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Morro do Macaco: histórias de quem viu e sobreviveu à tragédia

Morro do Macaco: histórias de quem viu e sobreviveu à tragédia

Mesmo após quatro décadas, há casos que não saem da memória daqueles que moravam ou trabalharam no local; leia os relatos

João Barbosa

Repórter / jbarbosa@redegazeta.com.br

Publicado em 20 de janeiro de 2025 às 17:51

Eva Maria Costa e Cyro, sobreviventes
Eva Maria Costa e o marido Cyro eram moradores do Morro do Macaco na época da tragédia de 1985 Crédito: Fernando Madeira

Por trás da tragédia no Morro do Macaco que destruiu tantas famílias na comunidade de Tabuazeiro, em Vitória, há também histórias que são consideradas milagrosas. Uma das cenas mais surpreendentes para quem esteve no local no dia do deslizamento, em 15 de janeiro de 1985, foi a de uma criança que sobreviveu dentro de um guarda-roupas.

Esse episódio está na memória do jornalista Sérgio Marqueze que, na época, era repórter da TV Gazeta. Durante a cobertura do caso, já pela manhã, ele se deparou com a casa de uma família destruída. Nada de material sobrou, porém, de lá saiu vivo, e sem ferimentos, um menino de apenas dois anos.

“Foi uma das histórias que mais me impressionaram. A pedra, com peso estimado em 150 toneladas, passou por cima de barraco, destruiu o barraco. E o menino só não morreu porque o guarda-roupas caiu com a porta aberta, deixando ele dentro, protegido”, conta.

Para os aposentados Cyro e Eva Maria Costa, a situação da família deles poderia até ser tratada como um milagre diante do cenário de devastação. No momento em que a pedra rolou no morro e um dos pedaços destruiu a casa em que o casal estava com sete dos oito filhos. A pedra parou cerca de 30 centímetros antes de atingir a família.

Apesar dos ferimentos decorrentes do desabamento do imóvel, os nove sobreviveram.

“Eu passei muita dificuldade porque não podia andar [fratura no quadril]. Meu marido precisava me carregar para todo canto. Mas dou graças a Deus por ter nos livrado daquela tragédia”, afirma Eva.

“Um mês antes, eu já sabia o que ia acontecer. Deus me deu uma visão, mas disse: ‘você não vai perder nenhum dos seus’. Aí, na hora exata que aconteceu, eu me lembrei daquela visão. Quando encontrei meu primeiro filho vivo, sabia que todos iriam estar também”, completa Cyro, convicto da graça divina.

Empatia e solidariedade

Ainda que seus imóveis não tenham sido diretamente atingidos no deslizamento, muitos moradores lembram com riqueza de detalhes daquela madrugada. Entre muitos, a dor da saudade ainda persiste e se mistura com o sentimento de gratidão aos que ajudaram no resgate.

"Essa tragédia eu jamais vou esquecer. O mais marcante para mim foi saber que estávamos perdendo amigos, fora os que ficaram enterrados por baixo da pedra. Fomos pegos de surpresa", lembra José Gomes da Silva, antigo morador do bairro e ex-presidente da associação de moradores.

Enquanto muitos pediam por socorro, esforços não foram medidos para ajudar quem estava no meio dos escombros. 

"Naquela noite, todo mundo queria ajudar mesmo sem saber o que iria encontrar"

José Eduardo Santana

Morador do Morro do Macaco e um dos ajudantes no resgate de vítimas

"A maioria das pessoas [atingidas] eram superconhecidas da gente. Os pais se conheciam mais, mas os filhos eram estudantes da mesma escola, jogavam futebol no mesmo campo, tínhamos a mesma rotina. Naquela madrugada, com aquele breu e aquela gritaria, cachorro latindo e as pessoas correndo, todo mundo começou a subir em direção ao morro, sem saber com clareza o que tinha acontecido", lembra José Eduardo.

Os que não foram impactados de forma direta pela tragédia formaram uma rede de solidariedade fundamental na reestruturação na vida dos vizinhos. Quem não precisou ser hospitalizado foi para a Escola Suzete Cuendet, onde doações de roupas e mantimentos garantiram o mínimo de dignidade para aqueles que haviam perdido suas casas e familiares.

O coronel Carlos Eduardo Marques Magnago, que trabalhou com as equipes de socorro no dia da tragédia, conta que não se esquece da característica mais marcante dos moradores do Morro do Macado naquela situação: a solidariedade.

"A gente via a garra daquela comunidade que, mesmo naquela tragédia, com a perda de familiares, estava lá ajudando a quem precisava. Você via mulheres, mães, tias, pais e, mesmo sabendo que talvez não encontrasse seus filhos naquela confusão toda, acalentavam quem estava do lado", finaliza. 

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