Publicado em 18 de setembro de 2025 às 11:04
A indicação em bula é para obesidade ou diabetes tipo 2, mas há quem use as chamadas canetas emagrecedoras -como Ozempic, Wegovy, Mounjaro- sem nenhuma dessas condições ou qualquer acompanhamento médico, simplesmente porque quer perder alguns quilinhos que considera excessivos, caber na roupa antes da festa ou ficar ainda mais magro. >
"Esses medicamentos são seguros, mas não têm indicação estética. E, como qualquer droga, podem ter efeitos indesejados. Quando bem indicados, os benefícios se sobrepõem a esses efeitos. Quando não há indicação médica de uso, portanto, os efeitos adversos podem ser piores", afirma Adriano Segal, coordenador do Departamento de Psiquiatria e Transtornos Alimentares da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica).>
Na prática, a automedicação sem acompanhamento médico leva as pessoas a usarem doses erradas e aumentarem as mesmas sem critério, segundo Cynthia Valério, subcoordenadora do Departamento de Obesidade da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia). "Tem gente que aplica a dose semanal, não vê efeito imediato e já a aumenta erroneamente por conta própria. Tem ainda quem use diariamente um medicamento que é semanal. Efeitos como mal-estar, vômito, desidratação, tontura e falta de energia estão muito relacionados a esse mau uso.">
A falta de indicação e acompanhamento traz ainda maior risco de desnutrição e de perda excessiva de massa magra, que pode impactar também na massa óssea e no envelhecimento. Segundo Segal, náusea, desidratação, refluxo, azia, constipação, tontura e dor no estômago estão entre outros possíveis efeitos. "Ninguém precisa realmente perder 3 kg ou 4 kg; as pessoas desejam perdê-los. Mas não faz sentido alguém se expor a esses efeitos por esse motivo.">
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Desde junho deste ano, as canetas emagrecedoras só podem ser vendidas com receita médica, o que ajuda a coibir o mau uso, mas os médicos ouvidos dizem que ainda há maneiras de burlar as regras -receitas falsificadas, farmácias que vendem os remédios mesmo sem prescrição, pessoas que pegam emprestadas as canetas de outra pessoas, entre outros jeitinhos.>
O uso por conta própria das canetas para fins puramente estéticos está muito ligado à volta da magreza excessiva como tendência. Celebridades e influencers têm exibido silhuetas menores -e alguns admitem o uso do medicamento com esse propósito, como o cantor Zé Felipe, que disse ter utilizado Ozempic para perder a barriga. Como esses tratamentos custam caro -pelo menos cerca de R$ 1.000 por mês- , a magreza torna-se cada vez associada à riqueza e vira objeto de desejo também por esse motivo.>
"Entendo que até pelo alto custo desses medicamentos a magreza possa até parecer algo elitista, mas para nós, médicos, nunca foi sobre peso, mas, sim, saúde. Hoje o desafio na prática da clínica privada é traçar essa linha com pacientes e alcançar um peso saudável, não o ideal, e mantê-lo. Quem quer uma magreza em excesso pode estar tão doente e desnutrido como quem tem obesidade, com deficiência de vitaminas, queda de cabelos, unha quebradiça, entre outros efeitos", diz Cynthia Valério.>
Segal afirma que quem usa uma medicação injetável de alto custo para ficar ainda mais magro do que já é não tem necessariamente um transtorno alimentar -a pessoa pode estar mal informada ou usar porque algum conhecido indicou-, mas, se tiver predisposição, o remédio pode, sim, ser um fator desencadeador. Não que isso seja novidade; no passado usavam-se os medicamentos para emagrecer disponíveis até então, mas agora, com as canetas emagrecedoras, a perda de peso é maior e mais eficaz.>
Já de acordo com Cynthia Valério, os estudos mostram que as canetas não aumentam o risco de transtornos alimentares, pelo contrário. Para quem tem bulimia e compulsão alimentar, que podem estar associados ao excesso de peso, os remédios são indicados e podem ajudar no tratamento.>
Já quem tem tendência à anorexia não deveria receber indicação nem utilizá-los. "O abuso desses medicamentos sem acompanhamento médico ou a pessoa que acha que deve ter o mesmo peso de quando tinha 15 anos são distorções. Vemos alguns casos no consultório, mas são exceções, casos em que há um terreno fértil para transtorno alimentar. O que mais vemos são pessoas que passam a ter um peso saudável e uma chance de ter qualidade de vida que não seria possível sem essas medicações.">
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