Publicado em 5 de março de 2024 às 10:00
Batizados com o nome de Afrodite, a deusa grega do amor e da paixão, os afrodisíacos são alimentos que muitos acreditam aumentar a libido, a potência e o prazer sexual.>
Quem nunca ouviu falar que chocolates, morangos e ostras podem ter esse efeito tão poderoso?>
Historicamente, os afrodisíacos incluíram até mesmo alimentos bem peculiares – incluindo a tóxica cantárida ou mosca-espanhola, chifres de rinoceronte moídos e extratos de plantas raras.>
De fato, durante a pesquisa para o seu livro Intercourses, sobre alimentos afrodisíacos, a coautora Martha Hopkins descobriu que quase todos os alimentos foram considerados afrodisíacos em algum momento.>
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"Historicamente, os alimentos considerados afrodisíacos eram difíceis de encontrar, raros ou caros, como trufas, foie gras e caviar, ou tinham forma de órgão sexual, como aspargos ou alcachofras, e até mesmo testículos de animais", segundo Hopkins.>
Se hoje tendemos a pensar em afrodisíacos em termos de luxúria, romance e libido, no século 17 – quando tudo era considerado afrodisíaco, de pombos até raízes como a pastinaca e amêndoas –, eles estavam associados à reprodução e à fertilidade e eram dados aos casais como substâncias medicinais, diz Jennifer Evans, palestrante sênior de história da Universidade de Hertfordshire, na Inglaterra, e pesquisadora sobre comida e fertilidade.>
Mas um alimento pode realmente afetar o desejo e o desempenho sexual? E por que essa ideia é tão persistente?>
Os afrodisíacos são substâncias – alimentos ou medicações – que aumentam os níveis de estímulo, desejo sexual, comportamento e prazer após o seu consumo.>
Diversas culturas ao longo da história buscaram alimentos que pudessem seduzir os amantes ou melhorar seu desempenho sexual.>
Muitos deles são iguarias raras ou de luxo. E alguns têm notável semelhança com órgãos sexuais ou odores que despertam os sentidos.>
Na Roma Antiga, por exemplo, uma erva compacta chamada sílfio era valorizada pela sua seiva odorífera e seu suco era usado como afrodisíaco – embora também possa ter sido empregado como forma de controle de natalidade.>
Atualmente, o chocolate, os figos e as ostras fazem parte de uma longa lista de alimentos conhecidos por suas supostas propriedades afrodisíacas. Mas existem outros que são bizarros e muito caros, como um molusco com formato fálico conhecido como amêijoa-gigante ou pelo seu nome em inglês, "geoduck".>
Para aqueles que têm problemas de circulação sanguínea, é verdade que certos alimentos podem ajudar de maneira semelhante ao medicamento Viagra – relaxando os vasos e melhorando o fluxo do sangue para os genitais. >
O aminoácido L-arginina, encontrado em alimentos como abóboras, nozes e carne bovina, é transformado em óxido nítrico no organismo, o que aumenta o fluxo sanguíneo. Alimentos ricos em ácidos graxos ômega-3, incluindo salmão e abacate, fazem o mesmo.>
Outra substância que ajuda é a quercetina. Encontrada em maçãs, frutas vermelhas, uvas, vinho tinto, alho e chocolate amargo, possui propriedades anti-inflamatórias que podem melhorar o fluxo do sangue.>
No entanto, apenas pessoas com o fluxo sanguíneo comprometido perceberão qualquer melhora na função sexual ao ingerir esses alimentos, segundo Lauri Wright, porta-voz da Academia Americana de Nutrição e Dietética. Alguém com boa circulação provavelmente não verá nenhuma alteração.>
Mas, quando a maioria de nós pensa em afrodisíacos, não pensa em desempenho sexual. Pensa em desejo.>
Uma comida que há muito tempo se acredita que aumenta o desejo sexual é o chocolate. Estudos mostraram que o cacau pode aumentar o fluxo sanguíneo em partes do nosso corpo.>
Mas quando sua relação direta com o desejo sexual foi estudada, não surgiram evidências que sustentassem seu uso como afrodisíaco. Na verdade, um estudo de observação em 2021 concluiu o contrário.>
