Publicado em 5 de junho de 2020 às 14:37
No ano em que "a Terra parou", o dia mundial do meio ambiente, celebrado nesta sexta (5), passou a contar com um ar mais limpo, cidades menos ruidosas, flagrantes de animais circulando mais próximos das ocupações humanas, e dados fora da curva da emissão de gases-estufa, causadores do aquecimento global. >
A diferença nos níveis de poluição durante a quarentena adotada em todo o mundo para combater o coronavírus é atestada por satélite e também ao vivo, pelos moradores das grandes cidades. Nos últimos dois meses, eles passaram a compartilhar nas redes sociais fotos de um céu mais limpo, depoimentos sobre o ar mais leve e vizinhanças mais silenciosas.>
A poluição do ar está ligada à morte de cerca de 7 milhões de pessoas por ano, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), e também pode agravar as crises respiratórias causadas pelo coronavírus.>
Um estudo da Universidade Harvard (EUA) mostrou que a letalidade da Covid-19 é 8% maior em regiões onde a concentração de material particulado inalável (MP 2,5) é maior que um micrograma por metro cúbico (1 ?g/m3).>
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Desde que a quarentena começou na região metropolitana de São Paulo, em 24 de março, até o fim de maio, a Cetesb registrou 48 dias com qualidade do ar classificada como "boa" em todas as estações de monitoramento. Apenas três dias marcaram qualidade do ar ruim em uma ou mais estações.>
No início de abril, a concentração de monóxido de carbono e também de poluentes de veículos pesados, como óxidos de nitrogênio e material particulado, chegaram a cair aproximadamente pela metade. Em maio, a diferença em relação aos índices do ano passado foi menor, o que a Cetesb atribui à falta de chuvas nesse mês em relação a 2019, quando houve maior dispersão de poluentes.>
A experiência de viver em uma cidade com menos poluição tem inspirado movimentos da sociedade que buscam formas de manter o benefício ambiental após o período de quarentena.>
Nesta sexta, 24 ONGs reunidas na Coalizão Respirar lançam o manifesto "Queremos respirar no 'novo agora'", pedindo ao poder público que a retomada econômica inclua condicionantes ambientais, principalmente nos pacotes de ajuda ao setor privado.>
O manifesto sugere seis medidas: veículos mais limpos; incentivo ao transporte individual ativo, como planejamento de vias urbanas para pedestres e ciclistas; frota de ônibus não-poluente e de qualidade; atualização dos padrões de monitoramento da qualidade do ar; aprovação da Política Nacional de Qualidade do Ar (PL 10.521/2018); e, por fim, combate ao desmatamento e a queimadas.>
As queimadas na Amazônia aumentam a poluição em cidades da região Norte. Diante de um recorde em agosto do ano passado, a fumaça chegou ao Sudeste e escureceu o céu em uma tarde em São Paulo.>
Como a pandemia não inibe o desmatamento no país, o ciclo de desmate e queimadas na Amazônia também deve contribuir para o aumento das emissões de carbono do Brasil, que neste ano devem crescer de 10% a 20% em relação às emissões de 2018, segundo estimativa do Observatório do Clima.>
No mundo, de acordo com o Global Carbon Project, as emissões de carbono devem cair entre 4% e 7%, principalmente devido à queda de 50% nas emissões de transportes superficiais ao redor do globo.>
Ao contrário do Brasil, que tem no desmatamento a principal causa das emissões de gases-estufa, o restante do mundo tem no setor de energia e combustíveis o principal desafio para reduzir emissões.>
Se a taxa for mantida anualmente, por meio de políticas de retomada econômica verde, o mundo poderia cumprir o Acordo de Paris e evitar as consequências mais trágicas do aquecimento global, como o desaparecimento de países-ilha.>
Outra fonte poluente em queda durante a quarentena é a sonora. Embora seja menos perceptível, ela também é letal. Um estudo da OMS em cidades europeias calculou que o barulho do trânsito nas cidades influencia a pressão sanguínea e ataques cardíacos, reduzindo os anos de expectativa de vida das pessoas.>
Segundo medição da associação ProAcústica, que mantém um mapa do ruído da cidade de São Paulo, a percepção de ruído chegou a cair 50% na região da av. Nove de Julho, próximo ao Masp.>
Além da redução no trânsito, o desligamento de aparelhos de ar-condicionado em prédios comerciais contribuiu, segundo Marcos Holtz, vice-presidente de atividades técnicas da ProAcústica.>
"Como o mascaramento dos ruídos dos veículos diminui, você consegue perceber outros sons, de obras, de animais e pássaros que estavam ali, como as maritacas aqui no meu bairro", diz Holtz.>
Para os moradores vizinhos do Minhocão, no centro de São Paulo, a quarentena não representou um alívio. "Com a cidade silenciosa, o som dos carros passando pelo Minhocão fica ampliado para nós", diz Felipe Rodrigues, morador da região e diretor da Associação Parque Minhocão, que defende a construção de um parque urbano no lugar da via. A associação pediu que o atalho fosse fechado durante a quarentena, mas não teve retorno da prefeitura.>
"Uma das etapas de retorno da quarentena poderia testar o fechamento do Minhocão", sugere o arquiteto Pedro Lira, sócio do escritório Natureza Urbana.>
Para ele, é preciso combinar soluções estruturais de longo prazo com outras medidas mais rápidas e baratas, como a restrição do espaço para automóveis e incentivos a calçadões e bicicletas. "É preciso ter coragem para intervir no espaço urbano. A solução do veículo elétrico vai eliminar a poluição, mas não o trânsito.">
Na China, que já experimenta a retomada das atividades econômicas, as emissões de poluentes também voltaram a crescer em maio e atingiram os níveis pré-pandemia, movidas principalmente por fontes industriais, após uma queda de mais de 40% em fevereiro e março.>
Apesar dos discursos de líderes políticos e empresários em favor de uma retomada econômica sustentável em todo o mundo, ainda há poucos sinais de elaboração de políticas que garantam um novo rumo.>
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