O vistoriador de veículos Danilo Lipaus Matos, de 20 anos, foi atingido por cinco tiros no peito durante uma abordagem de policiais militares na sexta-feira (31), em Colatina, no Noroeste do Espírito Santo. A informação foi confirmada nesta segunda-feira (3), por fontes da Polícia Científica ouvidas por A Gazeta. Os PMs envolvidos na ocorrência foram afastados e são investigados pela Corregedoria da PM.
Dos 44 tiros disparados pelos militares contra o carro dirigido por Danilo, cinco atingiram o tórax da vítima. De acordo com o boletim de ocorrência, o sargento Renan Pessimílio efetuou 15 disparos, mesma quantidade realizada pelo soldado Eduardo Nardi Ferrari. O cabo Rodrigo de Jesus Oliveira atirou 12 vezes, e o soldado Ramon Lucas Rodrigues Souza efetuou dois disparos.
Em entrevista ao Bom Dia ES, da TV Gazeta, nesta segunda-feira (3), o secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa Social, Leonardo Damasceno, disse que o Estado precisa dar uma resposta rápida para a população.
Determinamos uma apuração muito rigorosa dos fatos, junto à Corregedoria da Polícia Militar, além da apuração também da Polícia Civil e Polícia Científica. A gente lamenta a perda de uma vida, de um jovem trabalhador. O Estado tem que dar uma resposta, uma resposta muito rápida, isenta e com a participação do Ministério Público para dar para a população segurança e confiança", disse o secretário.
Damasceno descreveu o boletim de ocorrência como confuso e complexo, com vários registros ao mesmo tempo, com roubo de veículo, fuga, perseguição e confronto armado. “Em algum momento o veículo do Danilo passou e a polícia, naquele momento, entendeu que ele poderia ser um suspeito. De todo modo, o fato é que, independente disso, nós temos regras de ouro. O Estado preza muito pelo treinamento policial, preza bastante sobre o uso diferenciado da força”, declarou.
Conforme o secretário, os policiais apenas podem realizar disparos em situação de risco de vida dos agentes ou de quem estiver por perto. “Não se atira em pessoa em fuga, nem em veículo em fuga, salvo se o veículo ou a pessoa estiver colocando em risco a vida dos policiais, ou de terceiros. Então isso precisa ser apurado. Realmente essa ocorrência chamou atenção, porque o Danilo não estava armado, estava sozinho dentro do veículo, o veículo já tinha parado, e nós tivemos essa quantidade de disparos que aconteceu”, comentou Damasceno.
A partir dos registros do boletim de ocorrência, do trabalho da perícia e da Seção Regional de Medicina Legal (SML) de Colatina, serão reunidas informações para concluir as investigações.
“É uma investigação que não é tão complexa para a apuração, porque eu acho que ela tem todos os elementos. Tem os policiais identificados que efetuaram os disparos, a vítima foi levada ao IML, também já foi feita a perícia, a perícia de local de crime. Então, com tudo isso, vai ser possível a gente concluir também essa investigação”, afirmou.
Segundo Josenildo Monteiro Matos, pai de Danilo, o carro que o filho dirigia era do jovem. Ele acredita que o filho possa ter se assustado com a presença policial e ficado com medo de perder a habilitação. O pai questionou a quantidade de tiros efetuados contra o filho — 44 disparos, segundo boletim da PM.
“Cercaram o meu filho e efetuaram mais de 40 tiros. Não tinha nada no carro dele, não encontraram nada com ele. Acabaram com a minha vida e com a vida da minha filha. A gente fica revoltado, e eu quero que a lei de Deus e a lei da Justiça aqui da terra prevaleçam. Por que não atiraram nos pneus do carro? Como você atira essa quantidade de tiros?”, desabafou Josenildo.
Consta no boletim policial que participaram da ocorrência o sargento Renan Pessimílio, o cabo Rodrigo de Jesus Oliveira, e os soldados Eduardo Nardi Ferrari, Ramon Lucas Rodrigues Souza e Guilherme Martins, sendo que o último teria ficado dentro da viatura e não fez disparos.
No documento, os policiais alegam que o carro Fiat Strada, dirigido por Danilo, estaria em fuga após ignorar uma ordem de parada dada. Os militares afirmam que foram informados via rádio por um sargento da corporação de que os ocupantes "poderiam ser indivíduos que estavam em fuga em uma caminhonete roubada, que desceram por um matagal e teriam possivelmente roubado a Fiat Strada". Um soldado teria comunicado que uma pessoa que estava no banco do passageiro do veículo estaria portando uma arma.
