Publicado em 22 de agosto de 2022 às 18:04
O apelido surgiu nos anos 1970, na faculdade de engenharia civil, em Ribeirão Preto (SP), devido ao nariz avantajado. "Quando eu entrava na sala, o pessoal gritava: 'Chegou o pelicano!'", contava.>
Ele dizia que, de início, ficava chateado com o bullying, mas, como o apelido pegou entre os colegas, passou a gostar e decidiu assinar os cartuns com o nome da ave. A partir dali, César Augusto Vilas Boas passaria a ser nacionalmente conhecido como Pelicano.>
Irmão do cartunista Glauco, morto a tiros com o filho Raoni em março de 2010, Pelicano havia completado 70 anos no dia 6 de agosto. Morreu vítima de um infarto na tarde deste domingo (21). Segundo amigos, ele se tratava de uma pneumonia, chegou a ser socorrido e levado a uma UPA (unidade de pronto atendimento), mas não resistiu.>
Natural de Jandaia do Sul, no Paraná, Pelica, como era chamado pelos amigos, dizia que tanto ele quanto Glauco foram estimulados a desenhar pela mãe, Maria Aparecida, a dona Cidu. Às vezes, copiavam os desenhos que a mãe fazia, outras vezes criavam suas próprias histórias e personagens.>
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"Éramos em cinco moleques e uma menina. Tínhamos em casa um quintalzão de barro e, quando chovia, minha mãe não deixava a gente sair de casa. Cada um tinha um caderninho e lápis de cor. Ela passava os desenhos e a gente copiava", contava.>
A paixão pela charge foi descoberta depois, quando ele e Glauco viram uma revista do cartunista Henfil (1944-1988). "A gente estava numa padaria, ria tanto folheando a revista. Ninguém entendia nada", contou em uma entrevista.>
O caçula Glauco foi o primeiro a fazer dos cartuns uma profissão, no extinto jornal Diário da Manhã, em Ribeirão Preto. Pelicano treinava os traços em casa. Um dia Glauco levou o caderno do irmão ao jornal e mostrou-o ao editor na época, o jornalista José Hamilton Ribeiro, que convidou então Pelicano também a trabalhar no matutino. Era 1978.>
Glauco mudou-se para São Paulo e passou a publicar seus quadrinhos no jornal Folha de S.Paulo. Já Pelicano permaneceu em Ribeirão e publicou inúmeros trabalhos em jornais e revistas da cidade e do país, incluindo o Pasquim e a Folha de S.Paulo. Foi premiado com o primeiro lugar cinco vezes no Salão de Humor de Piracicaba, do qual se tornou jurado de honra.>
Foi também pelas mãos de Glauco que Pelicano conheceu em 1993 a seita do Santo Daime. Nela, um chá de folha de chacrona e cipó de mariri é consumido durante os rituais pelos fiéis em busca do "eu superior". Pelica era o grande mestre da Igreja Rainha do Céu, fundada por ele há 30 anos, no quintal de sua chácara, no Residencial Parque Cândido Portinari, na zona leste de Ribeirão Preto.>
Em entrevista à Folha de S.Paulo, em maio de 2010, ao ser provocado a dizer qual político ele gostaria de ver tomar o chá, o cartunista respondeu: "O Lula seria legal. Se ele tomasse o Daime, convocaria a Marina Silva para ser a presidente e dispensaria a Dilma Rousseff". Eleita presidente, Dilma exerceu o cargo de 2011 até seu afastamento por um processo de impeachment em 2016.>
Pelicano classificava o chá como "expansor de mente que abre a mediunidade e faz a pessoa entrar em contato com entidades espirituais". Era no Daime que ele dizia buscar conforto para a morte de Glauco. "Penso nele toda vez que pego no lápis pra desenhar. Todo dia", declarou em entrevista ao site "O Folha de Minas", em 2020.>
O cartunista deixa a mulher, Jacy, as filhas Poliana, Mayra, Naina (in memorian) e Inaiá, e os netos, além de um acervo pessoal de mais de 14 mil obras, tudo feito com papel e lápis. Deixa também uma legião de amigos e de fãs. E muita saudade.>
O velório ocorre na igreja Rainha do Céu e o enterro será nesta segunda (22), no cemitério Bom Pastor, em Ribeirão Preto.>
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