Publicado em 24 de agosto de 2020 às 15:05
Com mais de 114 mil mortes provocadas pelo novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) liderou nesta segunda-feira (24) um evento no Palácio do Planalto para defender que o Brasil está "vencendo a Covid-19" e para fazer apologia ao tratamento com a hidroxicloroquina -medicamento que não tem tido eficácia comprovada para a doença em estudos recentes e com risco de efeitos colaterais.>
No ato, ele voltou a criticar a imprensa e disse que jornalista, se infectado pelo coronavírus, tem mais chance de morrer por ser "bundão".>
O ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, não participou da agenda por estar em compromisso no Ceará.>
Referindo-se à repercussão negativa de quando disse em março que, por seu "histórico de atleta", sentiria apenas uma "gripezinha" se infectado pela Covid, Bolsonaro se referiu a jornalistas com a expressão "bundão".>
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"O pessoal da imprensa vai para o deboche [na frase do histórico de atleta]. Mas, quando [a Covid] pega num bundão de vocês, a chance de sobreviver é menor", afirmou.>
"[Jornalista] Só sabe fazer maldade, usar caneta com maldade em grande parte. Tem exceções, como aqui o Alexandre Garcia. A chance de sobreviver é bem menor do que a minha", disse, sinalizando o ex-apresentador da TV Globo, hoje na CNN e um defensor do bolsonarismo nas redes sociais.>
É a segunda vez em um dia que Bolsonaro se refere de forma desrespeitosa a jornalistas. No domingo (23), ao ser questionado sobre depósitos de R$ 89 mil feitos pelo ex-assessor Fabrício Queiroz na conta da primeira-dama, Bolsonaro disse que tinha vontade de encher a cara do repórter com uma porrada.>
Nesta segunda-feira, o presidente também utilizou seu discurso para criticar seu ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM), demitido por discordar do mandatário na condução da resposta do governo diante da pandemia. Diferenças de opiniões sobre o uso da cloroquina foram uma das motivações da demissão.>
"Se a hidroxicloroquina não tivesse sido politizada, muitos mais vidas poderiam ter sido salvas", afirmou o presidente, em frase sem embasamento científico.>
A cerimônia, realizada no principal salão de eventos do Palácio do Planalto, reuniu médicos entusiastas da cloroquina.>
Entre os que participaram do evento, estão profissionais que ficaram conhecidos por divulgarem vídeos em defesa da cloroquina -alguns com afirmações refutadas por sociedades de especialistas ou em checagens de projetos como o Comprova.>
"Com o tratamento precoce, a nossa linda hidroxicloroquina, consegue sim reduzir os danos da Covid-19. Povo brasileiro, não tenha medo dessa medicação", disse a médica Raíssa Soares, uma das participantes.>
Na cerimônia desta segunda, o grupo disse representar "10 mil médicos que ousam pela verdade e pela vida" e em defesa da "linda e velha cloroquina".>
Apesar de dizer que têm evidências que sustentam o uso do medicamento também para a Covid-19, o grupo não apresentou quais seriam esses estudos.>
"Mesmo que não as tivéssemos, em tempos de pandemia, o médico pode sim fazer uso de medicamentos off label", disse o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco.>
Bolsonaro participou do evento "Encontro Brasil vencendo a Covid-19", realizado no Planalto e com transmissão ao vivo pela TV Brasil, emissora do governo.>
O encontro ocorre a despeito do alto patamar de mortes que o país ainda registra seis meses depois do início da epidemia. Até domingo, o país já registrava 114.772 mortes provocadas pelo novo coronavírus. O número de pessoas que já foram infectadas é de 3.605.726.>
No mundo, apenas os Estados Unidos têm números piores, com quase 177 mil mortos e mais de 5,7 milhões de casos, de acordo com a Universidade Johns Hopkins.>
Dados divulgados pelo Ministério da Saúde apontam que 2.739.035 pacientes conseguiram se recuperar da doença. Outros 752.004 seguem em acompanhamento.>
Na tentativa de reduzir o impacto dos números, o Planalto tem divulgado que o país soma um número maior de recuperados em comparação a outros países. Especialistas, no entanto, alertam que o cálculo é impreciso e atribuem a maior taxa ao maior número de infecções e impacto da doença.>
O evento também ocorre em que a curva de casos e mortes ainda segue em aumento em alguns estados. Balanço do Ministério da Saúde divulgado na última semana, por exemplo, apontava seis estados nessa situação nas regiões Sul, Centro-Oeste, Sudeste e Norte.>
Desde o início da pandemia, o presidente vem minimizando o impacto da Covid-19 e defendendo a reabertura de comércios e relaxamento de medidas de isolamento social, na contramão de medidas indicadas pela Organização Mundial de Saúde e cientistas para evitar a transmissão do vírus.>
Ao mesmo tempo, o presidente tem reforçado a defesa de medicamentos sem eficácia comprovada para a doença, caso da cloroquina.>
A situação levou a queda de dois ministros da Saúde durante a pandemia: Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. Atualmente, o Ministério da Saúde é comandado de forma interina pelo general Eduardo Pazuello.>
Dados de pesquisa Datafolha divulgada após o país chegar a 100 mil mortes, no entanto, mostram que os brasileiros ficam divididos em relação à responsabilidade do presidente por essa marca.>
Quase metade deles, 47%, dizem acreditar que o presidente não tem culpa nenhuma pelos óbitos. Os que acham que Bolsonaro tem responsabilidade somam 52% -são 11% os que o veem como principal culpado e 41% os que dizem que ele é um dos culpados, mas não o principal.>
A pesquisa foi feita por telefone com 2.065 brasileiros adultos que têm celular, nos dias 11 e 12 de agosto. A marca das 100 mil mortes pela Covid-19 foi atingida no dia 8 de agosto, menos de cinco meses após o registro da primeira morte decorrente da doença no país.>
Nos últimos meses, Bolsonaro e ao menos oito ministros de seu governo foram infectados pelo coronavírus. A primeira-dama, Michelle Bolsonaro, também contraiu o vírus. Tanto o presidente quanto a primeira-dama e os ministros não tiveram quadros graves da doença e já se recuperaram.>
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