Alguns anos após o descobrimento do Brasil, os espanhóis chegavam à República Oriental do Uruguai. As dicas do primeiro navegador não poderiam ser mais precisas: deixando o Oceano Atlântico e subindo o rio da Prata, a âncora deveria ser lançada na altura do Monte VI (sexto, em algarismos romanos) de este a oeste. Traduzindo, Montevidéu.
E é nesta tranquila capital onde, nos últimos cinco anos, aporto regularmente. Eu e as baixas temperaturas. Vou para reencontrar uma gente amável, comer carne de cordeiro, beber Tannat Roble, perder-me nos dez quarteirões da feira livre de Tristán Narvaja e passear pelos três andares da mais antiga livraria do país, a Más Puro Verso. E é exatamente ali que as diferenças começam. Ser atendido por quem é do ramo não tem preço. Parece mentira, mas a intimidade com todas as obras – todas - nas prateleiras é surpreendente. Em Vitória, só me lembro de uma figura, competente assim, que atuava na saudosa Livraria Âncora. Se a memória ainda dá pro gasto, chamava-se Marilda. Hoje, em Vitória, nas livrarias de shopping mal,mal sabem o preço do livro.
A segurança que a cidade oferece chama a atenção. Não se tem notícias de assaltos nas ruas da capital. Noite e dia. Em avenidas movimentadas ou em ruas escuras. Não há craqueiros amontoados sob marquises. Não lhe pedem dinheiro nas calçadas. No dia da volta pra casa, ainda pela manhã, raspei de cima do aparador do meu quarto de hotel um monte de moedas que me sobraram e saí, mão cheia, para descobrir alguém que pudesse precisar. Andei por seis quarteirões, da 19 de Julio e voltei pela calle San Jose. Ninguém pra querer meus trocados.
Montevidéu, assim como as demais capitais hispânicas das Américas, exageram no prazer à mesa. Ao pedir uma carne, o garçom acena com quatro opções de cozimento: bem assado, assado, mal assado e blue. Blue é a carne depois de passar correndo pela parrilha. E – o melhor - ela sempre vem conforme se pediu.
A cidade também é um exagero de beleza arquitetônica. Dezenas de prédios, lado a lado, na principal avenida do centro mais parecem relíquias de um museu a céu aberto.
Nunca deixo de dar um pulinho na histórica Colonia Del Sacramento. Para tomar um caldo na companhia de um cálice de grapa, para espantar o frio. É lá que o rio da Prata tem a sua largura mais estreita: 54 km! Do outro lado, Buenos Aires. Mas prefiro voltar correndo à capital e comer, uma vez mais, um rack de cordeiro no agitado El Fogon. Ou no - ainda mais agitado - La Perdiz.
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Perguntará o leitor, Montevidéu não tem problemas? Claro que tem. E para mim, na verdade, um problemão. Imperdoável, eu diria: na cidade toda não se encontra um único restaurante, um boteco que seja, onde se possa comer umas ostras frescas! Mas e daí? Vitória, cercada de mar por todos os lados, também não tem. E eu gosto das duas mesmo assim.
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