É difícil imaginar um país tão diverso em cultura e etnia, mas que ainda insiste em manter invisíveis pessoas que vivenciam duas vulnerabilidades históricas: ser indígena e ter deficiência. No Espírito Santo, essa realidade existe e tem números alarmantes revelados pelo Censo 2022: 11,4% da população indígena capixaba tem algum tipo de deficiência, quase o dobro da média da população em geral, que é de 7,3%. Apesar disso, pouco se fala sobre políticas públicas específicas para este grupo.
Foi justamente para colocar luz sobre esse cenário que a Federação das Apaes do Estado do Espírito Santo (Feapaes-ES) e a Apae Aracruz promoveram o seminário “Direito, inclusão e visibilidade: reflexões e trocas de saberes para o Bem Viver das pessoas indígenas com deficiência”, realizado na Aldeia Pau Brasil, em Aracruz, no dia 10 de setembro.
Mais do que um evento, foi um marco histórico e inédito no Brasil, reunindo lideranças indígenas, autoridades nacionais e internacionais, especialistas e famílias para debater caminhos possíveis. A experiência da Apae Aracruz, que hoje atende 65 usuários indígenas com deficiência, mostra como a inclusão pode transformar vidas. O depoimento de Suelem Martine Rodrigues, da etnia Guarani, ao relatar a trajetória de seu irmão autista, é a prova viva de que acolhimento, orientação e acesso a direitos fazem diferença no cotidiano das aldeias.
O encontro mostrou que o diálogo entre saberes tradicionais e conhecimento técnico não é apenas desejável, mas indispensável e urgente. E não basta somente celebrar esta iniciativa: é preciso multiplicá-la. Essa discussão foi tema durante a COSP18, na ONU, neste ano, evento da qual a Federação Nacional das Apaes participou, deixando evidente que este é um desafio mundial. Os povos originários com deficiência seguem fora das estatísticas, dos protocolos e das prioridades governamentais, enfrentando barreiras múltiplas como a distância geográfica, a falta de transporte, a ausência de profissionais preparados, o desrespeito às línguas originárias e uma invisibilidade que compromete direitos básicos como saúde, educação e assistência social.
Este vídeo pode te interessar
É hora de enfrentar essa desigualdade com coragem e responsabilidade. O seminário de Aracruz é apenas o primeiro passo de um caminho que precisa ser seguido por governos, sociedade civil e instituições. Dar voz aos povos originários e enxergar suas especificidades não são caridades, é dever constitucional e humano. As políticas de inclusão precisam, com urgência, chegar às aldeias.
Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.