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Covid-19: 'Ele morreria por qualquer um', diz irmão de vítima no ES

Covid-19: "Ele morreria por qualquer um", diz irmão de vítima no ES

O mestre de obras Célio Leite fala um pouco sobre o perfil de sargento que foi o segundo caso confirmado de morte pelo coronavírus no Estado

Publicado em 3 de abril de 2020 às 21:35

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Coronavírus - Covid19
O novo coronavírus é a causa da morte de um sargento da Marinha, que residia em Vila Velha. (Visuals3D/Pixabay)

O mestre de obras Célio Leite, 35 anos, mal teve tempo de se recuperar da perda da mulher, em novembro passado, e na quarta-feira (01) recebeu a notícia da morte do irmão, um sargento da Marinha de 40 anos, uma das vítimas do novo coronavírus (Covid-19) no Espírito Santo. Ele ressalta o perfil solidário do irmão, e faz críticas ao fato de a família ainda não estar sendo monitorada. 

"Ele servia à Pátria e era capaz de morrer por qualquer um", destaca Célio. O nome do sargento não será divulgado para preservar a esposa e os dois filhos, além dos pais que são idosos. Mas o mestre de obras faz questão de dizer: "Ninguém teria nada para falar contra ele, era uma pessoa carinhosa, que se preocupava com todos."

Ao falar da família, Célio ainda se refere ao sargente no presente e conta com ele ao mencionar o número de irmãos. "É porque ele vai ficar para sempre na nossa memória", afirma. 

Além de lembranças, Célio diz que a morte do irmão também está marcada por indignação entre os membros da família. Ele conta que a notificação sobre a causa do óbito só foi feita nesta sexta-feira (3), depois de o caso ter sido informado pelo governo do Estado, primeiramente, para o público por meio dos veículos de comunicação. Além disso, segundo ele, mesmo após a confirmação do que levou à morte do sargento, até as 17 horas não havia sido procurado para ser monitorado junto aos parentes.

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Não sou médico. Sei de algumas coisas que devo fazer aos ver os jornais, mas precisamos de orientação, de suporte. Vamos fazer exames ou não? Vão esperar outro morrer para fazer alguma coisa?

Célio Leite
Irmão da vitima
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VIGILÂNCIA

A comunicação às famílias cabe à Vigilância Epidemiológica dos municípios. Em Vila Velha, a coordenadora do setor, Giovana Ramalho, relata que também tomou conhecimento do caso do sargento pela imprensa no final da tarde desta quinta-feira (2), e somente conseguiu confirmar que o teste dele havia dado positivo para a Covid-19 na manhã de sexta, quando fez a notificação oficial aos familiares. 

Para ela, houve falhas de procedimento tanto de um hospital particular de Vila Velha, onde foi feita a coleta de material biológico para analisar se o quadro era de infecção por coronavírus, quanto da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) que não registrou a informação assim que saiu o resultado do teste. 

"Se não somos comunicados, não temos como atuar. Eu preciso saber que tem um caso positivo para poder procurar a família", ressalta Giovana Ramalho. 

A coordenadora da Vigilância conta que, assim que surgiram os primeiros casos confirmados de Covid-19 no município, costumava ser surpreendida com a informação na imprensa. Depois, em um alinhamento com a Sesa, a notificação passou a chegar primeiro a seu setor. Até agora, no episódio envolvendo o sargento da Marinha. Ela diz que o grande problema é que, quando não é notificada, a equipe de vigilância não consegue fazer a abordagem com o paciente e os familiares da maneira mais adequada. 

NOTIFICAÇÃO

Giovana Ramalho diz que a vigilância não tinha nem mesmo a ficha do sargento porque o hospital não fez a notificação compulsória, assim que suspeitou da doença e pediu o exame. Esse é um procedimento obrigatório a qualquer unidade de saúde que identifica algum caso suspeito para Covid-19. 

"Soube do caso pela rádio, quando voltava de uma reunião para o trabalho no final da tarde. Pedi a minha equipe para verificar no sistema do Laboratório Central (Lacen) e ainda não constava o resultado do exame", afirma.

A coordenadora da Vigilância Epidemiológica diz que foi feito contato com o hospital, ainda na noite de quinta, mas a informação repassada, segundo ela, foi de que não era possível encaminhar nenhum dado naquele momento. Já nesta sexta, Giovana voltou a se comunicar com o hospital e, então, cobrou a notificação. Somente então pôde ligar para a família. 

Giovana ressalta que o monitoramento da família já está em curso. "Dos números de telefones que chegaram ao nosso conhecimento, contatamos a  sogra do paciente que nos respondeu o inquérito sobre os contatos residenciais  dele, e também conversamos com a cunhada."

PENALIDADES

A Sesa informa que o resultado positivo do sargento entrou no sistema do Lacen na noite de quinta-feira, e que só não foi liberado mais cedo pelo erro da falta de comunicação do hospital que coletou o exame. Inclusive, segundo o secretário Nésio Fernandes, o estabelecimento será notificado por descumprir a lei, e pode ser penalizado. 

"O óbito ocorreu  na rede privada. A amostra do paciente foi coletada e transportada por um laboratório privado e chegou ao Lacen no final do dia 1º de abril e, às 18h40min do dia 2, o resultado foi liberado no sistema. A notificação do caso é obrigatória a todas as entidades públicas e privadas", pontua o secretário.

Nésio Fernandes acrescenta: "O monitoramento dos casos confirmados compete à Vigilância em Saúde Municipal. No entanto, o estabelecimento privado omitiu a notificação do caso à autoridade. A Secretaria da Saúde ressalta que a omissão de comunicação de doença de notificação compulsória é crime passível de pena de detenção, de seis meses a dois anos, e multa conforme prevê o artigo 269 do Código Penal."

A responsabilidade de informar a morte e suas implicações aos familiares, ressalta Nésio Fernandes, é do hospital privado que atendeu ao paciente. "Para que as autoridades sanitárias municipais e estaduais realizem o bloqueio de transmissão e deem a resposta rápida, as notificações devem ser realizadas em tempo oportuno", argumenta.

Por isso, segundo o secretário, o Estado implantou nesta semana um sistema de notificação via web para registro dos casos suspeitos de Covid-19, permitindo acesso em tempo real pelas vigilâncias municipais, regionais e estaduais.

HOSPITAIS

O sargento da Marinha, segundo informações da Vigilância Epidemiológica de Vila Velha, mudou-se havia pouco tempo para o município. Os primeiros sintomas apareceram em 23 de março, quando ainda morava em São Paulo. Chegou ao município no dia 26, e procurou o hospital particular no dia 30. Recebeu atendimento e foi liberado.

No dia seguinte, voltou à unidade, segundo a coordenadora Giovana Ramalho, já com o quadro agravado com sintomas respiratórios. Neste dia, o laboratório do hospital coletou o material ao desconfiar que pudesse se tratar de Covid-19, porém não fez a notificação compulsória.

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Depois, o sargento foi transferido para um hospital na Serra, também particular, onde foi registrada a morte. Num primeiro momento, o secretário da Saúde informou que a unidade poderia ser notificada pela falta de comunicação ao paciente. Contudo, como o exame foi coletado no hospital de Vila Velha, Nésio Fernandes esclareceu que a responsabilidade caberia à unidade onde o sargento deu a primeira entrada, e vai notificá-lo. 

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