Publicado em 16 de fevereiro de 2023 às 08:45
"Pixinguinha é inconteste." Foi assim que Chico Buarque definiu o músico, arranjador, compositor e maestro Alfredo da Rocha Vianna Filho (1897-1973) na letra da canção Paratodos, de 1993. E não é apenas Chico que sabe que o talento e a importância de Pixinguinha para a Música Popular Brasileira não são objeto de dúvida.>
Antes, o regente Guerra-Peixe - ligado à música erudita - já havia alertado aos candidatos para o cargo de diretor de orquestra: Pixinguinha é o ponto de partida a ser seguido.>
Neste mês, que marca os 50 anos da morte do músico carioca, uma série de quatro álbuns com músicas instrumentais inéditas chega para reforçar justamente essas percepções: o compositor de Carinhoso, Rosa e Lamentos - só para ficar entre as composições que ganharam letra e, inevitavelmente, se tornaram mais populares - era um gênio.>
O projeto batizado de Pixinguinha Como Nunca tem direção artística do neto do compositor, o músico e ator Marcelo Vianna, e direção musical de Henrique Cazes, arranjador e pesquisador da obra do compositor. Ao todo, serão cerca de 50 músicas inéditas, criações de diferentes fases, em álbuns a serem lançados digitalmente até o mês de abril pela gravadora Deck.>
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Tudo isso foi possível porque Pixinguinha deixou um enorme acervo, com muitas partituras, arranjos para rádio e sinfônicos. Tudo muito bem organizado em pastas. Primeiro, isso ficou na posse de Alfredinho, filho único do músico. Depois, foi, em regime de comodato, para o Instituto Moreira Salles que, posteriormente, adquiriu definitivamente a coleção - foi daí que saiu a maioria das músicas que serão lançadas agora.>
O primeiro dos álbuns já está nas plataformas. Pixinguinha Virtuose traz 12 músicas registradas por músicos escolhidos com zelo por Vianna e Cazes - algo essencial quando se trata de apresentar algo novo de um compositor que tem notas tão impregnadas na memória popular. Foi preciso criar em cima das melodias deixadas pelo compositor.>
Integram o sexteto os músicos Carlos Malta (flauta e sax), Silvério Pontes (trompete), Marcelo Caldi (sanfona), Marcos Suzano (percussão), João Camarero (violão de 7 cordas) e o próprio Cazes, que assina os arranjos e toca cavaquinho. "Foi um desafio encontrar o tom certo, o instrumento que renderia mais em cada melodia, o solista ideal. Não queríamos que soasse como algo antigo ou que já havia sido feito. Reunimos músicos que tivessem o olhar de mexer na tradição, mirando o futuro, que não tivessem aquele viés conservador, que, a meu ver, é tão nocivo ao choro e o coloca sempre em um lugar do passado", explica Cazes.>
Vianna diz que o avô era extremamente moderno já no tempo dele. "Ele sempre deixou os músicos à vontade. A modernidade dele não estava só nas melodias, mas no caminho que propunha. Pixinguinha exerceu sua musicalidade plena. É isso que queremos deixar claro às pessoas", diz.>
"Era normal os artistas negros serem considerados espontâneos, improvisadores. Dificilmente os colocavam como estruturadores", diz Cazes, ao ressaltar o lado arranjador de Pixinguinha, que escrevia, inclusive, para orquestras. "A palavra que o define é fluência", complementa.>
Cazes chama a atenção para a diversidade das composições, o que reforça mais uma vez que, apesar de ter consolidado o choro e seus contrapontos, Pixinguinha não merece ser aprisionado apenas dentro desse gênero musical.>
Entre as músicas inéditas, há, por exemplo, polca vagarosa (Jagunça), polca marcha (Saudades de Cafundá) - precursora da marcha junina -, tango argentino, valsa, modinha e ponto de macumba.>
Um dos desdobramentos do Pixinguinha Como Nunca será um quinto álbum, que trará 11 músicas do compositor que ganharão letras, ou seja, vão virar canções. O trabalho, previsto para abril, possibilitará que nomes como Arnaldo Antunes, Eduardo Gudin, Guinga, Paulo César Feital, Nei Lopes, Paulinho Moska, Salgado Maranhão e Cecilia Stanzione se tornem parceiros de Pixinguinha.>
Moska musicou Modinha, que virou Onde a Dor Traz o Presente. Antunes escreveu, sobre a melodia chamada Poética, a letra Chuvisco na Telha. Entre outros cantores que participarão estão Leila Pinheiro, Nilze Carvalho, Cecilia Stanzione e João Cavalcanti.>
Paulinho da Viola também foi convocado para a missão, mas ainda não concluiu a letra. "Outro dia ele me disse que já havia feito dois versos", conta Cazes. A parceria deve ficar para um possível novo volume de inéditas.>
Para esse cinquentenário de morte há ainda o lançamento do livro Pixinguinha, um Perfil Biográfico, de André Diniz (Numa Editora). Trata-se, na verdade, de uma nova edição da fotobiografia Pixinguinha - o Gênio e o Tempo, de 2012. A versão recente traz capa assinada pelo artista plástico Melo Menezes, discografia comentada por Cazes e texto assinado por Vianna.>
Pixinguinha morreu em 17 de fevereiro de 1973, aos 76 anos, dentro da Igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, no Rio. Fora até lá para acompanhar o batizado do filho de um amigo. O músico teve um enfarte fulminante. Era uma segunda-feira de carnaval.>
Ignorando qualquer burocracia referente aos ritos religiosos, virou uma espécie de santo - com aprovação popular. São Pixinguinha, como costumam falar seus devotos. De um altar improvisado, porém não menos sagrado, vela pela música brasileira.>
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