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Juiz investigado por venda de sentença, Gutmann presta depoimento ao MPES

Juiz investigado por venda de sentença, Gutmann presta depoimento ao MPES

Carlos Alexandre Gutmann é o juiz que assina a sentença que supostamente foi vendida. Magistrado nega envolvimento em esquema e diz que decisão seguiu embasamento legal e jurídico

Publicado em 23 de julho de 2021 às 13:40- Atualizado há 3 anos

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Juiz Carlos Alexandre Gutmann (de máscara branca) chega para prestar depoimento ao Gaeco em investigação sobre venda de sentença
Juiz Carlos Alexandre Gutmann (de máscara branca) chega para prestar depoimento ao Gaeco em investigação sobre venda de sentença. (Carlos Alberto Silva)
Rafael Silva
Repórter de Política / [email protected]

O juiz Carlos Alexandre Gutmann, afastado cautelarmente no último dia 15 pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), prestou depoimento nesta sexta-feira (23) na sede do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), em Vila Velha. Ele é um dos nove investigados pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) sobre a suposta venda de sentença no Fórum da Serra.

O depoimento começou por volta das 13h e durou cerca de duas horas. Ao deixar o local, Gutmann negou qualquer participação no esquema. "Meu nome foi usado e não tenho nada a ver com isso", afirmou.

Gutmann foi o juiz responsável por assinar, em 2017, a decisão que beneficia o empresário Eudes Cecato, que pagou, de acordo com o MPES, por meio de intermediários, para que a sentença sobre a propriedade de um terreno em Pitanga, na Serra, fosse favorável a uma de suas empresas. É o que aponta o pedido de abertura de inquérito encaminhado pelo MP ao TJES, que autorizou as investigações.

O suposto esquema foi descoberto a partir da investigação do assassinato da médica Milena Gottardi. O ex-marido dela, o ex-policial civil Hilário Frasson, foi denunciado como mandante do crime. O executor confesso, Dionatas Alves Vieira, mencionou em depoimento que Hilário orientou que a médica fosse morta na Serra, onde ele teria um "juiz amigo".

A partir deste fio, o MPES passou a tentar identificar quem era o juiz amigo de Hilário e, a partir da quebra do sigilo telefônico do ex-policial, chegou ao diretor do Fórum da Serra, o juiz Alexandre Farina, também afastado pelo TJES. Farina e Hilário atuaram, segundo as investigações, como intermediários entre o empresário Eudes Cecato e o juiz Carlos Alexandre Gutmann.

Em conversas por um aplicativo de mensagens, publicadas por A Gazeta, Farina demonstrou preocupação com atrasos em pagamentos e a falta de discrição entre os envolvidos, que poderiam deixar pistas que o ligassem à suposta vantagem indevida. Em uma das mensagens, Farina disse a Hilário que a decisão foi feita "a quatro mãos", dando a entender que também estava elaborando a sentença com Gutmann.

O MPES afirma que há indícios de ocorrência dos crimes de corrupção passiva, corrupção ativa e exploração de prestígio. A investigação estava sob sigilo, que foi derrubado pelo TJES no dia 15, após a suspeita de vazamento de uma operação para o cumprimento de mandados de busca e apreensão em relação a outros dois investigados.

Os juízes são investigados em um processo criminal e, se condenados, podem ser presos. Paralelamente, eles também podem responder a um Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), que pode resultar em sanções administrativas, como a aposentadoria compulsória.

O OUTRO LADO

A defesa do juiz Alexandre Farina afirmou que foi surpreendida com o julgamento que definiu o afastamento do magistrado e reforçou, por nota, "o compromisso do magistrado em colaborar com a Justiça, a fim de esclarecer todos os fatos que se encontram em apuração".

Já no sábado (17) a defesa enviou nova nota, à TV Gazeta, "A decisão do tribunal pleno foi uma surpresa para todos nós, tendo em vista que o inquérito visa apurar fatos de 2017 e que, portanto, não possuem contemporaneidade para uma medida tão drástica como uma cautelar penal. De toda sorte, como ainda não foi nos dado acesso e nem intimados, não temos condições de analisá-la de forma mais acurada, mas assim que uma coisa ou outra acontecer iremos tomar as medidas necessárias. O juiz Alexandre Farina Lopes continua à disposição da Justiça capixaba, da mesma forma como sempre se portou nesses mais de 18 anos dedicados à magistratura, ou seja, com todo o respeito necessário ao Tribunal de Justiça do Espírito Santo", diz a nota assinada pelos advogados Rafael Lima, Larah Brahim, Mariah Sartório, Kakay, Roberta Castro Marcelo Turbay, Liliane Carvalho, Álvaro Campos e Ananda França.

Por meio de nota, o juiz Carlos Alexandre Gutmann negou qualquer irregularidade e destacou que não há conversas dele com os demais investigados entre as transcrições contidas na investigação. Veja a nota de Gutmann na íntegra:

"Tenho um histórico pessoal e profissional de reputação ilibada. Diante das investigações em curso e dos fatos recentemente divulgados, venho a público esclarecer que tenho 18 anos de uma carreira profissional irrepreensível e honrada, que está sendo subitamente maculada e colocada sob suspeita em razão da aparição de meu nome em diálogos dos quais jamais participei. Garanto que não há e não surgirá uma única comunicação minha com os demais investigados que possa ser associada a tratativas, negociações, favores indevidos ou infrações de deveres funcionais.

Nesses últimos difíceis dias, tenho recebido mensagens de apoio de pessoas das mais diversas áreas do Direito, entre juízes, membros do Ministério Público e da Ordem dos Advogados do Brasil. São profissionais que me conhecem e confiam no meu trabalho. A todos eles, e também a mim, escandaliza a menção a meu nome. O único elemento concreto que me diz respeito é a sentença a que se referem as conversas. Proferi decisão consciente, com embasamento legal e jurídico, confirmada posteriormente, à unanimidade, pelos Excelentíssimos Desembargadores da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, a respeito dos quais certamente não paira qualquer suspeita (Processo 0020366-58.2016.8.08.0048).

Sou o principal interessado na completa elucidação dos fatos, e da maneira mais ágil. Por isso, desde o início, coloquei-me prontamente à disposição para todos os esclarecimentos perante quaisquer autoridades em quaisquer instâncias. Tenho confiança de que a Justiça vai apurar todos os fatos, considerando todo o meu histórico pessoal e profissional de reputação ilibada. A Justiça, com competência e sensibilidade, vai chegar à verdade, distinguindo entre onde existem fatos e onde existem apenas aparências e conjecturas."

O advogado de Hilário Frasson no caso Milena Gottardi, Leonardo Gagno, afirmou que o ex-policial não foi notificado a respeito de uma suposta participação na venda de sentença, como aponta o MPES. Na última segunda-feira (19), Hilário prestou depoimento ao órgão, mas o advogado disse que não foi informado e que vai encontrar Hilário para ter acesso ao processo sobre a venda de sentença.

A defesa de Eudes Cecato disse que desde que o empresário ficou ciente dos fatos investigados prontamente acatou todas as demandas indicadas e se colocou à disposição para colaborar com as investigações. "Sendo assim, registra seu mais alto interesse em contribuir para o esclarecimento de todos os fatos, de maneira que a Justiça seja feita", escrevem os advogados Fernando Ottoni e Clécio Lemos em nota enviada à reportagem.

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