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São advogados sócios do escritório David & Athayde Advogados

Reforma tributária: mais que novos tributos, uma mudança na lógica empresarial

Essa mudança demandará atenção redobrada por parte das empresas, já que poderá afetar diretamente modelos de precificação, exigência de capital de giro e fluxo de caixa

  • Daniel Soares e Rogério David São advogados sócios do escritório David & Athayde Advogados
Publicado em 22/05/2025 às 16h49

O Brasil implementará uma ampla reforma de seu sistema tributário sobre o consumo. A promessa é de simplificação de um dos sistemas mais complexos do mundo, por meio da substituição de tributos atuais por novos modelos de arrecadação.

Estão previstas a extinção das contribuições federais do PIS e da Cofins, que serão unificados na CBS, bem como do ICMS estadual e do ISS municipal, substituídos pelo IBS, cuja competência será compartilhada entre Estados e municípios. Outras regras, mudanças dos tributos atuais e introdução de um Imposto Seletivo (IS) também serão implementadas.

A reforma ainda está em construção, com a propositura e edição de normas pelo governo para regulamentar as diretrizes gerais estabelecidas via alteração da constituição pela EC 132/2024. As alíquotas, por exemplo, ainda não foram definidas.

Em que pese algumas indefinições, é possível afirmar que não se trata apenas de trocar tributos antigos por novos com alíquotas diferentes. A reforma representa uma mudança profunda na lógica de apuração e recolhimento dos tributos, dentre elas, a adoção de novas técnicas de não cumulatividade – entendida resumidamente como o confronto débitos e créditos – com o objetivo de tributar apenas o valor agregado das operações.

Essa mudança demandará atenção redobrada por parte das empresas, já que poderá afetar diretamente modelos de precificação, exigência de capital de giro e fluxo de caixa. Pode ser um erro estratégico focar exclusivamente nas novas alíquotas da CBS e do IBS. O impacto mais relevante pode estar na forma como o sistema como um todo afetará a dinâmica operacional e financeira dos negócios.

O custo de uma operação, por exemplo, é composto não apenas pelo valor da transação, mas também pelos tributos que podem ou não ser recuperados. Atualmente, tributos como ICMS, PIS e Cofins contam com regras específicas de creditamento, conforme seus regimes de não cumulatividade. Essas regras serão alteradas no IBS e CBS.

Além disso, alguns dos regimes tributários que serão modificados não adotam qualquer técnica de não cumulatividade. É o caso, por exemplo, dos regimes ordinários do ISS e do PIS e Cofins cumulativo aplicado às empresas optantes pelo lucro presumido.

Com a implementação da não cumulatividade, o controle dos créditos fiscais passará a ser uma nova preocupação para todas as empresas, e não apenas as do lucro real, exigindo maior atenção na apuração e na escrituração das operações.

Essa nova dinâmica dos créditos fiscais poderá impactar, inclusive, na escolha das empresas pelo Simples Nacional, que, embora preveja uma tributação mais benéfica, em regra, não permitirá a transferência de créditos calculadas sobre as alíquotas de referência, mas sim base no valor efetivamente pago.

Outro ponto sensível é a adoção do split payment, mecanismo que separa e destina automaticamente a parcela correspondente ao tributo no momento da transação financeira. Hoje, a empresa recebe o valor total da venda e só precisa recolher o imposto posteriormente — o que pode representar um prazo de até 55 dias com o valor em caixa.

Reforma tributária
Reforma tributária. Crédito: Getty Images

Com o split payment, esse intervalo desaparece: os recursos vão direto para os cofres públicos, reduzindo o capital disponível e exigindo ajustes na gestão do fluxo de caixa.

Diante desse cenário, torna-se imprescindível que as empresas reavaliem suas estratégias financeiras e operacionais. A combinação entre alíquotas potencialmente mais altas, novas regras de creditamento e a possibilidade de imediata retenção dos tributos via split payment pode comprometer o capital de giro, pressionar os preços e afetar a competitividade. Mais do que uma reforma tributária, o que está em curso é uma mudança estrutural na lógica de funcionamento dos negócios no Brasil.

Esse será, inclusive, um dos temas centrais do II Simpósio Nacional de Estudos Tributários, promovido pela Academia Brasileira de Direito Tributário (ABDT), que ocorrerá no dia 13 de junho, no Palácio do Café, na Enseada do Suá. Antecipar-se a essa transformação será fundamental para evitar riscos e identificar oportunidades em meio à nova ordem fiscal.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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