O Brasil registrou mais de 113 casos confirmados de intoxicação por metanol em diversos estados, incluindo São Paulo, Bahia, Paraná, Mato Grosso do Sul e Pernambuco, segundo dados do Ministério da Saúde. A contaminação ocorre por meio de bebidas alcoólicas adulteradas, e entre as consequências mais graves e iniciais está a perda permanente da visão.
O metanol é um álcool utilizado industrialmente como solvente e na fabricação de combustíveis. Diferentemente do etanol, álcool presente em bebidas legítimas, o metanol é altamente tóxico ao organismo humano. Quando ingerido, passa por um processo de metabolização no fígado, onde é convertido em dois compostos tóxicos: o formaldeído e, posteriormente, o ácido fórmico. É justamente o ácido fórmico o principal responsável pelos danos ao sistema nervoso central e aos olhos.
O mecanismo de lesão ocular acontece de forma específica. A retina, estrutura responsável por captar e processar as imagens que enxergamos, possui uma das maiores demandas energéticas do corpo humano. Para funcionar adequadamente, suas células necessitam de grande quantidade de oxigênio e glicose, transformados em energia através de um processo chamado fosforilação oxidativa, que ocorre nas mitocôndrias celulares.
O ácido fórmico interfere diretamente nesse processo energético. Ele inibe a enzima citocromo oxidase, bloqueando a cadeia respiratória celular. Sem energia, as células da retina e do nervo óptico começam a morrer. Como essas são células nervosas, não possuem capacidade de regeneração. Uma vez lesionadas, a perda visual torna-se irreversível na maioria dos casos. O sistema nervoso central sofre impacto semelhante, também devido à alta demanda energética do tecido cerebral.
Os sinais visuais iniciais incluem visão turva ou embaçada, fotofobia (sensibilidade à luz), dilatação das pupilas e perda da percepção de cores. Alguns pacientes relatam sintomas visuais característicos como fotopsias (percepção de pontos luminosos no campo visual) ou a sensação de "campo de neve" ou "chuva de pixels", onde visualizam pontos brancos dispersos na visão. Em alguns casos, a perda visual pode ser súbita, com pacientes acordando sem conseguir enxergar. Além dos sintomas visuais, ocorrem dor de cabeça, náuseas, vômitos, dor abdominal intensa, dificuldade respiratória e alterações neurológicas como confusão mental. Em casos graves, pode ocorrer cegueira completa, coma e morte por falência múltipla de órgãos.
O diagnóstico é realizado através da história do paciente, de ingestão de bebida adulterada e de exames laboratoriais que identificam a presença de metanol no sangue e o grau de acidose metabólica causada pelo ácido fórmico. O tratamento deve ser iniciado o mais rapidamente possível, preferencialmente nas primeiras seis horas após a ingestão. O protocolo inclui a administração de etanol ou fomepizol, substâncias que competem com o metanol pela metabolização no fígado, impedindo a formação de ácido fórmico. Em casos mais graves, pode ser necessária hemodiálise para remover o metanol e seus metabólitos do sangue.
A prevenção continua sendo a estratégia mais eficaz. A população deve adquirir bebidas alcoólicas exclusivamente em estabelecimentos regularizados, verificando a integridade dos lacres e selos de autenticidade. Produtos com preços significativamente abaixo do mercado ou de procedência duvidosa devem ser evitados. É importante ressaltar que o metanol não possui características organolépticas que permitam sua identificação em bebidas, ou seja, não altera cor, odor ou sabor de forma perceptível.
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Diante de qualquer sintoma após o consumo de bebidas alcoólicas, especialmente alterações visuais, é fundamental procurar imediatamente atendimento médico de emergência. A rapidez no tratamento é determinante para evitar sequelas permanentes como a perda permanente da visão ou óbito.
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