
Antônio Carlos de Medeiros*
A política tribalista do presidente Bolsonaro já afetou a sua popularidade. E mexeu com a configuração do tecido político brasileiro. Nesta toada, poderemos ter um sistema político-eleitoral com jeitão do Frankenstein.
O Datafolha mostrou que 61% dos brasileiros avaliam que Bolsonaro “fez menos do que dele se esperava”. Sua aprovação (ótimo/bom) permaneceu em 33%, mas o otimismo com a situação econômica segue em queda. Pode fazer com que os 31% que responderam “regular” na pesquisa venham a pender para avaliação negativa. Bolsonaro continua falando apenas para os mais ricos e mais velhos, o núcleo duro de sua popularidade. Continua falando só para a sua tribo.
Como se sabe, os movimentos políticos tribalistas desta segunda década do século XXI crescem do ceticismo com a democracia e do ressentimento dos que foram, supostamente, “derrotados” com a globalização. Bolsonaro navega nesta tensão entre humanismo liberal e populismo regressivo, autoritário e tribal. Este populismo colhe sua força nos valores da família e da religião e na ideia de nação como um jogo de soma zero entre um “nós” e um “eles”. O “nós” tem uma perspectiva tribal, e não a perspectiva do Estado-Nação. O tribalismo valoriza um líder (populista) forte e deprecia instituições governadas por normas e controles constitucionais que limitam os poderes do líder. Desafia as conquistas do progresso e do humanismo.
No Brasil, é uma incógnita saber como construir formas de superação do tribalismo teoconservador, fundamentalista e xenófobo, mesclado com o culto ao carisma e a personalidade. A boa notícia é que o governo assinou o acordo com a União Europeia, um grande passo para fazer as pazes com a globalização. Também, a sinalização de Bolsonaro a Macron, de que o Brasil vai continuar no Acordo de Paris do Clima, é outra notícia boa. É a imposição da realidade à retórica.
Aqui, nos EUA e na Europa, a polarização política e o crescimento de uma extrema direita ainda mais conservadora do que os conservadores tradicionais, assume a forma de “malaise” política crescente. Leva ao risco democrático de vitórias eleitorais por falta de opção em quem votar.
O voto dos “contra”. Bolsonaro foi eleito contra o PT e Macron foi eleito contra a extrema direita, por exemplo. Este efeito da política da polarização do “sim” contra o “não”, em que direita e esquerda se provocam e vão para os extremos, diminui o espaço político para a moderação e para a clássica convergência para o centro dos resultados eleitorais das democracias ocidentais.
A radicalização pelos extremos coloca fogo nas disputas eleitorais e políticas e fragiliza as democracias representativas. Ao levar a política para um simples jogo de “sim ou não”, ela pode produzir o Frankenstein da instabilidade: a política sem um centro...
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*O autor é pós-doutor em Ciência Política pela The London School of Economics and Political Science
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