Publicado em 19 de outubro de 2021 às 11:51
Às vésperas de apresentar formalmente o parecer final da CPI da Covid, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) acabou isolado por colegas e foi acusado de vazar trechos do documento. O texto traz diversas acusações contra o presidente da República, Jair Bolsonaro. >
Além de prever o indiciamento por homicídio diante do avanço da doença, que causou 600 mil mortes no Brasil, o documento diz que ele provocou um genocídio ao vetar ações para impedir entrada do vírus em aldeias indígenas. (Veja mais embaixo os cinco argumentos a favor dessa tese).>
Uma ala de senadores atua para convencê-lo a retirar partes alvo de divergência do texto. Caso o relator não ceda, congressistas avaliam apresentar emendas.>
O incômodo com Renan foi geral no chamado G7, grupo de sete senadores majoritário da CPI. O relator chegou a ser chamado de traidor pela suspeita de ter feito uma jogada política para expor trechos do texto e encurralar colegas que quisessem mudá-los.>
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O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), não quer mais conversas a portas fechadas sobre o relatório e afirmou nesta segunda-feira (18) que Renan deve manter "tudo aquilo que vazou".>
Outra ala, porém, ainda busca consenso. Mesmo sem reuniões do G7 previstas, senadores querem conversar individualmente com Renan.>
Há intenção de convencer o relator a mudar o texto antes de quarta-feira (20), mas a tendência é focar atenções na apresentação de emendas e sugestões após a apresentação à CPI.>
Os senadores Humberto Costa (PT-PE) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), por exemplo, são parte da ala que quer se reunir para discutir o teor do parecer e evitar que ele seja colocado em votação sem consenso.>
O objetivo é evitar um fim traumático, com clima de guerra entre os senadores, em uma comissão que teve ampla repercussão e cuja maioria dos integrantes ditou o rumo dos trabalhos.>
Já Aziz disse esperar que colegas apresentem sugestões, mas declarou que votará para aprovar o texto do relator. "Acho que deve manter tudo. Ninguém está pedindo nada a ele, o que queremos é acrescentar algumas coisas", afirmou, após se reunir com Humberto e Randolfe.>
"A sugestão minha é que ele mantenha tudo aquilo que ele vazou. Para não ter dúvida sobre o nosso comportamento. Para não sair brincadeirinha, dizendo: 'Ah, o presidente [Jair Bolsonaro] ligou pro Omar'. Não ligou para mim", disse Aziz à imprensa.>
Veja as 5 teses de Renan Calheiros para indiciar Bolsonaro por genocídio
1) Vacinação prioritária de indígenas
Esse público teve a inclusão no grupo prioritário após decisões da Justiça. Este fato é usado como argumento pelo senador Renan Calheiros, relator da CPI, para tese de genocídio contra Bolsonaro.
2) Uso de kit Covid e distribuição
Outra tese para genocídio usado no relatório é que houve a distribuição do kit Covid, composto por cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina e ivermectina aos indígenas mesmo após a falta de eficácia dessas medicações terem sido comprovadas. Cerca de 265 mil comprimidos foram entregues em aldeias de cinco Estados brasileiros.
3) Veto de Bolsonaro a plano emergencial com foco nos índios
Renan afirma em seu relatório que Bolsonaro vetou uma lei que reconhecia a fragilidade das comunidades indígenas diante da pandemia. A proposta previa acesso à água potável, itens de higiene e leitos de UTI para esse público.
4) Não demarcação de terras
O relatório ainda diz que o governo Bolsonaro se recusou a demarcar terras indígenas e que se recusou a garantir a proteção às terras dessas comunidades durante a pandemia da Covid-19. Renan diz, em um trecho, que o governo tratou o vírus como oportunidade.
5) Demora para atender a decisão do STF
Outra acusação contra Bolsonaro é a demora para produzir um plano de combate à pandemia, com uso de barreiras sanitárias e enfrentamento do vírus entre os indígenas.
