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Decisão sobre presidente da Petrobras foi de última hora

Decisão sobre presidente da Petrobras foi de última hora

Bolsonaro optou por solução caseira por medo de novos questionamentos, após indicação malsucedida de Adriano Pires

Publicado em 8 de abril de 2022 às 10:27

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MARIANNA HOLANDA, JULIA CHAIB E IDIANA TOMAZELLI

A indicação de José Mauro Ferreira Coelho para o comando da Petrobras foi definida pelo governo de última hora, em uma decisão cercada de sigilo e sob a pressão de não deixar qualquer margem para novos questionamentos. O fantasma da indicação malsucedida de Adriano Pires, empresário com laços na indústria de gás e que acabou desistindo pelo risco de conflitos de interesse, levou o governo a recorrer a uma solução caseira como estratégia.

José Mauro Coelho participa do programa Brasil em Pauta na TV Brasil.
José Mauro Coelho participa do programa Brasil em Pauta na TV Brasil. (Valter Campanato/Agência Brasil)

Segundo relatos colhidos pela reportagem, o martelo só foi batido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) na tarde de quarta-feira (6), horas antes de a escolha ser oficialmente anunciada pelo Ministério de Minas e Energia. Após diversas especulações sobre possíveis nomes, as indicações efetivas eram conhecidas por um círculo restrito: apenas o ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia) e Ciro Nogueira (Casa Civil), além do próprio presidente.

Nem mesmo auxiliares palacianos ou secretários do alto escalão do MME participaram das negociações que levaram à escolha de Ferreira Coelho.

O governo esperou o fechamento do mercado para só então divulgar os novos nomes no comando da companhia. Além de Coelho, houve a indicação de Márcio Weber para a presidência do conselho de administração. Ele já integra o colegiado como um de seus membros desde o ano passado.

Nos últimos dias, a desistência de Pires e a indefinição em torno dos novos nomes para a Petrobras penalizaram as ações da companhia, que tiveram três pregões de queda. O anúncio do nome de Coelho reverteu o recuo, com os papéis da estatal liderando a alta da Bolsa nesta quinta.

Na tentativa de pôr fim ao desgaste que cercava a troca no comando da maior empresa de óleo e gás da América Latina, Bolsonaro queria uma escolha rápida, mas ao mesmo tempo certeira, sem espaço para novo revés. Também pesava o prazo exíguo, uma vez que a assembleia de acionistas que aprovará os nomes está marcada para 13 de abril.

O governo optou por uma solução caseira depois de esbarrar em dificuldades para encontrar alguém do mercado, com experiência no setor de óleo e gás, disposto a assumir a função a menos de nove meses do fim do atual mandato de Bolsonaro. Assim, ao final, apenas técnicos eram cotados.

Auxiliar do ministro Paulo Guedes (Economia), o secretário especial Caio Paes de Andrade foi um dos nomes considerados nos últimos dias, à medida que outros iam dizendo não à proposta. O nome do secretário foi indicado por Guedes, mas o ministro evitou insistir em sua escolha. Ele acabou preterido, segundo relatos, por resistência do MME e de outros atores da ala política do governo: Paes de Andrade não tem experiência no setor, ao contrário de Coelho.

O nome da Economia também havia recebido um veto de peso, o do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), como mostrou o jornal Folha de S.Paulo. O deputado ainda criticou publicamente a possibilidade de se escolher um nome sem experiência na área para comandar a empresa.

A indicação de Coelho na quarta-feira foi precedida de outras reuniões em clima tenso. Aliados do governo ficaram incomodados com a desistência de Pires e chegaram a chamar de amadorismo a escolha de um nome que não passaria pelas regras de compliance da companhia.

Na terça-feira (5), Albuquerque esteve com o presidente Jair Bolsonaro no Planalto para discutir alternativas. Segundo relatos de fontes do governo, as opções dadas pelo ministro desagradaram ao chefe do Executivo, que já vinha bastante irritado com o impasse, e o clima azedou. Nesse contexto, foi cogitada a possibilidade de eventualmente adiar a eleição do presidente da companhia, retirando o assunto da pauta da assembleia de acionistas marcada para 13 de abril. Essa opção acabou sendo depois descartada.

Antes de ser indicado ao comando a Petrobras, Coelho atuava como presidente do Conselho de Administração da estatal PPSA (Pré-Sal Petróleo S.A.) e estava cumprindo quarentena, após ter pedido demissão em outubro do ano passado, do cargo de secretário de Petróleo, Gás e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia. Até ser oficializado no posto, o novo indicado tem evitado falar publicamente. "Essa é a primeira etapa, a indicação. Temos ainda um caminho até a efetivação do cargo", disse Coelho à reportagem, por mensagem.

ESCOLHA DE COELHO AGRADA PARLAMENTAR E MERCADO

A escolha para a presidência da Petrobras agradou parlamentares. O deputado Christino Áureo (PP-RJ), coordenador da Freper (Frente Parlamentar para o Desenvolvimento Sustentável do Petróleo e Energias Renováveis), disse conhecer Coelho da época em que ele era secretário no MME e tinha um assento de conselheiro na frente parlamentar.

"É um excelente quadro e vai agregar muito neste momento", disse Áureo. Segundo ele, Coelho tem "boa compreensão do ambiente e do momento" para perceber os "pontos de dificuldade" da Petrobras. O deputado defende maior transparência na política de preços da companhia, com eventuais ajustes. "É preciso ter conhecimento para discutir a equação [da política de preços]. Acho que ele terá legitimidade para isso", disse Áureo, ressaltando que não tem como antecipar qual será a direção tomada pelo novo presidente da companhia.

No mercado, as primeiras reações à indicação de Coelho foram de confiança na continuidade da estratégia e das políticas comerciais da companhia, entre elas a que define o preço dos combustíveis.

A indicação de Coelho foi a segunda desde que Bolsonaro decidiu demitir o general Joaquim Silva e Luna, na semana passada. O governo chegou a anunciar o empresário Adriano Pires, que desistiu do convite, após suspeitas de conflito de interesses. Bolsonaro vinha criticando publicamente a gestão do general, após o mega-ajuste no preço dos combustíveis promovido pela companhia. Em diferentes momentos, o presidente criticou a política de preços da Petrobras. O ministro da Casa Civil, contudo, negou que o governo tenha intenção de interferir na forma como a estatal precifica os combustíveis.

À reportagem, Nogueira afirmou que o governo espera da nova gestão da estatal mais transparência à sociedade sobre a forma como é composto o preço dos combustíveis. "É uma situação demagógica dizer que vai tornar o preço dos combustíveis em real. O arroz é em dólar, o feijão em dólar, o álcool é em dólar", disse. "A Petrobras vai continuar totalmente independente", completou.

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