Publicado em 28 de março de 2020 às 09:01
A vida social cede espaço apenas para a interação com pacientes e colegas e sem previsão de quando tudo vai passar. Profissionais da saúde têm evitado o contato físico com a família por medo do contágio, a rotina dos hospitais passam por um momento tenso e eles ocupam a linha de frente no enfrentamento de uma pandemia. >
De acordo com dados da Organização das Nações Unidas, as mulheres ocupam cerca de 70% dos cargos nos setores social e de saúde. Além disso, em nossa cultura - machista, diga-se de passagem-, elas quase sempre são responsáveis por cuidar da família, dos filhos, da casa, mas e aí? Quem cuida de quem cuida?>
Luiza Vasconcelos (31) é médica plantonista em um pronto-atendimento e conta que o estresse é maior do que em qualquer outro momento, além disso, ela diz que os cuidados se aproximam de certa neurose por precisar estar atenta 100% do tempo. Precisamos lembrar de limpar todos os itens da mesa, até a caneta. Quando chegamos em casa, temos que higienizar tudo imediatamente, lavar as roupas, tomar banho. Tudo isso por medo de contaminar alguém que amamos, a gente nunca descansa, nem quando estamos fora do expediente, diz. >
Lucimaria dos Santos tem 38 anos e há seis trabalha na área de enfermagem da Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do Hospital estadual Dr Jayme Santos Neves, na Serra. Ela conta como a pandemia tem mexido com a mente e com a rotina dessas profissionais. Confira a entrevista:>
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Qual a sensação de compor a linha de frente em um momento como esse, em que o mundo todo está em alerta?>
Não é fácil, mas a gente enfrenta a situação de forma real, não é sobre o que dizem as estatísticas, é aquilo que você vivencia. Essa está sendo a fase mais tensa da minha carreira, porque a gente sabe que não pode negar assistência e que vamos enfrentar caos em alguns momentos e em grandes proporções.>
O que muda na vida e na rotina de vocês com a chegada da Covid-19?>
É muito difícil, além de o nosso trabalho lidar diretamente com o problema, não só eu como vários profissionais da saúde tivemos que tirar nossos filhos da nossa própria casa por falta de opção, pra não colocá-los em risco. Isso é muito triste, mas não há outra forma de protegê-los, nós estamos lá (no hospital) a todo tempo e não estamos imunes apesar de todos os cuidados.>
Como foi a reação da sua equipe, dos seus colegas ao se dar conta de que tinham um desafio dessa proporção para enfrentar?>
No início, nos primeiros dias em alerta de caos, nós ficamos em pânico, no hospital em que trabalho recebemos assistência psicológica para ajudar a lidar com o momento. Além de toda a preocupação, neste início, estávamos sem o suporte necessário, nos negaram EPIs (Equipamentos de Proteção Individual). >
Qual é o clima no seu ambiente de trabalho neste momento?>
A entrada de um paciente com suspeita de coronavírus, quando a situação já é mais crítica e falta ar sempre nos deixa muito aflitos, mas é fundamental a gente saber lidar com a situação, o que é uma pressão psicológica também, ver tudo e ter que se segurar. Nós estamos muito juntos nesse momento, buscando forças nos colegas, companheirismo mesmo. É um amparando ao outro.>
A sua profissão exige que você esteja sempre na posição de quem oferece o cuidado, você tem a sensação de que te falta amparo?>
Sim, mas quando você ingressa na área da saúde, automaticamente você entende que abre mão de muita coisa, até do bem estar da família, para cuidar dos outros. Então a gente sempre tem que pensar no todo. Às vezes nós nem temos a segurança de quem tá de fora, mas sabemos que precisamos enfrentar certas situações de frente.>
E sobre você, enquanto pessoa, enquanto mulher, como você se sente agora? O que você tem pra se manter forte nesse momento?>
Eu abri mão da vaidade, eu penso só em me manter saudável. Minha principal preocupação é manter a casa o máximo higienizada e esterilizada possível, para quando eu finalmente puder receber minhas filhas, seja um ambiente seguro.>
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