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Uma mulher na reitoria da Ufes. Por que não?

Como cientista que sou, acostumada a fazer perguntas e não a dar respostas a priori, pus-me a indagar acerca das razões de uma decisão que se apresenta límpida e objetiva como o desrespeito à comunidade universitária

  • Ethel Maciel
Publicado em 25/03/2020 às 08h00
Atualizado em 25/03/2020 às 08h00
Ethel Maciel, vice-reitora da Ufes
Ethel Maciel, agora ex-vice-reitora da Ufes. Crédito: Divulgação

Há algum tempo tenho dedicado meu esforço diário na luta pela igualdade de gênero em nosso Estado, lugar esse conhecido por uma cultura machista, de violência contra as mulheres e altos índices de feminicídio.

Em todos os espaços nos quais o debate dos Direitos Humanos e da necessária busca pela garantia de direitos se dava, fui demandada no sentido de assumir um compromisso de luta e defesa das mulheres, das mais vulneráveis e da universidade como espaço de desenvolvimento de uma sociedade mais crítica e compromissada com a produção de conhecimento que pudesse ser relevante para todos do Espírito Santo, do Brasil e do mundo.

Esse sentimento de compromisso social sempre me manteve viva em minhas responsabilidades de professora, pesquisadora, enfim, mulher da ciência.

Diante de tantos problemas e tantas possibilidades de enfrentamentos, um grupo político coeso me escolheu para representar um projeto que, mesmo em tempos de ataques à ciência e à produção de conhecimento, representava um avanço no cenário de obscurantismo no qual nos encontramos.

Desafiando as estatísticas, uma mulher — pesquisadora, com um currículo robusto na carreira acadêmica, feminista, defensora dos Direitos Humanos e das conquistas sociais — se levantou e lutou!

A batalha foi dura, contra forças visíveis e invisíveis, mas a defesa da democracia se fez presente nas urnas. Uma vitória histórica, sem precedentes, inquestionável, bonita e limpa, foi consolidada.

Iniciamos a segunda batalha, o apoio das forças políticas do Estado. Foram muitos os diálogos, não sendo difícil conseguir o apoio de expressiva representatividade do Estado.

Na terceira batalha, vencemos no Colégio Eleitoral. O grupo foi se consolidando deixando evidenciada a necessidade de unir forças para blindar a universidade contra aqueles que a queriam menor. Vencemos, Paulo e Rogério, companheiros de luta. Mas a última e derradeira batalha estava por vir. Restava a nomeação.

Na segunda-feira (23), no findar do dia, fomos surpreendidos com a nomeação do segundo da lista, em uma demonstração inequívoca de desconsideração para com a comunidade acadêmica, em sua vontade soberana.

Não há como negar o sentimento de frustração e de decepção com a ruptura do pacto democrático até então estabelecido na Universidade Federal do Espírito Santo.

Como cientista que sou, acostumada a fazer perguntas e não a dar respostas a priori, pus-me a indagar acerca das razões de uma decisão que se apresenta límpida e objetiva como o desrespeito à comunidade universitária.

Na Epidemiologia, minha área de estudo, há perguntas clássicas, e uma delas me ajudou a entender a decisão tomada no Planalto: o que os indivíduos de um mesmo grupo têm em comum e no que eles se diferenciam?

Como epidemiologista, acostumada a fazer o exercício de elencar as categorias a serem analisadas, apliquei, nesse caso, o raciocínio científico.

Em comum, os três professores que compuseram a lista tríplice possuem as seguintes características: os três são pesquisadores, os três pertencem ao mesmo campo político, os três têm experiência em gestão. Como diferença apenas o gênero. São dois homens e uma mulher.

Simples assim o raciocínio científico. É claro que poderíamos fazer muitas outras considerações e análises utilizando a ciência, mas, por ora, essa nos basta.

Mas como o saber científico nos impõe continuar a fazer perguntas que decorram da conclusão anterior, fica em aberto a indagação a ser respondida a partir de agora.

Porque não uma mulher na reitoria da UFES?

A autora é professora e ex-vice-reitora da Ufes

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