Publicado em 8 de outubro de 2020 às 17:52
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello fez uma defesa do princípio de que todos são iguais perante a lei, e votou pela recusa a um pedido do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que busca depor por escrito em um inquérito que apura interferência política na Polícia Federal. Em seu voto de despedida, o decano da corte fez críticas a "privilégios" e "tratamentos especiais" e manteve a posição que havia demonstrado em setembro, quando determinou que Bolsonaro fosse ouvido presencialmente pela PF. >
Mello afirmou que qualquer investigado, seja chefe de poder ou não, deve passar por interrogatório presencialmente, de acordo com a lei. "Nunca é demasiado reafirmar que a ideia de República traduz um valor essencial: a igualdade de todos perante as leis do Estado. Ninguém, absolutamente ninguém tem possibilidade para transgredir as leis. Ninguém está acima da autoridade e do ordenamento jurídico brasileiro", afirmou o ministro nesta quinta-feira, 8, no plenário do Supremo.>
O ministro, que deixa o STF no próximo dia 13, afirmou que investigados, 'independentemente da posição funcional que ocupem no aparato estatal ou na hierarquia de poder do Estado, deverão comparecer, perante a autoridade competente, em dia, hora e local por esta unilateralmente designados'.>
Mello afirmou que tem defendido essa posição há mais de 20 anos no STF. A lei, como destacou, prevê apenas depoimento por escritos para presidentes de poderes quando eles estão na condição de testemunha, mas não na de investigados. Em sua explicação, Mello afirmou que a presença de réus não pode não ser substituída e não é possível haver interrogatórios por procuração. >
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Segundo ele, sem o depoimento presencial, há prejuízo para a investigação, diante da impossibilidade de se fazer novas perguntas e explorar eventuais contradições.>
"O dogma republicano da igualdade, que a todos nos nivela, não pode ser vilipendiado por tratamentos especiais e extraordinários inexistentes em nosso sistema de direito constitucional", disse. O ministro afirmou, também, que não se pode justificar "o absurdo reconhecimento de inaceitáveis e odiosos privilégios, próprios de uma sociedade fundada em bases aristocráticas ou, até mesmo, típicos de uma formação social totalitária".>
Jair Bolsonaro é investigado pela Polícia Federal e pela Procuradoria-Geral da República desde abril, após o então ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, afirmar que estavam acontecendo interferências indevidas na Polícia Federal, por parte do presidente. Na segunda-feira, 5, o inquérito foi prorrogado por mais 30 dias.>
Como a investigação chegou na fase de tomada de depoimento, o ministro Celso de Mello determinou que ele fosse tomado presencialmente, em setembro. Apesar de Bolsonaro ter dito anteriormente que, para si, não fazia diferença a forma do depoimento, a Advocacia-Geral da União - que o representa no caso - recorreu ao plenário do Supremo, para que ele seja autorizado a prestar informações por escrito.>
Segundo destacou a defesa de Bolsonaro, precedentes no tribunal permitiram que depoimentos fossem tomados por escritos. O ex-presidente Michel Temer teve essa permissão concedida em 2017 e 2018, por decisões dos ministros Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. O procurador-geral da República, Augusto Aras, concordou com o pedido da defesa de Bolsonaro.>
Celso de Mello, porém, afirmou que a recusa para depoimento por escrito não é inédita entre chefes de poderes. Ele explicou que o ex-ministro do STF Terori Zavascki determinou depoimento presencial de um ex-presidente do Congresso Nacional. "O postulado republicano repele privilégios e não tolera discriminação, impedindo que se faça tratamento seletivo em favor de determinadas pessoas", disse Celso de Mello.>
O decano frisou, também, que presidentes de poderes, como quaisquer cidadãos, têm uma série de direitos - entre eles, não ser tratado como culpado antes do trânsito em julgado, não se incriminar, não ser condenado com provas ilícitas.>
Após o voto de Celso de Mello, a sessão foi encerrada. Faltam os votos dos outros dez ministros para definir o caso.>
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