Combate à criminalidade é mais efetivo com abordagens já experimentadas

Há enorme ganho de efetividade das medidas governamentais em matéria de violência ao abandonar abordagens instintivas

Publicado em 15/08/2019 às 21h49

Combate à criminalidade

Henrique Geaquinto Herkenhoff e Bruno Requião da Cunha*

As moléculas de gás dentro de um recipiente fechado se movimentam inteiramente ao acaso, colidindo umas com as outras e mudando incessantemente de direção. Contudo, sabemos perfeitamente que, se o espaço for reduzido, a pressão do gás aumentará na mesma proporção.

Em outras palavras, enquanto o comportamento particular de cada uma das moléculas é completamente caótico, o efeito da interação entre elas encaixa-se dentro de um modelo físico-matemático invariante, de maneira que o seu resultado em conjunto é amplamente previsível.

De maneira semelhante, é praticamente impossível prever o procedimento individual de um ser humano, mas não o de um grupo social, que não passa de uma intrincada rede de relacionamentos interpessoais, que podem ser mapeadas em um conjunto de vértices (pessoas) e arestas (ligações), possibilitando o estudo rigoroso dos padrões de comportamento.

Assim, a previsibilidade e a possibilidade de serem conhecidas e atacadas pelo todo, ainda que não se conheçam exatamente cada uma das partes, é um vício inerente às organizações criminosas, que dele não podem se livrar.

Por isso, e somente por isso, não há problema algum em tratar disto publicamente: um meliante pode tentar se esquivar de investigações policiais, mas sua organização não consegue evitar as pesquisas da física social e da ciência de redes, ramos interdisciplinares que procuram entender os fenômenos sociais pela perspectiva das ciências naturais e podem perfeitamente ser aplicadas ao enfrentamento às organizações criminosas.

Além disso, a reação média de uma massa de criminosos, ainda que não ligados entre si, a determinada política criminal também pode ser estudada independentemente dos seus efeitos pessoais, uma vez que, quanto maior o número de eventos analisados, maior a probabilidade de que os desdobramentos concretos correspondam exatamente às previsões estatísticas.

As possibilidades de aplicação de modelos da física estatística às políticas criminais e às estratégias específicas para enfrentamento das organizações criminosas são muito vastas para se resumirem em um único artigo. O que já se pode afirmar de início é o enorme ganho potencial de efetividade das medidas governamentais em matéria de violência e criminalidade se abandonarmos as abordagens puramente instintivas ou oriundas do senso comum em favor daquelas indicadas por estudos quantitativos baseados em modelos demonstrados e experimentados com sucesso no campo das ciências naturais.

*Os autores são, respectivamente, professor do mestrado em Segurança Pública da UVV; agente da Polícia Federal, doutor em Física Teórica (UFRGS) e pós-doutor em Matemática Aplicada (University of Limerick, Irlanda)

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