente o maior, nem o mais agressivo, mas aquele cujas conexões, numerosas e/ou estratégicas, uma vez suprimidas, impedem a continuidade do restante.
Eliminado um pequeno mas preciso conjunto de ligações, a rede criminosa pode ser desestruturada como um castelo de cartas, embora permanecesse incólume a perdas numerosas ocorridas ao acaso ou fora de sincronia.
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*Os autores são, respectivamente, professor do mestrado em Segurança Pública da UVV; e agente da Polícia Federal, pós-doutor em Matemática Aplicada (University of Limerick, Irlanda) e doutor em Física Teórica (UFRGS)
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