
Luan Sperandio*
Desde a década de 1990 há consenso entre economistas de que as regras na previdência brasileira a tornam insustentável: além do sistema privilegiar quem possui maior renda, com o envelhecimento da população a questão é um imperativo demográfico. Porém, a negligência das autoridades provocou o atual cenário de desequilíbrio fiscal: não há como a União voltar a ter as contas em dia e manter alguma capacidade de investimento e serviços públicos sem reformá-la.
Entender as consequências da irresponsabilidade fiscal é uma forma de se atentar aos riscos do “negacionismo previdenciário” difundido por corporações e partidos da esquerda nacional.
A Grécia quebrou em 2009 quando sua dívida chegou a 188,7% do PIB, resultado de quatro décadas de governos incapazes de gastarem menos do que arrecadavam. Em 2014, as despesas previdenciárias do país representaram 17,4% de seu PIB e consumiam 31,5% do orçamento governamental.
Os danos causados pela explosão da dívida foram superiores aos causados pela Grande Depressão de 1929: após oito anos de recessão, a renda média dos gregos despencou para quase a metade. A taxa de desemprego atingiu 33%, mas os índices de desocupação de jovens passaram dos 60%, havendo migração para outros países europeus.
Impulsionada por grupos de interesses bem articulados, a população grega se opôs a qualquer reforma, dando a vitória eleitoral ao Syriza, partido de extrema-esquerda historicamente contrário a medidas de austeridade. Porém, como dizia o ex-senador americano Daniel Patrick Moynihan, “você tem direito a suas próprias opiniões, não a seus próprios fatos”. E os fatos apontavam que a previdência era a raiz do problema fiscal helênico e da crise que seguiu.
O caos econômico sedimentou reformas que cortaram, inclusive, direitos adquiridos - algo ainda não cogitado no Brasil. Alguns beneficiários da previdência passaram a receber até 40% a menos.
Segundo análise da Consultoria do Senado, em alguns aspectos, o Brasil possui desempenho ainda pior do que a Grécia pré-crise. A participação do gasto da previdência no orçamento da União beira os 60%, o dobro da grega, podendo chegar a 82% em 2024 se não houver reforma. Além disso, a renda per capita brasileira é muito inferior à grega, havendo indicadores de risco mais elevados.
Tal como os gregos, os brasileiros ignoraram uma bomba-relógio por décadas. Contudo, não há atalhos: é preciso desarmá-la. Acaso isso não ocorra, o Brasil se tornar “uma Grécia” nos próximos anos será, paradoxalmente, uma tragédia otimista.
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*O autor é graduando em Direito pela Ufes e editor do Instituto Mercado Popular
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