Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Barbie" é um ótimo filme e um produto pop brilhante

Com Margot Robbie vivendo a boneca mais famosa do mundo, "Barbie" aposta em um visual colorido e em uma narrativa cheia de leveza e ironia

Vitória
Publicado em 20/07/2023 às 04h53
Filme
Filme "Barbie", estrelado por Margot Robbie. Crédito: Warner Bros./Divulgação

“Barbie”, como produto, é genial. A ideia de um filme live action da boneca é antiga, mas levar Barbie às telas nunca foi uma missão fácil. Com o tempo, afinal, ela se tornou uma boneca ultrapassada, um padrão inalcançável de beleza que resultou em diversas mulheres com problemas de autoestima e com a própria imagem. Talvez por isso, os direitos de um filme tenham passado por diferentes estúdios (Universal e Sony), roteiristas (Diablo Cody, Jenny Bicks, Amy Schumer) e até por diferentes Barbies (Amy Schumer, Anne Hathway, Gal Gadot) antes de chegar às mãos da Warner e, principalmente, de Greta Gerwig.

Atriz, roteirista e diretora queridinha no cinema cult pop, Gerwig levou ao projeto muito mais do seu talento: ela levou a credibilidade de uma cineasta independente e autoral a um projeto que poderia genérico. A Warner soube trabalhar a marca e os nomes de peso que tinha em mãos (Margot Robbie e Ryan Gosling) com “vazamentos” e anúncios sempre estratégicos, como o trailer remetendo a “2001 – Uma Odisseia no Espaço”. Como assim Barbie e Stanley Kubrick podem coexistir em um mesmo filme? Ainda, você acha mesmo que estrear o filme na mesma data do aguardado “Oppenheimer”, de Christopher Nolan, ex-queridinho da Warner, foi uma coincidência? Nada (ou pouco) adiantaria tudo isso se “Barbie” fosse ruim, o que não chega nem perto de ser o caso.

No filme, Barbies e Kens (e outros bonecos) vivem em um mundo paralelo, a Barbieland, um universo que funciona mais ou menos como as brincadeiras reais com eles. Não há líquido na xícara ou água no chuveiro, a praia é de mentira, as casas dos sonhos não têm escadas (como as primeiras vendidas não tinham) e algumas Barbies têm que simplesmente voar para fora delas (como as crianças tinham que fazer). Tudo isso nos mais variados tons de rosa e em um clima de ingenuidade e pureza que Gerwig usa a seu favor, com sarcasmo, para imprimir ao filme a ironia que marca seus trabalhos.

Um dia, ao ter uma espécie de crise existencial, a Barbie (Margot Robbie) procura a Barbie Estranha (Kate McKinnon), uma boneca sábia, e descobre ter que ir ao mundo real para encontrar a pessoa que brinca com ela e entender o que está acontecendo. Sem ser convidado, Ken (Ryan Gosling) a acompanha na aventura, pois pegaria muito mal diante dos outros Kens se ele a deixasse sozinha.

Filme
Filme "Barbie", estrelado por Margot Robbie. Crédito: Warner Bros./Divulgação

É na construção de universo que “Barbie” se destaca. Os corroteiristas Greta Gerwig e Noah Baumbach (casados e companheiros de projetos) têm plena ciência de todas as críticas existentes em relação à boneca da Mattel e se esforçam para fazer disso um argumento. O filme reforça o tempo todo que a mulher pode ser o que ela quiser, dando voz à Barbies Presidente, membras da Suprema Corte, vencedoras de Nobel, jornalistas, advogadas, médicas, em versões loiras, morenas, pretas, orientais, cis e transexuais, todas com seus Kens a tira colo. O elenco de apoio é incrível, com nomes como Simu Liu, Issa Rae, Hari Nef, Michael Cera, Emma Mackey e Ncuti Gatwa, além de Helen Mirren, que narra tudo, e algumas surpresas.

A Barbieland é comandada por mulheres e têm os homens como figurantes em busca de atenção. Já o mundo real do filme tem homens em lugares de poder e com discursos antiquados readequados para um novo mundo. É nessa dualidade que o filme ganha força ao apresentar à Barbie, um ideal impossível, o mundo real e o patriarcado. Os papeis de America Ferrera e Ariana Greenblatt são essenciais para fazer o link entre os dois mundos, pois sofrem com a realidade, já procuraram escape na fantasia e percebem ser possível unir esses mundos.

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Filme "Barbie", estrelado por Margot Robbie. Crédito: Warner Bros./Divulgação

“Barbie” é um filme de amadurecimento, um texto sobre deixar a ingenuidade da infância para trás ao enxergar como o mundo pode ser cruel. É muito interessante a maneira escolhida pelo filme para mostrar como essas descobertas são diferentes para homens e mulheres – o desespero no olhar de Margot Robbie, quase sempre mantendo o sorriso no rosto, é antagonizado pelo encanto de Ryan Gosling ao descobrir que “o mundo pertence aos homens”.

As excelentes atuações de Margot Robbie e Ryan Gosling, várias boas piadas cheias de autorreferências às questões que a boneca carrega e o desejo de grandiosidade fazem com que o roteiro seja relevado. Na verdade, há pouco roteiro, pouca história; há uma forte exploração do imaginário da Barbie, e isso bastaria para um filme menos ambicioso, mas o roteiro, em si, é um apanhado de ideias engraçadas cheias de ironia.

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Filme "Barbie", estrelado por Margot Robbie. Crédito: Warner Bros./Divulgação

Ao fim, Greta Gerwig inverte o jogo ao transformar sua Barbie em um ícone feminista, um produto do capitalismo, mas, ainda assim, revolucionário (no filme). O resultado é uma obra leve, colorida e divertida, quase um “Liga da Justiça de Zack Snyder” do mundo invertido, tanto em conceitos quanto em estética.

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