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PM que agrediu mulher com socos em Guarapari é denunciado pelo MPES

PM que agrediu mulher com socos em Guarapari é denunciado pelo MPES

Segundo informações do Ministério Público do Espírito Santo, conforme a denúncia, no dia das agressões, o policial estava no local para prestar apoio a uma equipe de socorristas chamada para realizar a internação compulsória da vítima

Publicado em 7 de janeiro de 2022 às 18:26

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O policial militar que agrediu uma mulher com socos e joelhadas no dia 25 de setembro de 2021, em uma rua do bairro Lameirão, em Guarapari, foi denunciado pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), por meio da Promotoria de Justiça junto à Auditoria Militar. Um vídeo, à época, viralizou nas redes sociais. Veja:

Segundo informações do MPES, conforme a denúncia, no dia das agressões, o policial estava no local para prestar apoio a uma equipe de socorristas do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) chamada para realizar a internação compulsória da vítima, que estaria em surto psicótico e agressiva.

Também de acordo com o MP, os militares tentaram conter a mulher e, nesse momento, a vítima mordeu o braço do denunciado, que desferiu golpes no rosto dela, visando se desvencilhar. Em seguida, a mulher foi jogada ao chão para o processo de algemação e o denunciado desferiu outro golpe no rosto.

Para o Ministério Público, apesar do surto psicótico e da agressividade da vítima, houve excesso, pois o uso da força deve obedecer aos princípios da legalidade, necessidade, razoabilidade e proporcionalidade. O caso foi apurado em Inquérito Policial Militar e posteriormente foi enviado ao MP. No inquérito, a Corregedoria da PM destacou que o golpe na face da vítima quando já estava no chão em processo de algemação revela que a seleção de opções da força policial foi inadequada.

ESPECIALISTAS COMENTARAM EPISÓDIO

Após a grande repercussão sobre a abordagem da Polícia Militar no atendimento a uma ocorrência em Guarapari, no ano passado, especialistas em segurança pública e em saúde mental analisaram a conduta dos agentes.

O questionamento que fica, mesmo com a medida de afastamento dos agentes envolvidos, é: no caso de serem feitos novos pedidos de apoio, por parte da PM, às instituições de saúde, qual deve ser a abordagem ideal? Qual técnica deve ser adotada? É sempre necessária a adoção da força? Convidados por A Gazeta, especialistas analisaram a atuação dos militares com base nas imagens do vídeo amplamente compartilhado.

Para o coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo (PM-SP), José Vicente da Silva Filho, ex-secretário Nacional de Segurança Pública, mestre em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP) e ex-consultor do Banco Mundial, de fato existe autorização para que a polícia se utilize da força não apenas contra criminosos, mas também com pessoas que precisam ser contidas, até para que a segurança delas também se mantenha.

Segundo ele, o esforço de contenção para uma pessoa agitada também é desagradável ao policial e costuma gerar sensação de abuso em quem presencia. "De qualquer forma, os policiais precisam de melhor treinamento para executar imobilização e condução para levar até um local adequado. Isso é uma falha. Existem treinamentos bem feitos neste sentido, como em aviões, para lidar com 'passageiros difíceis', por exemplo, sob efeito de bebida", disse José Vicente.

Nas palavras do oficial da reserva da PM-SP, o treinamento ideal utiliza técnicas que vêm, por exemplo, das artes marciais. "Aqui em São Paulo, os PMs passam por reciclagem anual, mas é comum, em alguns lugares, que os policiais façam um treinamento para ingressar e depois não passem por revisão. É preciso treino, repetição de cada movimento. Outros artefatos também são importantes de serem incorporados, como as pistolas de efeito neuromuscular (como a taser de choque), cujo disparo dá uma carga de alta voltagem, porém com potencial de dano físico pequeno. Apesar disso, a pessoa não consegue ficar em pé", explicou.

O professor do Mestrado em Segurança Pública da UVV, Henrique Herkenhoff, concorda com José Vicente da Silva Filho. Para ele, é importante estudar esse tipo de incidente, para ver o que pode ser melhorado no treinamento e equipamentos utilizados.

"Examinando os detalhes da ocorrência, uma senhora estaria em um surto psiquiátrico e oferecendo muita resistência. Existem protocolos específicos para essa situação, diferentes de quando se lida com um suspeito, mas não é um treinamento difundido. Também não parece ter sido intenção dos policiais praticar nenhuma violência contra ela, mas é provável que não tenham usado as técnicas corretas", ressaltou Herkenhoff.

O professor também citou a importância do treinamento e uso de equipamentos adequados. "Nas ruas e tendo que lidar com as mais diversas e difíceis situações, o policial nem sempre recebeu um repertório compatível, nem sempre dispõe das ferramentas necessárias, mas não pode ir embora, abandonar a ocorrência. Ele é obrigado a improvisar e, às vezes, o improviso dá errado, a ocorrência sai do controle", ponderou.

"PRIMEIRA RECOMENDAÇÃO É O DIÁLOGO", DIZ PSIQUIATRA

A psiquiatra Letícia Mameri Trés explicou que esse tipo de atendimento exige um treinamento específico. Na avaliação da médica, a primeira recomendação no atendimento ao paciente, mesmo em caso de surto, é o diálogo. Se o agente de segurança ou de saúde não tiver sucesso, o próximo passo, então, é a imobilização.

"A impressão que eu tive é de que eles não são preparados para fazer esse tipo de abordagem. E isso é verdade, não tem a preparação, não há um treinamento para esse tipo de abordagem de paciente psiquiátrico. Não apenas a polícia, os serviços de saúde de emergência também não têm esse treinamento", comentou Mameri.

Como alternativa, ela sugere a integração entre a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) e a Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) na criação e promoção de cursos que qualifiquem, tanto os profissionais de saúde quanto os agentes de segurança.

A Associação de Cabos e Soldados e a Polícia Militar foram demandadas pela reportagem de A Gazeta para comentar sobre a denúncia feita pelo MPES, mas não responderam até a publicação desta matéria. Assim que houver retorno, este texto será atualizado.

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