Publicado em 21 de novembro de 2022 às 09:38
FABIO SERAPIÃO E MARCELO ROCHA>
BRASÍLIA, DF - A PGR (Procuradoria-Geral da República) trava há praticamente três meses o acesso da Polícia Federal a dados da CPI da Covid nos autos de uma investigação que tem o presidente Jair Bolsonaro (PL) como um dos alvos.>
Os responsáveis pela apuração já pediram o compartilhamento do material por duas vezes. A solicitação foi feita em 19 de agosto, reiterada em 4 de outubro. O caso tramita na PGR sob a responsabilidade da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo.>
À Folha, a Procuradoria afirmou que, por se tratar de diligência no curso de uma investigação, não seria possível fornecer informações a respeito.>
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Disse ainda que há manifestação pelo arquivamento dos autos, enviada ao STF (Supremo Tribunal Federal) no início do mês. O relator é o ministro Luís Roberto Barroso.>
Em novembro do ano passado, de posse do relatório final da CPI da Covid, o procurador-geral da República, Augusto Aras, encaminhou dez procedimentos ao Supremo para aprofundar as conclusões da comissão relacionadas a autoridades com prerrogativa de foro.>
Entre as propostas de indiciamento incluídas no documento, os senadores atribuíram a Bolsonaro o delito de incitação ao crime (artigo 286 do Código Penal).>
O relatório sugeriu que o presidente teria cometido a prática criminosa ao estimular a população "a se aglomerar, a não usar máscara e a não se vacinar".>
Para o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), Bolsonaro incentivou que pessoas desobedecessem regras editadas pelo poder público para inibir a propagação de doença contagiosa.>
A comissão sugeriu enquadrar outros políticos sob a mesma acusação, incluindo o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Bia Kicis (PL-DF) e Carla Zambelli Salgado (PL-SP).>
De acordo com as conclusões da CPI, "de forma mal-intencionada e visando interesses próprios e escusos", o grupo provocou "grande confusão na população, levando as pessoas a adotarem comportamentos inadequados para o combate à pandemia de Covid-19".>
Em maio, para levar adiante as diligências, a PF pediu ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), acesso ao acervo digital probatório da CPI para análise pelos peritos. Dois meses depois, os investigadores reforçaram o pedido via ministro Roberto Barroso.>
Informada pelo Senado de que o material está de posse da PGR, a polícia pediu ao órgão o acesso à documentação em meados de agosto, por intermédio de ofício endereçado à vice-procuradora-geral da República. E reiterou a solicitação no dia 4 de outubro.>
Barroso foi alertado pelos investigadores de que não ocorreu ainda "o necessário acesso aos 10 terabytes de dados produzidos pela CPI do Senado de forma a ser possível se realizar o correlacionamento dos documentos juntados com cada fato típico supostamente praticado pelos envolvidos".>
No último dia 7, no entanto, a PF foi surpreendida com um pedido de arquivamento da apuração enviado ao Supremo pela representante da PGR.>
A representante da PGR argumentou que a norma que impõe o uso de máscara protetiva "somente prevê sanção de multa como mecanismo de coerção ao cumprimento da obrigação, não ressalvando a aplicação cumulativa da sanção penal".>
Lindôra afirmou que, diante de uma "sociedade polarizada e com o exercício caótico da liberdade de expressão", potencializado pelas redes sociais, a penalidade administrativa é suficiente contra aqueles que desobedecem a norma que impõe o uso de máscara.>
Sobre a acusação da CPI de que Bolsonaro incentivou populares a entrarem em hospitais e realizarem filmagens a fim de demonstrar se seus leitos estavam ocupados ou não, a vice-PGR afirmou que não se configura crime "o incentivo à participação e fiscalização popular acerca do devido uso das significativas verbas públicas federais".>
Na visão dela, Bolsonaro demonstrou preocupação com os gastos relacionados ao combate à pandemia e ressaltou a importância do controle social dos atos das autoridades diretamente envolvidas com as respectivas ações.>
"Não se observa, na fala do presidente da República, qualquer incentivo à 'invasão' de hospitais ou à prática de condutas que colocassem pessoas em perigo de vida", mas, prosseguiu, um estímulo "para a população verificar 'se os gastos são compatíveis ou não', ou seja, cuida-se de incentivo a uma fiscalização pública de recursos".>
Em junho de 2020, o presidente pediu aos seus seguidores nas redes sociais que filmem o interior de hospitais públicos e de campanha para averiguar se os leitos de emergência estão livres ou ocupados.>
Em live nas redes sociais, o presidente defendeu que, caso as imagens demonstrem alguma anormalidade, elas sejam enviadas ao governo federal, que o repassará para a Polícia Federal ou para a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) para que sejam investigadas.>
"[Se] Tem hospital de campanha perto de você, hospital público, arranja uma maneira de entrar e filmar. Muita gente está fazendo isso e mais gente tem que fazer para mostrar se os leitos estão ocupados ou não. Se os gastos são compatíveis ou não. Isso nos ajuda", disse o presidente.>
Ainda não há decisão do relator quanto ao pedido de arquivamento apresentado pela PGR.>
Em julho, às vésperas do início da campanha eleitoral, Lindôra já havia pedido o arquivamento de 7 das 10 apurações preliminares abertas após a conclusão da CPI da Covid.>
Em cinco dessas apurações, Bolsonaro foi acusado pela comissão de crimes de charlatanismo, prevaricação, emprego irregular de verbas ou rendas públicas, epidemia com resultado de morte e infração de medida sanitária preventiva.>
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