Publicado em 11 de março de 2020 às 22:09
Vinte e um dias depois de a Assembleia Legislativa de Minas Gerais ter aprovado o reajuste de 41,7% para servidores da segurança pública, o governador do Estado, Romeu Zema (Novo), decidiu pela sanção parcial do projeto da sua própria gestão e derrubou o secretário de Governo, Bilac Pinto (DEM). >
No fim da tarde desta quarta-feira (11), Zema anunciou por meio de nota que optou por sancionar parcialmente o projeto de lei, apenas com reajuste para a segurança de 13% previsto para 2020. Assim, o impacto financeiro cai de R$ 9 bilhões para R$ 1,1 bilhão.>
Os demais pontos do texto e a emenda apresentada e aprovada pela Assembleia, que estendeu o reajuste (com percentual menor, de 28,8%) a todos os demais servidores, foram vetados pelo governador.>
O governo diz que a decisão levou em consideração análise profunda do cenário financeiro do estado e a situação econômica do país, alegando que ocorreram depois que o projeto foi enviado ao Legislativo.>
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A redução da previsão do PIB (Produto Interno Bruto) deste ano - o governo federal reduziu a projeção de 2,4% para 2,1% -, segue a nota, deve derrubar a queda de arrecadação com ICMS no estado em R$ 548 milhões.>
A gestão Zema diz ainda que o Ministério da Economia alertou que, caso o reajuste de 41,7% fosse concedido, Minas Gerais não poderia aderir ao regime de recuperação fiscal. O acordo com a União é tratado pelo governador como única saída pela crise desde o início do governo.>
"Sem as medidas propostas no regime, o estado estaria em penúria financeira, comprometendo não somente o pagamento de salários a todos os servidores como a prestação de serviços à sociedade", diz o texto.>
A emenda da Assembleia foi vetada pelo impacto financeiro que não poderia ser comportado - estimado em pelo menos R$ 20 bilhões pelo governo - e pelo vício de origem, já que o Legislativo não pode legislar sobre o orçamento.>
O reajuste proposto pelo governo foi criticado pelo partido Novo, que pediu que o governador vetasse tanto o PL do Executivo, quando a emenda que estendia recomposição para outras categorias.>
A legenda de Zema ainda ingressou com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) para que as contas da Lei de Responsabilidade Fiscal de tribunais de Contas de todo o país passem a considerar servidores inativos, o que apertaria o teto.>
O Tesouro Nacional também se manifestou, dizendo que, caso o reajuste fosse concedido, a adesão do estado ao regime de recuperação fiscal poderia ficar comprometida.>
Um dia antes da decisão, na terça-feira (10), o então secretário de governo, Bilac Pinto (DEM), disse em audiência pública convocada por deputados ligados ao setor da segurança que a posição do governo não tinha mudado perante o acordo, até aquele momento. Mas que o governador iria avaliar alguns fatores até o dia 17, prazo final para sancionar ou vetar.>
Ele criticou a cobertura dada pela imprensa à proposta; disse que sem a emenda apresentada pela Assembleia, o PL já teria sido sancionado, e falou da pressão de Brasília. Segundo Bilac, a proposta do governo mineiro gerou "apreensão" no Ministério da Economia.>
"O governo federal não entra na gerência daquilo que o governador de Minas e outros estados farão. Mas, se podemos dar aumento, temos condições de pagar a dívida que o estado deve. É o raciocínio deles", afirmou ele na audiência.>
No dia 4 de março, Zema publicou fotos de um encontro com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).>
A preocupação da gestão Zema, reiterada na nota anunciando o recuo do governador, é que a concessão dos reajustes levasse a AGU (Advocacia Geral da União), representando o Tesouro Nacional, a pedir no STF (Supremo Tribunal Federal) a derrubada das liminares que suspendem o pagamento da dívida de Minas com a União.>
Segundo o Ministério da Economia, a dívida total de Minas Gerais com a União hoje é de R$ 99,6 bilhões --desde a suspensão dos pagamentos o Estado acumulou R$ 14,3 bilhões. Caso a liminar caia, a União pode parar repasses e sequestrar as contas públicas para garantir pagamento.>
O governo de Minas diz que a revogação de uma das liminares acarretaria na retomada de pagamento mensal de R$ 420 milhões; outras liminares, das parcelas de contratos, poderiam cobrar outros R$ 290 milhões mensais, caso revogadas.>
