A ação policial que resultou na morte de um adolescente de 15 anos após participação dele no roubo de um carro, na Serra, em 2014, foi o que fez o dono do clube de tiro investigado por receber armas desviadas do Exército, que também é cabo da Polícia Militar, virar réu em ação penal por homicídio.
Além de Marcos Antônio Loureiro de Souza, outros dois policiais respondem pelo mesmo crime. Embora a abordagem tenha resultado na detenção de dois dos quatro envolvidos no assalto e na recuperação do automóvel, para o Ministério Público Estadual (MPES) os militares não agiram em legítima defesa e mataram o adolescente em fuga. Um dos tiros foi na nuca.
ASSALTO E PERSEGUIÇÃO
O assalto ocorreu na noite do dia 29 de janeiro de 2014, às margens da BR 101, nas imediações do bairro Barcelona, na Serra. A perseguição policial terminou quando o carro dirigido pelos assaltantes bateu contra um barranco, no bairro Cidade Pomar. O quarto indivíduo conseguiu fugir.
TRIO POLICIAL TERIA MUDADO VERSÃO
Na denúncia oferecida pelo MPES em novembro de 2016, e aceita pela Justiça, a promotoria aponta que o trio policial mudou a versão para sustentar que a equipe apenas revidou tiros disparados pelos assaltantes após a colisão.
Essa versão, que surgiu no âmbito das apurações da Corregedoria da PM, difere da primeira, dada ainda na delegacia, quando os policiais não relataram terem sido alvo de disparos. Para o MPES, "inúmeras contradições foram apontadas" nos relatos dos militares.
Na etapa da investigação interna da PM, os policiais investigados, conforme os relatos aos quais o Gazeta Online teve acesso, não consideraram que houve contradição. Alegaram que os focos dos depoimentos colhidos deles, na delegacia e na corregedoria, eram distintos.
Os policiais atiraram 27 vezes contra o adolescente que morreu, segundo a denúncia. Quatro disparos o atingiram. Apesar de os depoimentos dos militares darem conta de que o adolescente partiu para cima deles com arma nas mãos, o rapaz recebeu um tiro na região da nuca.
Como é possível extrair dos depoimentos dos policiais, aos quais a reportagem teve acesso, o cabo Loureiro chegou a dizer que o adolescente só caiu depois que ele efetuou os últimos disparos. Em outro momento, o militar relatou que o adolescente morto pode ter sido baleado na região da nuca pelo comparsa que fugiu, acidentalmente. Não houve perícia para apontar de qual arma saíram os tiros que atingiram o rapaz.
Ao apurar a conduta dos policiais, a Corregedoria da PM fez diligências para localizar o quarto suspeito de participação no roubo do carro. O rapaz foi apontado pelos comparsas como morador de rua. No entanto, a corregedoria descobriu, tempos depois, que ele foi morto. O corpo foi encontrado amarrado em uma árvore e queimado.
A AÇÃO FOI LEGÍTIMA, DIZ DEFESA
A defesa dos três policiais afirma que a ação dos militares foi totalmente legítima e que eles agiram para evitar injusta agressão de bandidos armados.
"Eram quatro infratores, todos armados e que, após subtraírem um veículo, entraram em confronto com a guarnição em que se encontrava o cabo Loureiro e outros militares estaduais. A ação dos militares foi legítima, uma vez que repeliram injusta agressão. E isto restará devidamente provado na instrução da ação penal", afirmou Claudius Caballero, advogado dos três policiais no processo.
A reportagem procurou a Corregedoria da Polícia Militar durante uma semana mas, até o momento, não houve retorno.
COMPRA DE ARMAS
De licença médica da PM há mais de dois anos, o cabo Marcos Antônio Loureiro de Souza atua normalmente em negócios relacionados à empresa de armas de Guerreiros, com unidades em Vila Velha e Serra.
Segundo o Ministério Público Militar (MPM), foi ele quem negociou a compra de 166 armas com Alexandre de Almerida, tenente-coronel do Exército, no Rio de Janeiro, ex-chefe do setor de fiscalização de produtos controlados. Almeida era a mais importante autoridade no controle de armamentos que circulam no Rio de Janeiro e no Espírito.
Segundo O Globo, Marcos Antônio admitiu que a loja havia recebido "armas antigas", que teriam sido recolhidas na casa do tenente-coronel Almeida e levadas para Vila Velha. Pelo material, o empresário disse ter combinado o valor de R$ 90 mil a serem pagos em 12 prestações, três delas quitadas ainda em 2018.
Marco Antônio diz ter sido informado que as armas pertenciam a um colecionador que havia morrido e que acreditava que a quantia seria entregue ao filho dele.
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