
Henrique Geaquinto Herkenhoff*
Não temos um gosto particular por estatísticas. Aliás, como dizia Monteiro Lobato, essa tal de matamática a gente estuda, estuda, e não mata nada... Pior ainda quando pedimos a um médico ou a um escrivão de polícia que preencha formulários e forneça números para serem contabilizados.
Ele naturalmente pensa – e tem certa razão – que estamos inventando mais uma tarefa, e burocrática ainda por cima. Some-se a isso que autoridades públicas são tentadas a manipular os dados para propaganda política. O resultado é que, com raras exceções pontuais, nossas estatísticas de segurança pública não passam de estimativas precárias inconfiáveis e desinformadoras.
Há outros problemas, como a sub e a supernotificação. Pesquisas de vitimização revelaram que 80% dos crimes não são sequer comunicados à autoridade policial; o registro das ocorrências fica quase que limitado àquelas muito graves ou quando a vítima pretende receber o seguro. Por outro lado, não é incomum que o roubo de um único veículo seja primeiro comunicado ao serviço de emergência, depois registrado na delegacia mais próxima e, por fim, na delegacia especializada, e a falta de interação permite que a mesma ocorrência seja contada três vezes.
A estatística não é matemática pura, não é ciência exata, mas isso não autoriza que cada um de nós bata nos números até eles dizerem o que queremos, para defendermos as ideias que nos são simpáticas. O papel dos estatísticos e dos economistas na segurança pública tem sido sistematicamente subdimensionado.
Decisões como restringir ou liberar o porte de armas, criminalizar ou descriminalizar as drogas são tão importantes e passíveis de análise racional quanto a taxa Selic ou a carga tributária. Aumentar ou diminuir o número de encarcerados repercute diretamente tanto nos índices de violência – não necessariamente na direção esperada – quanto no equilíbrio fiscal (e a crise no governo do RJ está aí mostrando o quanto uma política de combate ao crime pode ter desdobramentos “inesperados”).
Nossos recursos públicos, assim como os privados, devem ser racionalmente empregados, seja no sentido de obter a melhor relação entre custo e benefício, seja no de dividi-los equilibradamente entre as várias necessidades: saúde, educação, segurança etc. Contudo, o que não for medido não poderá ser melhorado. É impossível tomar ou avaliar decisões estratégicas sem aferir com precisão e confiabilidade os resultados práticos. A alternativa às estatísticas é a bola de cristal.
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*O autor é professor do mestrado em Segurança Pública da UVV
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