Publicado em 13 de fevereiro de 2021 às 19:08
- Atualizado há 5 anos
Donald Trump acumulou ineditismos e entrou mais uma vez para a história americana. Neste sábado (13), o ex-presidente dos EUA seguiu o roteiro esperado e foi absolvido pelo Senado em seu segundo julgamento de impeachment. Em uma votação nominal, Trump se livrou da acusação de ter incitado a violenta invasão do Capitólio, em 6 de janeiro, no maior ataque à democracia do país desde a Guerra Civil.>
O Senado americano está hoje divido em 50 votos para democratas e 50 para republicanos e, para a condenação, eram necessários 67 dos 100 votos da Casa. Quando 34 senadores votaram pela absolvição, já tornaria impossível alcançar o número necessário para condenar Trump.>
O resultado cristaliza o forte poder e influência que o líder mais controverso da história americana ainda tem sobre o Partido Republicano, que tem se radicalizado à direita. Trump se tornou o primeiro presidente a enfrentar dois processos de impeachment — um deles concluídos com ele já fora do cargo — e agora seu desafio é permanecer no comando da direita populista americana até 2024, se quiser concorrer mais uma vez à Casa Branca.>
Líder republicano no Senado e um dos parlamentares mais influentes do Congresso, Mitch McConnell votou pela absolvição de Trump, apesar de ter dito publicamente que o ex-presidente havia provocado o episódio daquele 6 de janeiro. McConnell avisou aos colegas do teor de seu voto pouco antes do início da sessão deste sábado, em uma sinalização de que o establishment do partido ainda está sob a sombra de Trump.>
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O ex-presidente era acusado de insuflar seus apoiadores a invadir o Congresso dos EUA há pouco mais de um mês, em um ação violenta que deixou cinco mortos. O processo de impeachment foi aprovado na Câmara, de maioria democrata, em janeiro, e seguiu ao Senado para um julgamento rápido, que durou apenas cinco dias.>
Um reviravolta no início da sessão deste sábado, porém, deu a impressão de que o veredito poderia atrasar alguns dias. Isso porque a acusação fez um movimento inesperado e disse que queria convocar ao menos uma testemunha, a deputada republicana Jaime Herrera Beutler, para ser ouvida no processo.>
Na noite de sexta-feira (12), Beutler disse ter sido informada de que Trump havia se aliado à multidão durante o ataque ao Capitólio, o que chamou a atenção da acusação. Por 55 votos a 45 — cinco republicanos se uniram aos democratas — a convocação de testemunhas foi aprovada no Senado, mesmo sob protesto da defesa de Trump.>
Com isso, iniciou-se uma série de debates desencontrados para tentar achar a melhor maneira de prosseguir com o julgamento que ambos os partidos tinham pressa para encerrar. Depois de quase três horas de incertezas, democratas recuaram e desistiram de convocar testemunhas, incluindo apenas o depoimentos de Beutler nos autos.>
Uma dos dez parlamentares republicanos que votaram pelo impeachment de Trump na Câmara, no mês passado, a deputada conta que, no dia do ataque, Trump conversou com o líder da minoria na Casa, Kevin McCarthy, e disse: "Bem, Kevin, acho que essas pessoas estão mais chateadas com a eleição do que você.">
Nada disso, no entanto, foi suficiente para convencer 17 senadores republicanos a rifar Trump. Por mais que existam republicanos de perfil moderado, que se cansaram da postura agressiva do ex-presidente, o cálculo político foi minucioso diante de números que mostram que grande parte da base do partido ainda se ancora na retórica trumpista.>
Às vésperas da eleições legislativas, no próximo ano, os parlamentares republicanos não querem se arriscar.>
Apesar do cenário previsivelmente difícil, a acusação democrata usou doze horas do julgamento, que começou na terça-feira (9), para marcar uma argumentação assertiva de que Trump liderou e facilitou o acesso da multidão ao Congresso naquele 6 de janeiro e precisava ser punido por isso.>
O objetivo era fazer do julgamento um registro histórico, apostando no tom emocional e na demonstração institucional de que um ataque ao Capitólio e à democracia americana não poderia se repetir.>
Com vídeos e áudios inéditos, gravados pelas câmeras de segurança do Congresso, os deputados democratas — que funcionam como promotores no caso — sustentaram que Trump é um perigo para a democracia e poderia incitar mais violência caso não fosse condenado e voltasse à Casa Branca.>
Se fosse declarado culpado por dois terços do Senado, Trump poderia perder seus direitos políticos e seria, assim, impedido de concorrer às eleições.>
Os democratas apostaram em evidências que mostravam que os invasores só puderam marchar até Capitólio após o aval de Trump. O esforço da acusação foi criar uma espécie de linha do tempo para sustentar que o republicano incitou por vários meses a violência e facilitou o acesso da multidão ao caminho que culminou no mais brutal ataque ao Congresso americano em 200 anos.>
Na sexta, foi o dia da defesa de Trump entrar em campo, em uma exposição rápida, de pouco mais de três horas.>
Os advogados do ex-presidente sustentaram que o republicano era vítima de perseguição política e não tinha sido responsável por incitar a invasão ao Congresso. Segundo eles, o julgamento no Senado representava "a cultura do cancelamento constitucional.">
Os advogados de Trump sabiam que corriam pouco risco de perder o caso e fizeram um defesa baseada em argumentos políticos, com poucos detalhes objetivos sobre a postura do ex-presidente diante da ação no Capitólio. Eles tentaram reescrever as palavras do republicano, sob a tese de que seu discurso — que pedia que apoiadores "lutassem como nunca" — fazia parte de uma retórica política comum, usada inclusive por democratas, e protegida pelo direito à liberdade de expressão.>
A rapidez na exposição dos defensores já era esperada, assim como os principais eixos de sua tese: o ex-presidente não poderia ser responsabilizado pela ação do grupo que invadiu o Capitólio; seu discurso foi figurativo e está protegido pela Primeira Emenda da Constituição americana, que versa sobre liberdade de expressão; um processo de impeachment contra um ex-presidente é inconstitucional.>
Este último ponto, porém, já havia sido vencido na terça, primeiro dia de julgamento, quando o Senado decidiu, por 56 votos a 44, que Trump poderia, sim, ser julgado mesmo fora do cargo.>
No Senado, os dois lados desejavam terminar o julgamento em tempo recorde. Correligionários de Biden não queriam atrasar ainda mais as tentativas do presidente de aprovar um pacote de alívio econômico à pandemia, no valor de US$ 1,9 trilhão (cerca de R$ 10 trilhões), enquanto republicanos tinham pressa para enterrar o tema e tirar os holofotes do divisionismo do ex-presidente.>
Biden chegou a dizer que acreditava que os argumentos fortes da acusação poderiam ter mudado "algumas mentes" republicanas. Político profissional, porém, Biden sabia que a condenação de Trump era improvável e comentou com auxiliares que não esperava surpresas no veredito.>
Após incitar a violência e insistir na tese mentirosa de que a eleição de novembro fora fraudada, Trump teve sua conta no Twitter suspensa. Sem sua principal plataforma para dialogar com a base, ainda não é possível projetar como o ex-presidente vai se manter na liderança da extrema direita nos EUA.>
Sua absolvição neste sábado, porém, é a prova mais concreta de que, ao menos por enquanto, a maior parte de seus colegas de partido não aposta em seu eventual fracasso.>
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