Publicado em 15 de fevereiro de 2024 às 08:03
O estoque de "Um Defeito de Cor", de Ana Maria Gonçalves, esgotou após a Portela basear seu desfile no livro, que é um marco da literatura brasileira por retratar a escravidão e dar protagonismo a uma mulher negra.>
A obra de ficção conta a história de Kehinde, uma jovem africana traficada para o Brasil, mais especificamente para Salvador. Anos mais tarde, já liberta da escravidão, ela busca seu filho no Rio de Janeiro, que fora vendido pelo próprio pai.>
Segundo Cassiano Elek Machado, diretor do Grupo Editorial Record, que publica o livro, a casa já iniciou a reimpressão dos exemplares em seu parque gráfico e conseguirá atender a todos os pedidos feitos no site.>
O samba-enredo da Portela levou as vendas do livro ao ápice. Só na terça-feira, foram vendidos dez vezes mais exemplares do que na semana passada inteira. Apesar de a editora ter acompanhado as preparações para o desfile, o salto dos números foi inesperado.>
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"Além do desfile, várias personalidades fizeram recomendações contundentes do livro em rede nacional", diz. Na Amazon, a obra aparece entre os mais vendidos do site. As pesquisas do livro no Google aumentaram 1.492% nos dias 13 e 14, logo após o desfile, em comparação aos cinco dias anteriores, de acordo com os dados do Google Trends.>
A Estante Virtual, maior plataforma de venda de livros do país e que inclui o acervo de sebos, afirmou que todos os exemplares do livro esgotaram. Depois do desfile da Portela, as vendas aumentaram 3.300%, segundo os números divulgados pelo site.>
Machado, porém, lembra que a obra já era um sucesso antes deste Carnaval. "O livro já tinha ultrapassado os 10 mil exemplares vendidos, marca que poucos livros de ficção alcançam no Brasil, e se consolidado como uma referência para a literatura nacional", diz.>
Lançado em 2006, "Um Defeito de Cor" começou a ganhar mais destaque nos últimos anos, segundo o editor, impulsionado pelos desdobramentos do Black Lives Matter.>
"Foi também o tempo das pessoas lerem, estudarem e recomendarem o livro, que além da temática racial, é uma grande peça literária", diz.>
Em entrevista à reportagem, em 2023, a autora afirmou que o processo de escrita a ajudou a se entender enquanto mulher negra, mas que a obra não deve ser rotulada apenas como de literatura negra.>
"Durante muito tempo, os rótulos de literatura negra e marginal foram usados para dizer de maneira implícita que esses livros não tinham qualidade para serem alçados à categoria de literatura. Sou uma escritora negra, mas minha obra é universal", disse.>
Kehinde, a protagonista de "Um Defeito de Cor", representa a figura histórica Luísa Mahin, que teria participado da Revolta dos Malês, em Salvador. E seu filho perdido seria Luiz Gama, famoso advogado abolicionista.>
Gonçalves explicou que reivindica para seus personagens negros o que chama de "lugar de falha". "Grande parte dos personagens negros da ficção mainstream brasileira é completamente previsível. Os personagens tortos e falhos me interessam mais. Eles têm mais a dizer do que personagens que estão sempre tentando andar na linha.">
A Viradouro, campeã do Carnaval carioca neste ano, baseou seu samba-enredo no livro "Sacerdotisas Voduns e Rainhas do Rosário", dos historiadores Aldair Rodrigues e Moacir Maia, que mostra como o candomblé foi um fenômeno no Brasil colonial.>
Machado, diretor da editora Record, espera que a iniciativa da Portela estimule a criação de mais sambas-enredos baseados em obras literárias, um feito ainda pouco frequente. Segundo ele, o desfile será lembrado como um marco cultural para o Brasil. "A Portela trabalhou uma grande obra literária. Isso é mais importante do que o resultado das vendas.">
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