A ocorrência feita pelos PMs envolvidos diz que "um homem de estatura forte havia feito muitos disparos na Rua Castelo Branco próximo ao Sanear, tiros ouvidos pelos militares". E segue descrevendo que "diante de todo o contexto remetendo a confronto armado e fuga por várias ruas" os policiais avistaram o carro Fiat Strada na Rua Ângelo Morozoni, no bairro São Braz, em Colatina. Os PMs dizem no boletim que emitiram "sinais sonoros e luminosos" para que o motorista parasse, mas as ordens não teriam sido acolhidas, dando sequência à perseguição já iniciada por outras viaturas.
O boletim informa ainda que "em virtude de todo o cenário criado" durante a perseguição, com base nas comunicações via rádio, o sargento Renan Pessimílio e o soldado Eduardo Nardi Ferrari desceram da viatura e atiraram contra o carro Fiat Strada, pois, segundo eles, o motorista do veículo "avançou com o carro na direção dos militares". O documento aponta que, ao todo, 44 tiros foram efetuados contra o veículo: 15 disparos pelo sargento Renan Pessimílio, 15 pelo soldado Eduardo Nardi Ferrari, 12 pelo cabo Rodrigo de Jesus Oliveira e dois pelo soldado Ramon Lucas Rodrigues Souza.
Os PMs informaram na ocorrência que, após a sequência de tiros, Danilo, que dirigia a Fiat Strada, abriu a porta do carro e caiu na calçada da rua, "não sendo mais movimentado". Narram ainda que, com o jovem já morto, realizaram uma "busca ligeira no banco do carona e na parte de baixo, necessitando retirar os objetos que ali estavam" e que "o restante do local foi todo preservado, apenas com atuação da equipe do Samu/192", que confirmou a morte de Danilo no local.
A Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do jovem foi encontrada na capa do telefone dele. Outro celular teria sido encontrado debaixo do tapete do veículo no lado do carona. Armas não foram encontradas. E o veículo pertencia a Danilo. Não era roubado.
A Associação das Praças da Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Espírito Santo (Aspra-ES) diz acreditar que a ação dos policiais militares envolvidos na abordagem que resultou na morte de um jovem em Colatina, Noroeste do Espírito Santo, na última sexta-feira (31), "foi legítima". Por meio de comunicado, a entidade afirma que colocou seu setor jurídico à disposição dos militares associados.
No comunicado à imprensa, a Aspra alega que "a ocorrência é bem complexa, onde foram lavrados vários boletins por guarnições diferentes, contendo registro de veículo roubado abandonado, perseguição, evasão a bloqueio policial e tentativa de atropelamento aos nossos policiais", diz.
"Se os policiais não tivessem atirado, podíamos agora estar lamentando a morte, por atropelamento, de um ou mais policiais, ou até mesmo de pessoas que estavam caminhando nas ruas. Nós temos o compromisso de proteger a sociedade e esta é a razão pela qual nossos policiais estavam mobilizados nessa ocorrência", encerra a entidade, na nota.
O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) divulgou nota em que lamenta o ocorrido e manifesta solidariedade à família da vítima. O MP comunicou "que acompanha o caso de perto e aguarda o recebimento da documentação necessária para análise detalhada, a fim de adotar as medidas cabíveis perante a Justiça".
Uma moradora da rua onde ocorreu o crime conversou com A Gazeta e relatou: "Foi aqui na minha rua. Eles (os policiais) não deixaram a gente nem chegar perto da calçada porque tinha muita polícia. Quem tentava sair para ver, eles mandavam todo mundo voltar para dentro de casa. Então, a gente não podia nem tirar foto, não podia fazer nada. Mas foram muitos tiros, muitos mesmo", disse.
A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH) da Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales), presidida pela deputada estadual Camila Valadão (PSOL), informou nesta segunda-feira (3), que enviou ofícios ao Ministério Público Estadual (MPES) e à Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) cobrando a apuração rigorosa da ação policial que resultou na morte de Danilo Lipaus Matos, de 20 anos, em Colatina.
A Comissão também enviou ofício à Sesp cobrando informações sobre os protocolos seguidos pela Polícia Militar na abordagem que resultou na morte de Danilo. “Precisamos saber as circunstâncias da ação e solicitamos em ofício que a Sesp adote providências para garantir que as investigações sejam conduzidas com transparência e rigor”, disse a deputada Camila.
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