Publicado em 15 de maio de 2025 às 10:37
MILÃO, ITÁLIA - O Senado italiano aprovou nesta quinta-feira (15), com 81 votos a favor e 37 contra, o decreto-lei do governo Giorgia Meloni que limita o acesso à cidadania italiana para descendentes nascidos no exterior. O texto ainda precisa ser aprovado até o próximo dia 27 pela Câmara, onde o governo também conta com maioria de votos.>
Em vigor desde o fim de março, o decreto restringe a duas gerações a transmissão e o reconhecimento da cidadania por direito de sangue para quem nasce fora da Itália. A medida, tratada como urgente pelo governo, significa uma mudança na Lei da Cidadania, de 1992, que não estipulava limite de gerações.>
Nas últimas semanas, o texto esteve em tramitação na comissão de Assuntos Constitucionais, onde os senadores puderam apresentar emendas. O relator foi Marco Lisei, do Irmãos da Itália, de ultradireita, mesmo partido da primeira-ministra Meloni. O texto final foi aprovado na quarta (14) e enviado ao plenário.>
Com dois artigos, o decreto passou pelo Senado sem grandes mudanças em seu teor. A principal alteração, incluída na comissão, foi a substituição do termo "nascido na Itália", em referência aos ascendentes, pelo trecho "possui ou possuía no momento da morte exclusivamente a cidadania italiana".>
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Ou seja, pela nova regra, uma pessoa nascida fora do país europeu só será considerada italiana se ao menos um genitor ou um avô (ou avó) tiver somente a cidadania italiana. Ao mesmo tempo em que remove a necessidade de o parente ter nascido na Itália, pode restringir ainda mais o acesso, ao excluir aqueles que têm ou tiveram dupla cidadania, como a brasileira, além da italiana.>
Além desse caso, pode ser considerada italiana uma pessoa cujo genitor tenha morado na Itália por ao menos dois anos sem interrupção após a aquisição da cidadania e antes do nascimento do filho.>
As regras valem para pedidos de cidadania apresentados após o anúncio do decreto, em 28 de março.>
"Não queremos dificultar a obtenção da cidadania italiana, queremos só tornar isso uma coisa justa. A cidadania é um assunto sério que não pode ser deixado à mercê de agências inescrupulosas", disse, no plenário, na quarta (14), o senador Costanzo della Porta, do Irmãos da Itália. A referência é às agências que oferecem serviços para a obtenção da cidadania, como a localização de documentos familiares e a entrada com processo na Justiça italiana.>
A medida foi criticada pela oposição, que questionou especialmente o uso, da parte do governo, do mecanismo do decreto para mudar a lei de 1992, em vez de utilizar o procedimento padrão, com apresentação de projeto de lei, que tem tramitação mais lenta e mais discussão entre os parlamentares.>
"O governo não está se dando conta de que está quebrando a corrente de transmissão da cidadania e, no arco de uma geração, não haverá mais cidadãos italianos no mundo por descendência", afirmou o senador Francesco Giacobbe, do Partido Democrático.>
Segundo ele, a nova regra introduz critérios discriminatórios e retroativos que violam princípios constitucionais. O risco, diz, é o que a medida leve a uma "cascata de recursos e contestações, alimentando um caos burocrático sem precedentes".>
A medida impacta diretamente descendentes de italianos que moram no Brasil e na Argentina, países que receberam milhões de emigrados a partir do fim do século 19. Só no Brasil, um contingente de 1,4 milhão chegou de 1870 a 1920. Estima-se que hoje existam 30 milhões de descendentes no país, além de mais de 800 mil cidadãos italianos (expatriados ou com dupla cidadania).>
Em 2023, foram reconhecidas ao menos 61,3 mil cidadanias italianas por direito de sangue a descendentes. Com quase 42 mil, os brasileiros representaram 68,5% dos casos — os maiores beneficiados. Os casos se referem aos processos por via judicial e administrativa (prefeituras italianas), sem contabilizar os consulados.>
Ao anunciar a medida no fim de março, o vice-premiê Antonio Tajani, do partido Força Itália, de centro-direita, justificou a decisão com base na reclamação, crescente nos últimos anos, de tribunais de Justiça e prefeituras italianas, principalmente de pequenos municípios, que se dizem sobrecarregados pelo volume de pedidos, especialmente aqueles apresentados por via judicial, em que o autor não precisa morar na Itália.>
Outra razão, afirmou o ministro, é que os interessados no reconhecimento da cidadania não teriam interesse em residir no país, mas somente circular com mais facilidade pela União Europeia e entrar nos Estados Unidos sem visto. "Ser cidadão italiano é um assunto sério, não é uma brincadeira para ter no bolso o passaporte [italiano] para fazer compras em Miami", disse Tajani.>
Além do direito de sangue, pela legislação de 1992, é possível se tornar cidadão italiano por tempo de residência no país — adultos de fora da União Europeia podem fazer o pedido após dez anos morando legalmente na Itália —, e por casamento. Genitores residentes no país que tenham obtido a cidadania podem transmiti-la aos filhos menores de 18 anos. Jovens nascidos na Itália de genitores estrangeiros — e residentes sem interrupção no país — também podem se tornar italianos quando completam 18 anos.>
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