Publicado em 28 de fevereiro de 2022 às 10:18
A soma dos prejuízos já observados atualmente com as projeções de longo prazo posicionam o Brasil entre as economias mais afetadas pela crise do clima. Se as emissões de gases de efeito estufa continuarem em alta, a renda média no Brasil deve cair 83% até o final do século, muito além da renda média global, que deve diminuir 23% no mesmo período.>
Os dados são de um dos 34 mil artigos avaliados pelo relatório do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudança do Clima da ONU, na sigla em inglês) sobre impactos, vulnerabilidades e adaptação ao clima. Lançado nesta segunda-feira (28), ele aponta os efeitos socioeconômicos da crise climática em todas as regiões do mundo.>
"Altos níveis de aquecimento poderiam causar um declínio do PIB global de 10% a 23% até o final do século, comparado a um mundo sem aquecimento", afirma o relatório do painel do clima da ONU.>
Outra pesquisa citada pelo IPCC aponta que cada tonelada de gás carbônico emitida no mundo custa ao Brasil cerca de US$ 24 (R$ 124) por causa dos efeitos danosos da mudança climática. A conta, gerada por grandes emissores e paga por países mais vulneráveis, é chamada de custo social do carbono.>
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Além dos prejuízos causados diretamente por eventos climáticos extremos, como as chuvas fortes, inundações e secas prolongadas, a economia brasileira já sofre com os impactos do clima no agronegócio e na geração de energia elétrica, baseada em hidrelétricas.>
Setores-chave para a geração de riqueza no país, ambos são fortemente dependentes de fatores climáticos. Um dos estudos citados pelo IPCC aponta que o PIB per capita do Brasil foi 13,5% menor, entre 1991 e 2010, do que teria sido sem as mudanças climáticas. Na análise de um período mais longo, de 1961 a 2010, o PIB per capita do país foi 24,5% menor por conta de fatores climáticos.>
Publicado em 2019, o estudo das universidades de Stanford e Cambridge comparou trajetórias de crescimento econômico com as variações na temperatura, destacando que o aquecimento ajudou a economia de países frios, mas prejudicou a de países em regiões mais quentes. "A mudança climática vai mudar a geopolítica econômica do planeta", avalia o físico da USP e membro do IPCC, Paulo Artaxo.>
"Hoje o Brasil é um grande produtor de alimentos, mas daqui a pouco as regiões temperadas podem se tornar grandes produtoras, enquanto regiões tropicais podem ficar menos adequadas para as culturas que temos hoje", afirma Artaxo.>
Se as emissões não caírem rapidamente, os prejuízos devem ser ainda mais significativos. O relatório do IPCC aponta que o calor extremo pode reduzir a capacidade de trabalho no setor agrícola em 24%. Caso as emissões sejam controladas, o número deve passar para 9%.>
Eventos extremos em outras regiões do planeta também geram efeito cascata sobre a economia brasileira. "As mudanças climáticas atingirão as cadeias de abastecimento, mercados, finanças e comércio internacionais, reduzindo a disponibilidade de bens no Brasil e aumentando seu preço, bem como prejudicando os mercados para as exportações brasileiras", afirma o relatório do painel do clima da ONU.>
O texto também aponta que pode haver instabilidade financeira decorrente dos choques econômicos causados pela mudança do clima, incluindo a redução dos rendimentos agrícolas, os danos à infraestrutura crítica e os aumentos de preços das commodities.>
Em outro capítulo, o relatório relaciona o aumento de chuvas fortes e a elevação do nível do mar com a ocorrência de inundações nos portos e outras infraestruturas costeiras críticas, o que também deve gerar efeito cascata sobre as exportações. O IPCC ainda aponta o risco de falha generalizada das colheitas, o que pode levar à escassez global de alimentos e ao aumento de preços, com prejuízos maiores para populações mais pobres e riscos de agitação social e conflitos armados.>
Já observadas atualmente, as perdas agrícolas devem aumentar drasticamente até o final do século no cenário em que as emissões continuam subindo. A produção de arroz pode cair 6%; a de trigo, 21% e a de milho, 10%. Caso as emissões globais comecem a diminuir imediatamente, as perdas também serão controladas e passam, respectivamente, para 3%, 5% e 6%.>
Ainda segundo o relatório, a combinação de emissões em alta com desmatamento local poderia causar uma queda de 33% na produção de soja e pastagens na Amazônia Legal.>
A criação de animais também deve sofrer impactos significativos no cenário em que as emissões continuam altas. As projeções apontam que gado bovino, galinhas e suínos passarão a sofrer estresse térmico durante a maior parte ou todo o ano no país. Ainda nesse cenário, a produção de peixes no Brasil pode cair 36% e a de crustáceos e moluscos, até 97% entre e 2050-2070, em comparação com as projeções para 2030-2050.>
O relatório sobre os impactos socioeconômicos da mudança do clima compõe a segunda parte do sexto ciclo de avaliação do IPCC. A primeira, lançada no último novembro, reuniu a ciência física do clima. Em abril, o terceiro e último relatório do ciclo deve mostrar os diferentes cenários para redução das emissões de gases-estufa.>
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