João Gualberto*
Uma nova onda varre o mundo ocidental em termos políticos. Ela se organiza a partir de discursos autoritários em muitos países como Estados Unidos, Rússia, Itália, Hungria, Polônia. Muitas obras têm sido publicadas para tentar entender o novo fenômeno: o ressurgimento de uma direita mais virulenta e menos liberal. “Como as Democracias Morrem” de Steven Levitsky e Daniel Ziblat, professores de Ciência Política em Harvard, e “O Povo contra a Democracia” de Yascha Mounk, da Universidade Johns Hopkins, são dois ótimos exemplos.
Esses trabalhos apontam para as bases comuns do novo autoritarismo: o ódio à globalização, chamada de marxista cultural; a nostalgia de um passado melhor e com ordem; o incentivo à polarização que divide a população entre eles e nós; a criação de um movimento anti-intelectual que é tanto contra o chamado jornalismo de base quanto às universidades públicas; o retorno a conceitos de hierarquia e ordem típicos de sociedades mais tradicionais; o uso da polícia para punir desafetos políticos; ataque a homossexuais, mulheres, travestis e outros grupos sociais que seriam responsáveis pela degeneração moral da nação; a propaganda política estruturada em fake News e a tentativa de um retorno nostálgico aos valores da terra, da família e das tradições. Evidentemente que cada país dá seu peso próprio a esses elementos.
Talvez a nação que tenha conseguido implantar com mais perfeição o modelo seja a Hungria de Viktor Orbán. Transformou-se Órban, de forma quase perfeita, no modelo do novo tirano: autoritário, mas de um autoritarismo com forte apelo popular. Viktor Órban lançou então o modelo do que ele chama de Democracia Iliberal, com forte base nas mídias digitais. Parece ser esse o destino de outras nações hoje.
A historiadora brasileira Lilia Moritz Schwarcz acaba de lançar um bom trabalho, chamado “Sobre o Autoritarismo Brasileiro”. Sua intenção é a de dialogar com esses trabalhos internacionais. Para isso trabalha então três conceitos que me parecem fundamentais para estudar o caso brasileiro: a escravidão e o racismo que ela alavancou, o mandonismo e o patrimonialismo.
Assim, o brasileiro, pilotando essas heranças do nosso processo histórico – daquilo que chamo da construção do nosso imaginário social –, tem dado passagem a essa onda mundial e a ela aderiu claramente na eleição de 2018, transformando o presidente Bolsonaro em candidato a gestor dessa Democracia Iliberal.
A questão que nos cabe responder agora é se o exercício do poder, pelos que recentemente chegaram a ele, vai realmente construir entre nós esse novo modelo, ou se as nossas instituições e, sobretudo, nossa cultura democrática resistirá aos novos modelos de fazer política.
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* O autor é doutor em Sociologia Política
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