
João Gualberto*
Comecei a estudar a coronelismo quando fiz meu doutoramento na École des Hautes Études en Sciences Sociales em Paris, nos anos 1980, sob a direção do filósofo grego Cornelius Castoriadis. Da minha tese, surgiu em 1995 a primeira edição do “Invenção do Coronel: ensaio sobre as raízes do imaginário político no Brasil”.
Quase 25 anos se passaram da data. Mas não seria exagero dizer que o sistema político brasileiro foi capaz de aprofundar algumas das suas estruturas a partir do personalismo e de padrões autoritários de comportamento.
A cultura brasileira ainda é rica nas características gestadas em todo o nosso processo social desde a fase colonial, tendo como figura chave do mandonismo brasileiro um ator que é central na instituição imaginária do poder no nosso sistema: o coronel.
Assim, considerando que o papel do coronel como grande ator social continua vivo entre nós, voltei ao texto, revi e ampliei para, neste segundo semestre de 2019, relança-lo pela Editora Edufes.
Instituição central na construção do poder no Brasil, o coronel é um personagem da chamada Primeira República, mas cujos restos sobrevivem até hoje. Inclusive no mundo empresarial, onde ainda existem traços desse coronelismo de viés autoritário. Esse é um motivo para que, em grande parte a gênese de nossa gerência se dê de costas para os padrões modernos de gestão de pessoas. Assim, o coronel é uma figura central, uma espécie de “Mestre da Significação” no mundo que fomos capazes de construir e que nos habita até hoje.
Não é por acaso que ele está no epicentro de nosso dilema. De um lado, as instituições que o coronelismo gerou não são mais capazes de dar conta de uma sociedade moderna como a que temos. De outro, ainda estamos presos aos personalismos e as saídas autoritárias.
No grande altar que construímos na política da ambiguidade que o coronel porta, colocamos o capitão Bolsonaro. Moderno quando usa os meios digitais de comunicação de massa digitais, mas arcaico quando o faz de forma personalista e autoritária, e ainda mais focado na sua própria família, símbolo maior da sociedade tradicional que queremos e precisamos vencer.
Decorre daí considerável parte da inadequação de seu funcionamento nos dias atuais. Sua inexorável crise. Ele foi construído garantindo o controle das elites partidárias. Nada de renovação, zero de alteridade. Portanto, assim como há 25 anos, se como sociedade temos a tarefa da construir uma vida mais justa e igualitária, ela passa pela compreensão mais generosa e atenta de importantes características da sociedade brasileira. Entre elas, a invenção do coronel.
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*O autor é doutor em Sociologia Política
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