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Por que o Porto de Vitória ficou de fora de ação de combate ao tráfico

Por que o Porto de Vitória ficou de fora de ação de combate ao tráfico

Marinha e Aeronáutica terão poder de polícia em portos e aeroportos do Rio de Janeiro e de São Paulo, mas o ES não será contemplado, apesar do aumento de apreensões no Estado

Publicado em 6 de novembro de 2023 às 20:12

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Operação encontra 1,5 tonelada de cocaína em navio no Porto de Vitória
Operação encontra 1,5 tonelada de cocaína em navio no Porto de Vitória. (Polícia Federal)

Apesar de ser um Estado aberto ao comércio exterior e de ter atraído muitas cargas criminosas nos últimos meses, o Porto de Vitória não foi incluído na operação de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) decretada pelo governo federal para conter o tráfico de drogas e armamento em alguns locais estratégicos.

Conforme o decreto federal publicado na última semana, até maio de 2024, Marinha e Aeronáutica terão poder de polícia nos portos de Santos (SP), do Rio de Janeiro (RJ) e de Itaguaí (RJ); bem como nos aeroportos internacionais de Guarulhos (SP) e Tom Jobim (RJ).

A operação começou nesta segunda-feira (6). Na véspera, uma denúncia de que um navio estaria transportando drogas levou a Polícia Federal e a Receita Federal a realizarem uma operação conjunta no Porto de Vitória, onde está atracada a embarcação Grande Amburgo, de bandeira italiana, mas que veio de Hamburgo, na Alemanha. Mais de 1,5 tonelada de cocaína foi apreendida.

O volume é considerado o maior já interceptado nos portos do Estado, mas as apreensões têm se repetido nos últimos meses, com drogas escondidas em cascos de navio e outros compartimentos.

Por que o Porto de Vitória ficou de fora de ação de combate ao tráfico

O governo federal não esclareceu se o Espírito Santo chegou a ser considerado para inclusão na GLO, que mobilizará mais de 3,7 mil agentes no período, entretanto, no dia 1º, quando foi anunciada a medida, o ministro da Justiça e Segurança Pública Flávio Dino declarou que um dos critérios para escolha dos locais abrangidos foi logístico.

“Nós temos pontos de abastecimento, de trânsito, de tráfico de drogas e armas em torno do Rio de Janeiro — e no Rio de Janeiro —, e esse foi o critério que escolhemos em conjunto."

Em paralelo às ações no Rio e em São Paulo, o Exército atuará nas fronteiras do país, no Paraná, no Mato Grosso do Sul e no Mato Grosso, incrementando trabalhos já desenvolvidos. A operação contará ainda com reforço da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Henrique Herkenhoff, professor do mestrado em segurança pública da Universidade Vila Velha (UVV), avalia que, apesar do crescimento de apreensões no Porto de Vitória, a situação no Estado ainda é bastante diferente da crise de segurança observada, por exemplo, no Rio de Janeiro. Além disso, a própria logística de cargas diferencia os cenários.

“O Espírito Santo é um ponto secundário no tráfico internacional de drogas. Teoricamente, a GLO está mais preocupada em evitar o ingresso de armamento e de maconha. A cocaína, até onde sei, entra mais pela fronteira seca. O Brasil exporta alguma coisa via aérea, mas o Espírito Santo não é conhecido como uma rota de importação nem de maconha nem de armas, porque nosso porto é muito mais exportador do que importador.”

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O Espírito Santo não está passando pela mesma crise do Rio de Janeiro. O governo federal precisava dar uma resposta ao que está acontecendo no Rio e criou essa GLO, mas não tem nenhuma importância estratégica. O Rio de Janeiro tem um problema crônico e qualquer coisa que se faça tem que ser pensando no longo prazo

Henrique Herkenhoff
Professor do mestrado em segurança pública da Universidade Vila Velha (UVV)
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E reforçou: “Não adianta fazer uma operação aqui, outra ali, uma GLO de alguns meses. Mesmo que haja algum resultado, alguma apreensão, do ponto de vista estratégico, este tipo de medida não resolve no longo prazo.”

A professora da Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB) Alina Mourato Eleoterio, doutoranda da Ufes e pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas sobre o Álcool e outras Drogas: Interconexões (CEPADi), levanta ainda outro ponto.

Uma vez que os recursos humanos e financeiros são escassos, ressalta Alina Eleoterio, é normal que se estabeleçam prioridades, que seriam justamente os portos e aeroportos com enorme fluxo de pessoas e mercadorias, e, portanto, com maior vulnerabilidade para o ingresso de produtos ilícitos.

“Além disso, (Rio de Janeiro e São Paulo) são Estados com histórico de segurança pública mais complexo e delicado. Há de se considerar, ainda, que o aumento das apreensões de drogas no Espírito Santo pode passar a impressão de maior efetividade da ação policial do que propriamente de um aumento da criminalidade.”

Ela frisa, porém, que uma operação de Garantia da Lei e da Ordem é algo excepcional, e não é considerada uma solução a longo prazo.

“Como universidade, acreditamos que, mais do que o incremento de medidas repressivas, a situação das drogas perpassa pela implementação, a médio e longo prazos, de políticas públicas que abordem a temática prioritariamente sob uma perspectiva de saúde pública.”

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A política de guerra às drogas demonstra ter falhado em todo o mundo, consumindo recursos que teriam sido muito mais bem empregados, por exemplo, em campanhas de conscientização, em política de redução de danos, em práticas restaurativas, em políticas socioeconômicas e educacionais.

Alina Mourato Eleoterio
Professora universitária e pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas sobre o Álcool e outras Drogas: Interconexões (CEPADi)
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Alina destaca que o que se tem observado é a preponderância quase absoluta da repressão, em detrimento dos outros eixos do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, que são a prevenção, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes.

Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) foi procurada pela reportagem para falar sobre o assunto, mas não se manifestou até a publicação da matéria. 

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