Em cinco volumes a minuta do parecer de Renan que estava pronta na sexta-feira (15) pede o indiciamento de mais de 60 pessoas, entre elas filhos do presidente, ministros de Estado, integrantes e ex-funcionários do Ministério da Saúde e empresários. Desde segunda, no entanto, o texto ganhou mais suspeitos e chega a 71 possíveis alvos.>
O texto atribui 11 crimes ao presidente, entre eles o de homicídio. Além disso, Renan propõe 17 projetos de lei ou mudança na Constituição, que incluem definir crime para punir a disseminação de fake news, hoje inexistente.>
a ideia é sugerir pena de prisão de ao menos dois anos para quem distribuir notícias sabidamente falsas. As propostas vão tramitar direto no plenário do Senado, sem precisar passar por comissões temáticas, o que agiliza o processo.>
Para Aziz, Renan vazou o relatório para constranger os colegas e não há mais clima para propor mudanças antes de o texto ser apresentado à comissão.>
"Parece que a gente se entregou ao Bolsonaro [se pedir mudança], que está protegendo o filho do Bolsonaro. Por isso estou dizendo, onde ele está indo eu já voltei. É estratégia", disse Aziz.>
O relator da CPI, porém, nega que tenha vazado o texto e disse que está aberto para qualquer alteração, desde que haja consenso no grupo majoritário da CPI.>
"O relatório vazou e lamento que tenha vazado, mas eu achei até bom o resultado, porque antecipa publicamente um debate que era inevitável, insubstituível", disse Renan.>
Aziz reagiu às falas de Renan minimizando a divulgação de trechos do parecer. "Acho que ele [Renan] não gostaria de que fizesse isso nas denúncias que fizeram contra ele", afirmou.>
Inicialmente, estava previsto para esta semana o encerramento dos trabalhos da CPI da Covid, com a leitura do relatório final nesta terça-feira (19), com a votação do documento marcada para o dia seguinte.>
No entanto, durante o fim de semana, vários senadores demonstraram insatisfação com o vazamento de alguns dos principais pontos do relatório final de Renan.>
Um dos pontos de divergência é a proposta de indiciamento de Bolsonaro pelo crime de genocídio contra a população indígena.>
Por causa dessas divergências, os senadores do grupo majoritário decidiram adiar a leitura e a votação do relatório final. A ideia é que Renan apresente e leia o parecer na quarta. A votação sobre o texto deve ser feita no dia 26.>
Aziz disse que votará a favor do relatório de Renan, mesmo sobre trechos que já criticou, como sobre suposto genocídio indígena. Ele afirmou, porém, temer que o texto final seja frágil.>
"Você tipificar uma coisa e essa tipificação cair no primeiro momento por falta de conteúdo é colocar tudo a se perder. Esse é o medo", disse. "Não adianta acusar de dez coisas, precisa te acusar de uma, bem feita, e você será condenado do mesmo jeito", disse o presidente da CPI.>
Outra divergência diz respeito à inclusão de pedido de indiciamento de Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) por improbidade administrativa.>
Renan argumenta que o senador cometeu o crime ao levar o presidente da Precisa Medicamentos, Francisco Maximiano, a um encontro com o presidente do BNDES, Gustavo Montezano.>
Para senadores, o trecho é frágil e pode facilmente ser derrubado em investigação do Ministério Público.>
Nesta segunda, em um vídeo divulgado por seu gabinete, Flávio afirmou que a audiência pública da CPI da Covid com equipes médicas, pacientes e parentes de vítimas da pandemia é algo "macabro, triste e lamentável".>
"Pessoas foram escolhidas a dedo para virem na CPI e falarem mal do presidente Bolsonaro. Pessoas com histórico de militância contra Bolsonaro vieram para cá com o compromisso de responsabilizar Bolsonaro pelas mortes dos familiares por causa da Covid e não do Bolsonaro. Isso é um desrespeito com quase 600 mil vítimas do Brasil", afirmou.>
"A CPI está entrando para a história como algo que mancha a imagem do Senado e faz com que muitas pessoas olhem para cá com nojo", disse o senador.>
Após audiência com parentes de vítimas da Covid, nesta segunda, o senador Humberto Costa fez uma fala emocionada e pediu para a comissão não se perder em "fogueira de vaidades".>
Sem citar o relator Renan, o petista pediu que se reconheçam erros e se peça desculpas por eles. Mas Renan negou que haja mal-estar e afirmou que nem sequer recebeu queixas dos colegas.>
A inclusão do pedido de indiciamento do ministro Braga Netto (Defesa) no parecer também gera divergências. Renan, porém, indicou que não deve retirar o nome e ainda citou que pode inserir o ministro Paulo Guedes (Economia) na lista de indiciados, se os colegas concordarem.>
Já Aziz sugeriu que faltam argumentos para acusar o ministro.>
No bastidor, assessores de Aziz disseram que não houve surpresa em relação à falta de debate sobre o relatório por parte de Renan. O sentimento é o de que o relator não soube trabalhar em grupo desde o início da CPI e, por isso, não seria diferente com o relatório final.>
Por isso, Aziz disse que não irá propor alterações no texto e vai deixar que o relator assuma a culpa sozinho, caso o relatório fracasse. Ele também não quis se encontrar com Renan para falar sobre o texto já finalizado, e deixou o Senado no final da tarde desta segunda.>
Também pesou na decisão de Aziz o cuidado de não dar margem para o discurso de que ele estaria aliviando para Bolsonaro, caso propusesse alterações no texto.>
Isso porque os pontos em que o presidente do colegiado discorda de Renan são os que propõem penas mais duras contra o presidente, como por genocídio indígena e o indiciamento dos seus filhos.>
SAIBA O QUE SERÁ FEITO APÓS O RELATÓRIO
Próximo depoimento>
Previsão de leitura do relatório>
Deve ocorrer nesta quarta-feira (20). Leitura foi adiada após vazamento de trechos do relatório.>
Principais divergências>
A CPI ainda tem algum poder após a apresentação o relatório final?>
Não, pois a aprovação e o encaminhamento do relatório constituem a etapa final da CPI.>
Como estratégia para acompanhar os desdobramentos das investigações da comissão, os senadores Omar Aziz (PSD-AM), que preside a CPI, e o vice-presidente, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apresentaram a proposta de criação de um grupo permanente, a Frente Parlamentar Observatório da Pandemia.>
A iniciativa, porém, depende de aprovação no Senado>
A quem o relatório é enviado?>
Cada uma das conclusões do relatório pode implicar no envio para órgãos distintos. No caso de ilícitos criminais ou civis, por exemplo, a competência para denunciar formalmente os investigados pela CPI ou de requerer mais investigações é do Ministério Público.>
No caso de autoridades com foro, caso do presidente, esse papel é desempenhado pela Procuradoria-Geral da República (PGR)>
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