Pesquisadores perguntaram a 700 pessoas sobre seu interesse em sexo e o consumo de chocolate. E concluíram que as mulheres que comiam chocolate com mais frequência também relatavam ter menos interesse pelo sexo.>
Os pesquisadores estudaram outras possíveis razões para o baixo desejo sexual ou alto consumo de chocolate, incluindo falta de disposição, pressão sanguínea e ingestão de calorias.>
Os resultados indicam que comer chocolate pode servir de substituto para o sexo. Ele estimula a produção dos neurotransmissores serotonina e dopamina, que também influenciam nossa reação sexual.>
Na verdade, nenhum indício foi encontrado para provar que qualquer alimento aumente a excitação ou o desejo. Mas há uma exceção: o álcool.>
Vários estudos mostraram que o consumo de álcool está ligado à maior excitação, mas também pode prejudicar o desempenho sexual.>
O vinho tinto, em especial, pode estar indiretamente ligado à função sexual devido aos seus possíveis benefícios à saúde do coração, diz Michael Krychman, obstetra, ginecologista e conselheiro sexual clínico do Centro de Saúde Sexual e Medicina de Sobrevivência do Sul da Califórnia, nos Estados Unidos.>
Em 2022, uma análise de mais de 50 estudos populacionais concluiu que até quatro porções de vinho tinto por semana foram associadas à redução do risco de morte cardiovascular, em comparação com cerveja e destilados.>
Mas os pesquisadores explicaram que existem muitos outros fatores intervenientes que podem explicar esta relação. Por isso, a relação entre o vinho tinto e a saúde cardiovascular permanece inconclusiva.>
A reputação do vinho como afrodisíaco também pode vir do fato de fazer parte da dieta mediterrânea, composta principalmente por alimentos de origem vegetal, como frutas, verduras, cereais integrais, legumes e nozes, além de peixes e azeite de oliva. Ela é relativamente pobre em açúcar, queijos e carnes.>
Mais um estilo de vida do que simples alimentos, a dieta mediterrânea pode ter qualidades afrodisíacas.>
"As pesquisas descobriram que o vinho tinto afeta a função sexual, mas não sabemos se é a dieta ou uma combinação de dieta, estilo de vida e genética", explica Krychman. "O que sabemos é que, para as pessoas que se exercitam, têm uma alimentação saudável e menos estresse, todos esses elementos trabalham juntos para uma vida sexual melhor.">
Nossa alimentação como um todo pode funcionar como afrodisíaco por meio de benefícios como melhor fluxo sanguíneo, aumento de hormônios ou maior disposição, segundo Wright.>
Um estudo envolvendo 600 mulheres com diabetes tipo 2 identificou que a dieta mediterrânea estava ligada a níveis mais baixos de disfunção sexual, enquanto outro estudo concluiu que a dieta também pode estar associada a uma melhora da disfunção erétil.>
"A conclusão é que uma dieta saudável com frutos do mar, carnes magras, nozes, frutas, legumes e cereais integrais, o que é basicamente a dieta mediterrânea, ajuda na função nervosa, no fluxo sanguíneo e na produção de hormônios", diz Wright.>
Há uma boa razão pela qual não há evidências de que qualquer alimento específico seja afrodisíaco: uma comida que tenha um efeito tão potente seria perigosa, segundo Jessica Abbott, palestrante sênior de ecologia evolutiva da Universidade de Lund, na Suécia.>
"A maioria dos alimentos que ingerimos não tem efeitos colaterais, o que é reconfortante", explica ela. "Se tivessem, não seria seguro comê-los regularmente.">
"Qualquer erva que tenha sido considerada afrodisíaca é do tipo de alimento que normalmente não comeríamos muito, como extratos de raízes e plantas que têm compostos ativos usados na defesa contra herbívoros.">
Então, por que algumas pessoas juram que certos alimentos têm qualidades afrodisíacas? Pode ser simplesmente porque eles acreditam, segundo Krychman.>