Zema disse em entrevistas e em redes sociais que o impacto financeiro do PL já havia sido calculado e estaria dentro dos limites da LRF. O governo dizia que o impacto de R$ 9 bilhões, com pagamento escalonado em três anos, sairia do fluxo do caixa, que teve melhorias com ajustes.>
Na terça, Bilac afirmou que a fonte dos recursos seria o projeto de recuperação fiscal, a venda da Codemig (Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais) e o projeto de reforma da Previdência, previsto para chegar na Assembleia nas próximas semanas.>
A privatização da estatal, apresentada pelo governo como um dos três projetos iniciais para aderir ao acordo de RRF com a União, em outubro, ainda não começou a tramitar na Casa.>
Também em outubro, o governo enviou o projeto de antecipação dos recebíveis do nióbio, com o qual estimava levantar entre R$ 4 milhões e R$ 6 milhões. Aprovada pela Assembleia, a operação ainda não foi efetuada e pode sofrer impacto pela oscilação do dólar.>
O governo está em período de sigilo imposto pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e não pôde comentar.>
O presidente da Assembleia mineira, Agostinho Patrus (PV), se manifestou, ainda na terça, em suas redes dizendo que era "errado e irresponsável" culpar a imprensa e a Casa pelos erros de articulação do governo.>
Queda de secretário O nome de Bilac Pinto está no acordo assinado pelo governo, com representantes dos servidores de segurança pública. Os comandantes das forças de segurança também subscreveram a ata de 22 de novembro de 2019.>
Outro secretário que participou das negociações, Otto Levy, do Planejamento, teve o afastamento publicado na última sexta (6), para uma viagem aos Estados Unidos.>
Na nota em que anuncia sua saída, Bilac agradece a Zema e ao seu vice, Paulo Brant, pela oportunidade, e a deputados e senadores pelos trabalhos.>
"Mesmo entendendo as razões do veto parcial do governador à sua proposta de recomposição salarial das forças de segurança que ajudei a negociar, isto me tirou as condições de, diante do atual cenário político, continuar a conduzir as negociações com o parlamento estadual", afirma.>
Com experiência de mandatos como deputado estadual e federal e secretário de governos tucanos em Minas Gerais, Bilac foi nomeado em agosto, depois da queda de Custódio de Mattos, que tensionou a base do governo.>
Após a audiência da terça, o deputado Sargento Rodrigues (PTB), que participou da costura de um ano do acordo com o setor da segurança, disse que, caso o governador vetasse o próprio PL, a reação no estado poderia ser incontrolável.>
"[Se não sancionar] Ele pode entregar o cargo, porque ele não aprova nem moção de aplauso mais na Assembleia. A credibilidade do governo seria zero".>
O líder do bloco governista na Assembleia, deputado Gustavo Valadares (PSDB), também se manifestou por meio de nota a respeito das decisões tomadas pelo governo, se dizendo perplexo. >
Os deputados do bloco, diz ele, não foram convidados para o diálogo antes que a decisão sobre a sanção parcial fosse tomada, nem sobre a saída de Bilac, repetindo o que ocorreu com Custódio.>
"Projeto, aliás, de autoria do próprio governador e que contou, na sua aprovação, com o voto consciente e de confiança de 66 dos 77 deputados, respeitando o acordo feito pelo governo", diz ele. >
Queremos deixar registrado, também, que em nenhum momento os deputados do bloco que dão sustentação ao governo Zema foram ouvidos ou informados pelo governador sobre a saída de Bilac Pinto. O mesmo cenário ocorreu com o secretário de Governo à época, Custódio Mattos. A posição dos deputados junto ao governo será reavaliada na próxima semana.>
"O bloco que, até o momento, dá sustentação ao governo Zema na Assembleia de Minas Gerais tem sido --apesar de todos os reveses praticados pelo próprio governo-- leal, dedicado, responsável e aguerrido. Prova disso é a aprovação de 100% dos projetos de autoria do Executivo, mesmo com votos contrários de alguns integrantes do partido Novo", segue o texto de Valadares.>
O vice de Zema, Paulo Brant, anunciou desfiliação do Novo nesta quarta.>
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