Enfrentar o crime organizado é como lutar uma guerra particular

Evitar que alguém inadequado ingresse nas forças armadas ou policiais se tornou mais importante do que efetuar prisões

Publicado em 26/07/2019 às 16h58

Guerra de facções no Brasil

Henrique Geaquinto Herkenhoff e Denilson Gonçalves do Nascimento*

Não há nada mais desastroso do que um comandante insistir em empregar táticas e estratégias superadas. Que o digam as vítimas (1,2 milhão entre mortos e feridos dos dois lados) da Batalha do Somme, na qual os ingleses tiveram 19.240 mortos apenas no primeiro dia, e no final de cinco meses avançaram apenas 8 quilômetros...

Décadas atrás, as facções criminosas já adquiriam todo o armamento pesado que pudessem, porém, mal sabiam utilizá-lo. Recentemente, vêm se transformando em verdadeiras organizações paramilitares, tratando de aprender não apenas o manuseio de suas armas, mas também táticas de guerra.

Segundo reportagem publicada em 2018 no Estadão, elas estariam pagando de 3 a 5 mil reais por hora-aula de instrutores ex-militares. A título de exemplo, veja-se o assassinato, no Paraguai, de Jorge Rafaat, conhecido como Rei da Fronteira. Aliás, também têm sido frequente descobrir que elas vêm monitorando policiais e outras autoridades públicas, ou seja, que já montaram seus próprios serviços de inteligência.

Qual é o lucro obtido ao se incendiar um ônibus? Atos desse tipo têm dois únicos objetivos: assustar a população e desgastar as autoridades. Pressionado pela opinião pública, o governo cai na armadilha ensinada no “Manual do Guerrilheiro Urbano”, de Carlos Marighella, de 1969: desperdiça enormes recursos para identificar o autor material do atentado, geralmente um “soldado” do tráfico, quando não um viciado em dívida com a boca de fumo; eles nem sabem de onde partiu a ordem e certamente não têm nenhuma importância na ordem hierárquica do crime organizado, mas esta parece a única resposta política de curto prazo.

Estamos demorando a entender que o enfrentamento ao crime organizado é comparável a uma guerra assimétrica e que, portanto, precisaremos adaptar as suas táticas, estratégias e recursos: não apenas a inteligência precisa ganhar corpo, mas a contrainteligência passou a ser crucial, assim como a contra-guerrilha, a contrainsurgência e o contra-terrorismo.

Evitar que alguém inadequado ingresse nas forças armadas ou policiais, por exemplo, se tornou mais importante do que efetuar prisões, até porque você pode expulsar alguém da corporação, tomar sua arma e seu distintivo, como no cinema, mas não pode tirar dele o que já lhe foi ensinado. Instrumentos jurídicos também precisam ser adaptados, claro. O tradicional está superado, o que não significa que o novo já esteja pronto. Quem quiser detalhes, leia a dissertação do coautor deste artigo.

*Os autores são, respectivamente, professor do mestrado em Segurança Pública da UVV; capitão-tenente MB R2, ex-integrante do GRUMEC e mestre em Segurança Pública

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