"Há evidências limitadas dos efeitos das ostras sobre o desejo sexual, mas falta uma avaliação rigorosa [que comprove essa relação] – em parte, porque o efeito placebo é muito grande", diz ele.>
O fato de que o desejo sexual é tão individual e multifacetado pode funcionar a favor dos afrodisíacos, segundo Nan Wise, psicoterapeuta e terapeuta sexual da Universidade Rutgers, nos Estados Unidos.>
"O desejo é físico, psicossocial e relacional e envolve muitas variáveis", explica Wise. "Se você acredita que um alimento aumenta o desejo, a psicologia do efeito placebo afeta nossa capacidade de ficar excitado ou não.">
Tudo depende do contexto, acrescenta Evans, da Universidade de Hertfordshire. "Você não pensa em chocolate como afrodisíaco toda vez que come algum. Você precisa do contexto certo", diz ela.>
Nossas experiências individuais também podem determinar quais alimentos aumentam o desejo sexual em cada um de nós, segundo Jean-Christophe Billeter, professor de comportamento social e sexual da Universidade de Groningen, na Holanda.>
"Os humanos são muito influenciáveis e o cérebro mantém memórias fortes de quando temos um sucesso sexual", explica o professor. "Dependendo da situação, se algo aconteceu no ambiente onde uma pessoa fez sexo, isso irá desencadear o desejo de ter sexo no futuro.">
Outra possível explicação relacionada à mente para o efeito afrodisíaco é a nossa disposição.>
Pesquisas indicam que a disposição positiva é associada à maior estimulação sexual e que dietas ricas em alimentos à base de vegetais foram relacionadas ao menor risco de ansiedade e depressão.>
De fato, talvez qualquer alimento possa ter qualidades afrodisíacas. No mínimo, se uma pessoa está morrendo de fome e não há comida por perto, faz sentido que seu desejo sexual diminua.>
"Evolutivamente falando, os seres humanos têm o desejo de ter relações sexuais para se reproduzir e precisamos ter um peso saudável e uma dieta que forneça os nutrientes certos para isso", diz Billeter.>
Há evidências de que a comida aparece regularmente na pornografia do século 17 pela mesma razão, segundo Evans: ela estava ali para ajudar a alimentar o casal para a próxima rodada.>
Em seus experimentos com moscas-das-frutas, Billeter descobriu que os padrões de acasalamento mudam significativamente quando a comida não está próxima.>
Se as moscas estiverem em um ambiente onde há comida, elas acasalam com o primeiro macho que encontrarem até sete vezes ao dia. Se não houver comida, elas só acasalam uma vez.>
Há também evidências na natureza de que comemos certos alimentos para ficar mais atraentes para o sexo oposto.>
Considere certas aves em que os machos são mais coloridos porque as fêmeas acham atraente. Eles conseguem essa cor comendo alimentos com carotenoides. Isso se aplica também aos humanos.>
"No passado, as mulheres consideradas mais atraentes tendiam a ser mais gordas, já que ser gorda, quando não havia muita comida por perto, poderia indicar que a mulher seria uma boa reprodutora", explica Billeter.>
Também pode haver uma qualidade afrodisíaca inerente à prática de dar comida a um parceiro sexual – o que talvez explique a verdadeira razão pela qual uma caixa de chocolates ou uma refeição caseira podem induzir ao desejo.>
Uma refeição caseira, na ocasião correta, pode ser afrodisíaca.>
"As aranhas capturam moscas para apresentar às fêmeas para acasalar, enquanto uma espécie de grilo produz uma estrutura gelatinosa para induzir as fêmeas ao acasalamento", diz Abbott.>
A ideia de que os afrodisíacos são bons para nossa vida sexual persiste há tanto tempo porque as pessoas sempre foram atraídas por conceitos que prometem juventude, longevidade e fertilidade, argumenta Evans. >
E, por esse motivo, é provável que continuemos a acreditar neles nos próximos séculos.>
Esta reportagem foi publicada originalmente em 23 de março de 2019 e atualizada em fevereiro de 2024 para incluir as pesquisas mais recentes.>
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