Publicado em 12 de dezembro de 2020 às 16:52
O presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Humberto Martins, recuou de posição que havia tomado anteriormente e dará andamento a um recurso em que o deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato à presidência da Câmara, tenta liberar bens que foram bloqueados em ação da Lava Jato.>
Há quatro anos, Lira e seu pai, Benedito de Lira (PP), ex-senador e prefeito eleito de Barra de São Miguel (AL), tiveram bens bloqueados no valor de até R$ 10,4 milhões.>
Ao analisar o pedido, em setembro, Martins entendeu que não caberia ao tribunal revisar a decisão proferida pela Justiça Federal no Paraná.>
Passado pouco mais de um mês, a partir de nova contestação dos dois políticos alagoanos nos mesmos autos, o presidente do STJ acolheu o pedido para que a matéria seja analisada regularmente na corte.>
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Em seu terceiro mandato como deputado federal, Lira lançou na quarta-feira (10) sua candidatura à presidência da Câmara. Ele tem o apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na disputa que ocorrerá em fevereiro.>
O parlamentar responde a acusações em diferentes instâncias da Justiça, parte delas fruto da Lava Jato.>
Foi a partir de apurações da Lava Jato que a AGU (Advocacia-Geral da União) pediu o bloqueio de bens no montante de até R$ 10,4 milhões contra Lira e o pai, com o objetivo de garantir ressarcimento aos cofres públicos de prejuízos causados à Petrobras.>
A 11ª Vara Federal do Paraná acatou o pedido em 2016, em processo vinculado a ação de improbidade administrativa em que os dois são acusados de se beneficiar de R$ 2,6 milhões desviados da estatal, segundo apurou o MPF (Ministério Público Federal). A base da acusação foi a delação premiada de Ricardo Pessoa, da construtora UTC.>
A defesa dos Lira vem tentando reverter o bloqueio desde então. Bateu às portas do STJ com a alegação de que não existe ato ímprobo que justifique a medida cautelar.>
O principal argumento é que Lira e Benedito foram absolvidos pelo STF (Supremo Tribunal Federal) da acusação criminal relacionada ao mesmo caso.>
O Supremo analisou a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) no fim de 2017. Desfalcada de dois ministros na sessão, a 2ª Turma derrubou o pedido de abertura de ação penal pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.>
Foram dois votos (Gilmar Mendes e Dias Toffoli) a um (Edson Fachin) contra a Lava Jato. Gilmar e Toffoli são críticos dos métodos da operação.>
Em agosto deste ano, o ministro João Otávio de Noronha, ainda presidente do STJ, rejeitou o recurso dos Lira com base na jurisprudência segundo a qual não caberia, pela via recursal escolhida, a análise da cautelar que estabeleceu o bloqueio de bens.>
Humberto Martins assumiu o comando do tribunal dias depois. Em setembro, a partir de novo recurso do deputado e do ex-senador, Martins confirmou a decisão de Noronha. Em outubro, no entanto, mudou seu entendimento sobre a controvérsia.>
Para representá-los perante o STJ, Lira e o pai escalaram Willer Tomaz, que afirma ter um terço dos integrantes do Congresso como clientes de seu escritório.>
Tomaz costuma promover encontros em sua casa nos arredores de Brasília prestigiados por políticos, advogados e integrantes do Judiciário.>
Recém-empossado no Supremo, o ministro Kassio Nunes foi a uma dessas reuniões no ano passado. Na ocasião, buscava se cacifar para uma vaga no STJ. Entre os presentes, como confirmou Kassio à reportagem, estava o advogado Eduardo Martins, filho do atual presidente do STJ.>
O advogado de Lira afirmou que o tribunal entendeu que não se debate o mérito da ação de improbidade, o que motivou a negativa inicial da corte, e se é pertinente manter o bloqueio de bens após a conclusão do STF sobre a parte penal.>
"O Supremo concluiu que não houve crime, o fato gerador. Assim, não se pode falar em indisponibilidade de bens", afirmou.>
Tomaz disse não se recordar da presença de Kassio e Eduardo Martins em sua casa. Afirmou que conhece o filho do presidente do STJ, mas que os dois não têm vínculo de amizade ou profissional.>
Martins foi recentemente denunciado pela Lava Jato do Rio de Janeiro por tráfico de influência envolvendo decisões do tribunal.>
Procurado por meio da assessoria de imprensa, o presidente do tribunal afirmou que seus argumentos estão na sua decisão e que caberá ao ministro a quem for distribuído o recurso analisá-lo. Nada comentou sobre o advogado que atua no caso.>
O advogado Eduardo Martins não atendeu às ligações da reportagem nem respondeu à mensagem enviada, por escrito, a seu telefone celular.>
Em parecer enviado há quatro semanas ao STJ, o subprocurador-geral da República Nicolao Dino se posicionou contra o recurso de Lira e Benedito.>
Dino afirmou que a decisão da 2ª Turma do Supremo não tem repercussão jurídica sobre a indisponibilidade de bens decretada pela Justiça Federal no Paraná. Ele citou o princípio da independência das esferas administrativa, cível e criminal.>
Para o representante da Procuradoria, a alegação da defesa de que não há indícios suficientes de atos ímprobos atribuídos aos acusados exigiria reexame do conjunto de provas dos autos, o que não seria possível na via recursal apresentada ao STJ.>
No Supremo, após o julgamento da parte criminal, cujo desfecho em 2017 foi favorável aos Lira, os ministros voltaram a analisar o caso neste ano para definir o destino do inquérito em razão de fatos remanescentes ainda a ser investigados.>
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